Governo altera MP das Loterias, beneficia esporte e amplia repasses ao COB
Demétrio Vecchioli
31/07/2018 21h42
O presidente Michel Temer assinou no começo da noite desta terça-feira (31) uma nova Medida Provisória, ainda sem número, que altera a MP 841, conhecida como a MP das Loterias, que tirou mais de meio bilhão de reais ao ano do esporte. Todo esse recurso volta ao setor, como já havia sido anunciado há três semanas. Entre as novidades apresentadas na nova MP está o aumento do percentual destinado ao Comitê Olímpico do Brasil, o COB.
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A principal mudança na legislação diz respeito às confederações "estudantis", do desporto escolar e do desporto universitária, exatamente as duas mais prejudicadas pela MP de dois meses atrás, quando foram alijadas de receber qualquer financiamento a partir das loterias. Agora, elas não só voltam a ter acesso aos recursos como o farão sem precisar de intermediários.
Historicamente, CBDE e CBDU tinham dificuldades em conseguir aprovar projetos junto aos comitês olímpico (COB), paraolímpico (CPB) e de clubes (CBC), de forma que as verbas ficavam retidas em fundos específicos. Agora, elas vão receber esse dinheiro diretamente da Caixa Econômica Federal e prestar contas para o Ministério do Esporte, passando também a serem avaliadas pelo Tribunal de Contas de União (TCU). A exceção é o CPB que, por ter uma expertise específica, vai continuar gerindo os recursos do esporte paraolímpico escolar e universitário.
A nova MP nasceu para a alterar a MP 841, mas só modificou a divisão do bolo da renda de apenas um dos quatro grupos de loterias. Exatamente daquela mais importante, por movimentar mais dinheiro: a que inclui a Mega Sena. É do total arrecadado com a venda dos bilhetes das "loterias de prognósticos numéricos" que sairão 3,53% para o Ministério do Esporte, 0,5% para o CBC, 0,22% para a CBDE, 0,11% para a CBDU e 1,73% para o COB.
A versão anterior da MP previa 1,63% para o COB nesse grupo de loterias. Esse décimo percentual corresponde a quase R$ 13 milhões, uma vez que a arrecadação dessas loterias chegou próximo de R$ 13 bilhões no ano passado. O ganho fica ainda maior quando se observa que o COB antes ficava com uma parcela de 1,70% da arrecadação dessas loterias, mas tinha que dar 15% desse montante para CBDE (10%) e CBDU (5%). Agora, o dinheiro é todo dele.
Tendo como base a arrecadação de 2017, o COB sairia de cerca de R$ 192 milhões em 2017 para quase R$ 240 milhões. Um ganho próximo de R$ 50 milhões a dois anos dos Jogos Olímpicos de Tóquio.
O CPB também sai ganhando. Afinal, agora tem 0,96% da arrecadação do principal grupo de loterias, contra 1,00% a que tinha direito até junho, dos quais 15% precisava repassar a CBDU e CBDE. A partir de agora, ela gere todo esse recurso sozinho. O mesmo vale para o CBC, que manteve seu percentual de 0,5%, perdendo apenas o acesso a essa porcentagem na Loteria Esportiva (o que dá menos de meio milhão ao ano).
Todo esse ganho para o esporte só foi possível porque o governo voltou atrás da decisão de ampliar a premiação da Mega Sena. Até maio, 45,3% da arrecadação da loteria era destinada ao pagamento de prêmios. Com a MP 841, esse montante mudou para 50%, como mostrou o Olhar Olímpico. Agora, a solução foi dar dois passos atrás. A porcentagem destinada aos prêmios caiu para 43,79%. O grosso dessa diferença foi para o esporte.
Por outro lado, quem sai perdendo são as secretarias estaduais de esporte. Até a edição da MP 841, elas tinham acesso a 1,5% do arrecadado pelas loterias, percentual que caiu para 1%. Essa mudança impacta na casa de R$ 66 milhões ao ano. O dinheiro tem com destinação a organização de campeonatos escolares. É esse dinheiro que vai beneficiar os comitês.
Dinheiro para concurso de musa
Na véspera da publicação da MP, na segunda-feira, o ministro Leandro Cruz e encontrou com o presidente da Fenaclubes, Arialdo Boscolo, que conseguiu uma grande vitória. A entidade terá 0,04% da arrecadação das loterias, pouco mais de R$ 5 milhões, e deve usar o dinheiro para "em capacitação, formação e treinamento de gestores de clubes sociais". O Olhar Olímpico já mostrou que, sob essa alegação, a entidade utiliza todo o montante na organização de dois congressos por ano, reunindo cartolas para jantares de gala e concursos de miss. Nada muda.
As outras entidades beneficiadas pelas loterias têm responsabilidades maiores. A MP determina que "os recursos destinados ao COB, ao CPB, ao CBC, à CBDE e à CBDU serão aplicados, exclusiva e integralmente, em programas e projetos de fomento, desenvolvimento e manutenção do desporto, de formação de recursos humanos, de preparação técnica, manutenção e locomoção de atletas, de participação em eventos desportivos e no custeio de despesas administrativas, conforme regulamentação do Ministério do Esporte".
A nova MP, que desta vez acatou sugestões do Ministério do Esporte, ainda trás regulamentações que não existiam na MP 841. Por exemplo, determina que o ME acompanhará os programas e projetos e apresentará, anualmente, relatório da aplicação dos recursos, que será objeto de deliberação do Conselho Nacional do Esporte (CNE) para fins de aprovação. Se o relatório não for aprovado, as entidades não receberão recursos do ano subsequente.
Também determina que os recursos podem ser geridos de forma direta pela entidade beneficiada ou de forma descentralizada. Ou seja: que o dinheiro pode ser gerido pelo próprio comitê, como faz o CBC, ou dividido entre confederações, como faz o COB.
Sobre o autor
Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.
Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.
Sobre o blog
Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.