Técnico da seleção de basquete 3x3 ganha Bolsa Atleta mesmo aposentado
Demétrio Vecchioli
17/06/2019 04h00
Douglas Motta, técnico da seleção de basquete 3×3
A Confederação Brasileira de Basquete (CBB) atestou ao Ministério do Esporte, no fim do ano passado, que Douglas Lorite Motta continuava praticando basquete 3×3, treinando para competições oficiais. Acontece que ele não disputa uma competição nacional desde setembro de 2017, quando sua equipe ficou em terceiro no Campeonato Brasileiro. Em dezembro daquele ano, anunciou sua aposentadoria pelo site da própria CBB.
Douglas não é um personagem qualquer. Ele é o técnico da seleção brasileira de basquete 3×3, que agora é modalidade olímpica.
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Em entrevista ao Olhar Olímpico por telefone, o gerente de 3×3 da CBB, Francisco Chagas, indicado como porta-voz da confederação e do treinador, inicialmente negou que houvesse qualquer irregularidade porque, para ele, a bolsa é um "prêmio" por um resultado de 2017. Na verdade, a bolsa, atribuída com base em resultados passados, é incentivo a atletas que continuam em atividade. Quem se afastada do esporte, seja por aposentadoria ou por doping, perde o direito à bolsa.
Chico, como é conhecido, também tem ocupação paralela e conflituosa com o cargo que ocupa. Ele é dono de uma das maiores empresas de eventos de 3×3, a Ciclo 2. Organiza competições ao mesmo tempo em que gerencia a modalidade. Perguntado sobre sua atuação no mercado, não lembrou qual último torneio organizado. "Faz muitos anos".
Depois, confirmou que, na verdade, sua empresa organizou competições em 2018, quando ele já cuidava do 3×3 na CBB, como demonstra a abertura de inscrições de um torneio de maio do ano passado. "Uma coisa não tem nada a ver com a outra", alegou. Até recentemente, no aplicativo oficial da Fiba para a modalidade, eventos como o Campeonato Brasileiro apareciam associados à conta da Ciclo 2.
Chico já estava no cargo quando a CBB anunciou a contratação de Douglas. Na ocasião, em dezembro de 2017, foi publicado no site da confederação o seguinte texto jornalístico: "A decisão não foi fácil. Deixar de atuar e seguir a rotina de jogador era uma medida simples e indolor. Mas (…) Douglas Lorite Motta resolveu passar para o outro lado do balcão e é hoje o técnico das seleções brasileiras de 3×3. O ex-jogador traz na bagagem…"
"Essa minha transição de atleta para treinador foi bem difícil, pois a gente sempre acha que dá para jogar mais um pouco. Mas foi em boa hora", afirmou o treinador na ocasião, confirmando que estava aposentado.
Um ano e meio depois, a CBB diz que não é bem assim, porque nada impede que Douglas decida participar de uma competição ou outra, o que justificaria ele continuar recebendo Bolsa Atleta quase dois anos depois de competir pela última vez. "A modalidade 3×3 é diferente, ela tá num momento de ascensão. A modalidade ainda não se ajustou. Competir de alto rendimento é assim meio aberto porque tem os torneios estaduais, torneios regionais…", inicialmente justificou Chico, que estava no Rio com Douglas e a seleção brasileira quando concedeu entrevista por telefone.
Em nota, a Secretaria Especial do Esporte havia informado ao blog que "Douglas Lorite informou no ato de inscrição no programa que deve participar neste ano do circuito nacional de basquete 3×3″. Também ao blog, Chico estranhou a informação.
"O Douglas ele não vai participar dessa competição da forma como você está falando. Se ele jogar temos que conversar e ter um entendimento sobre isso. Ele é treinador enquanto eu tenho competição dentro do calendário. Quando não tem competição ele não tem contrato com a CBB".
Mas então por que Douglas, que em 2017 disse estar aposentado, atestou à secretaria que jogaria a competição, como prova de que continua sendo um atleta? "Se ele colocou lá, ele colocou antes. Agora nós já estamos em comunicação com o ministério para resolver isso. Ninguém vai burlar nada", assegurou Chico. Por via das dúvidas, a secretaria avisou que vai monitorar o torneio para checar a participação do treinador/jogador.
Antes, entre 18 e 23 de junho, a seleção joga a Copa do Mundo da categoria em Amsterdã, na Holanda, formada por jogadores do Campinas 3×3 e do São Paulo DC. Na primeira fase, o Brasil está no Grupo D, ao lado de Letônia, Japão, Polônia e Austrália.
Sobre o autor
Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.
Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.
Sobre o blog
Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.