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Doria pede autorização para privatizar Ibirapuera, mas ignora instalações

Demétrio Vecchioli

22/03/2019 04h00

(Marcello Zambrana/ DGW Comunicação)

O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), iniciou o seu primeiro processo de privatização no Estado. Na última terça-feira (19), quatro dias depois do início da nova legislatura, ele enviou à Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) um projeto de lei que o autorizaria a conceder o Complexo Esportivo do Ibirapuera à iniciativa privada por 35 anos. O projeto não prevê qualquer obrigatoriedade de que os equipamentos esportivos existentes no local, como a pista de atletismo e o parque aquático, não sejam demolidos.

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Pelo Projeto de Lei 91/2019, o concessionário teria como obrigação a "destinação de espaços para realização de eventos e atividades esportivas, de fruição gratuita, voltadas à saúde, ao bem-estar e ao lazer da população". Não há, no texto, qualquer referência a quais serão esses espaços.

O Complexo Desportivo Constâncio Vaz Guimarães tem uma área de mais de 100 mil metros quadrados e engloba não apenas o ginásio Geraldo José de Almeida, conhecido como "ginásio do Ibirapuera", mas também outro ginásio menor, o Mauro Pinheiro, o estádio de futebol e atletismo Ícaro de Castro Mello, um complexo esportivo com tanque de saltos ornamentais e piscina olímpica e um galpão conhecido como Palácio do Judô.

A justificativa do governador para solicitar a autorização para privatizar o complexo é baseada exclusivamente no ginásio. "Cabe a São Paulo se posicionar globalmente em relação a outros destinos quanto a eventos esportivos, de lazer e entretenimento. Em razão da carência de equipamento que atenda a demanda atual, tanto o Município quanto o Estado tem perdido espaço no cenário esportivo e cultural. A atual estrutura existente tem capacidade de aproximadamente 10.000 pessoas e não atende aos padrões mínimos internacionais", argumenta Doria.

A proposta de privatizar o Ibirapuera não é nova. Em julho de 2017, o então governador Geraldo Alckmin lançou um edital de chamamento público para receber sugestões a respeito de um futuro edital, que seria lançado no começo de 2018. Mas Alckmin renunciou para concorrer à presidência da República e, seu sucessor, Márcio França (PSB), não deu prosseguimento à concessão.

Quando o processo teve início, um movimento ligado ao atletismo protestou contra a possibilidade de o Ícaro de Castro Mello ser demolido. Na ocasião, a Secretaria de Esporte argumentou que não era possível afirmar que isso aconteceria, porque os estudos ainda não haviam sido apresentados.

Procurado pelo Olhar Olímpico, o governo estadual alegou que "o projeto de lei não tem outra finalidade que não solicitar a autorização legislativa para a concessão do 'Complexo do Ginásio do Ibirapuera"' e que o PL "garante destinação de áreas para atividades esportivas com acesso público gratuito". Ainda de acordo com o governo, o processo para a concessão será detalhado e realizado obedecendo o cronograma legal.

Arena multiuso

Também foi Doria, então prefeito de São Paulo, quem deu início ao processo de privatização do Complexo Esportivo do Pacaembu, que pertence à prefeitura. Na ocasião, a oposição reclamou que o projeto de lei enviado por ele à Câmara para pedir autorização para conceder o Pacaembu era "um cheque em branco". Mesmo assim, o projeto foi aprovado com larga margem.

Na comparação com o projeto de lei do Pacaembu, o do Ibirapuera é mais rígido. O PL estipula um prazo de concessão (35 anos) e define que a o processo será por concorrência, com pagamento de uma outorga por parte do concessionário. A privatização do Pacaembu também tem essas regras, que não estavam previstas na autorização dada pela Câmara Municipal à Prefeitura.

No caso do Ibirapuera, o projeto de lei estipula que a finalidade da privatização é "a construção, instalação, manutenção e exploração de uma arena multiuso" para 20 mil pessoas, assim como "a construção, reforma, modernização, instalação, manutenção e exploração de outros equipamentos no local". Não são detalhados quais.

Na justificação, Doria ignora eventos importantes realizados no Ibirapuera recentemente, como o Brasil Open, o Jogo das Estrelas do NBB, a final da Superliga, o UFC e o Mundial de Handebol para afirmar que São Paulo tem perdido eventos para o Rio e para Belo Horizonte. E, para isso, cita eventos ou idênticos (como o NBB) ou menos relevantes, como o "Circuito Master de Tênis" e um torneio de Jiu-Jitsu.

O governo cita que, por mês, passam pelo complexo 6 mil pessoas. Só o Brasil Open de tênis, porém, afirma ter vendido 42 mil ingressos no ano passado – e 33 mil esse ano. Só o Cirque du Soleil vai fazer, a partir do mês que vem, 30 apresentações no ginásio – com capacidade para 10 mil pessoas no ginásio, representa um potencial de 300 mil pessoas passando por lá.

Doria ainda argumenta que a manutenção do complexo custa ao Estado R$ 18 milhões por ano, enquanto que a arrecadação gerada é de aproximadamente R$ 2,5 milhões. "As receitas decorrentes da referida exploração, que se somarão à valorização do imóvel em razão da implementação de obras de reforma e construção, contribuirão para incremento do desenvolvimento de políticas públicas", defende o governador, na justificação. O projeto não deixa claro, também, se o atual "ginásio do Ibirapuera" seria demolido para dar lugar à nova arena.

O sucesso da privatização deve passar pela discussão sobre a isenção ou não de IPTU para o concessionário. Hoje, o terreno tem isenção do imposto territorial, recolhido pela prefeitura, por ser um equipamento esportivo. Parte das propostas que o governo do estado recebeu considera a construção de prédios comerciais, como shopping centers, levando em consideração, nos cálculos, que a isenção de IPTU será mantida.

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Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.


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