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Olhar Olímpico

Pacaembu é privatizado enquanto bate recorde de utilização

Demétrio Vecchioli

15/09/2019 18h39

A história do Estádio Municipal Paulo Machado de Carvalho será interrompida nesta segunda-feira. A se confirmar a assinatura do contrato de concessão à iniciativa privada, o "meu, o seu, o nosso Pacaembu" deixa de ser municipal por 35 anos para ser da iniciativa privada. Mais especificamente do Consórcio Patrimônio SP, que ganhou edital para administrar o complexo, que também tem piscina, ginásio e quadras de tênis.

Quis a história que o Pacaembu deixasse de ser municipal exatamente em um momento no qual volta a exercer sua função social. Nunca na história recente o Pacaembu recebeu tantos jogos de futebol. Já são 46 em 2019 – 21 apenas nos últimos 60 dias -, contra 39 em 2018 e 22 em 2017. Na conta da prefeitura não entram eventos como a Taça das Favelas e a Copa dos Refugiados.

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Até recentemente, o Pacaembu parecia ter somente duas funções: ser backup para quando São Paulo, Palmeiras e Corinthians não podem jogar nos seus estádios, maiores e mais modernos, e receber o Santos quando a diretoria alvinegra quer fazer renda e/ou agradar aos torcedores santistas que moram na capital. Como essas situações são sazonais, não havia como planejar o uso do estádio.

A conjunção de uma série de outros fatores, porém, mudou os rumos da história. A começar pelo futebol feminino, que ganhou força no país especialmente este ano, quando começou a valer uma exigência da Conmebol que fez São Paulo e Palmeiras montarem times profissionais – e Santos e Corinthians ganharem visibilidade para seus projetos, mais longevos.

Só neste ano, o Pacaembu já recebeu 13 partidas femininas entre clubes, inclusive a primeira da semifinal do Paulistão, entre Santos e São Paulo, no último sábado. E uma 14ª está marcada para o sábado que vem, a volta deste mesmo duelo. E ainda estão por vir as finais do estadual e do Brasileiro. Além disso, o Pacaembu recebeu outras quatro partidas de um torneio amistoso com a seleção feminina.

Paralelamente a isso, os campeonatos de base ganharam projeção graças à criação de novos torneios e à visibilidade deles na televisão, impulsionada pelo aumento no número de canais (na TV fechada e no streaming), que precisam ocupar a grade e apelam para a base. Na semana passada, por exemplo, o estádio recebeu São Paulo x Vasco e Palmeiras x Fluminense pela Copa do Brasil Sub-17.

De acordo com a CBF, atualmente os campeonatos nacionais de base terão 551 partidas em 2019. Até 2012 não havia nenhum campeonato oficial da confederação. Já o calendário feminino nacional foi de uma média de 125 jogos ao ano entre 2013 e 2016 para 365 este ano. Isso sem contar os estaduais, tanto de base quanto feminino, que também ficaram maiores e mais relevantes.

Gigantes do futebol brasileiro, Palmeiras, Corinthians, São Paulo e Santos naturalmente avançam de fases, fazendo jogos decisivos, que são transmitidos na televisão e têm demanda de público. São partidas que raramente têm apelo suficiente para acionar a operação de Allianz Parque, Morumbi ou Arena Corinthians, mas são relevantes demais para acontecerem na Academia de Futebol 2, em Cotia ou na Fazendinha.

É daí que vem o aumento de utilização do Pacaembu. Se o número de partidas de futebol masculino profissional se mantém estável (foram 23 em 2018 e 21, por enquanto, em 2019), no feminino o total passou de oito para 13. Na base foram seis jogos até aqui, contra oito do ano passado, mas a maior demanda ainda está por vir: finais dos estaduais e da Copa do Brasil Sub-17 e fase final do Brasileiro Sub-20.

Se não tem como competir com Allianz Parque, Morumbi ou Arena Corinthians, o Pacaembu é o estádio que oferece melhor estrutura para esses jogos de baixa demanda de público. A concorrência é grande. Só o sub-17 do Palmeiras já jogou em seis estádios este ano em torneios da CBF, do Canindé ao Nicolau Alayon, passando principalmente pelo José Liberatti, em Osasco, que hoje parece ser o principal concorrente do Pacaembu- o estádio também é o plano B do São Paulo, que atua com regularidade em Cotia. 

Jogar em um estádio bem localizado e bem estruturado, claro, tem um custo. Por jogos assim, que não têm cobrança de ingresso, a prefeitura cobra R$ 33 mil. Como as partidas costumam ser à tarde ou de manhã, não há a necessidade de se gastar com gerador de energia.

A dúvida é se o novo proprietário vai continuar abrindo o Pacaembu para esses jogos. A tendência é que sim. O plano do concessionário é tornar o complexo esportivo movimentado todos os dias, com lojas e restaurantes. Abrindo o estádio para esses jogos, o consórcio atrairia público, ainda que não em grande volume, e manteria a roda girando. Mas não há, no contrato, nada que impeça o Pacaembu de se equiparar às arenas da cidade e só abrir em partidas de alta demanda, que têm aluguel bem mais caro.

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.