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Aliados alertaram Doria e renunciaram após convênios agora suspeitos

Demétrio Vecchioli

23/04/2018 20h00

As fraudes apontadas por auditoria feita pela Controladoria-Geral do Município de São Paulo em convênios da Secretaria de Esporte (SEME) e entidades esportivas, reveladas por reportagem de Rádio CBN, passam longe de serem novidades para quem lida com esporte em São Paulo. Foi por serem contra a execução desses convênios que os conselheiros da SEME renunciaram ao cargo no ano passado. O secretário Jorge Damião, que também tinha conhecimento do esquema, firmou os convênios mesmo assim, mas se resguardou: pediu que a controladoria cuidasse da fiscalização.

Em novembro, o Olhar Olímpico mostrou que o então prefeito João Doria (PSDB) enfrentava forte oposição para não liberar mais de R$ 11 milhões para esses "eventos pontuais", financiados por emendas parlamentares, especialmente de vereadores – mas também de deputados federais. De um lado, um grupo de conselheiros, entre eles Magic Paula, que era radicalmente contra a liberação. De outro, os vereadores da base aliada que os financiariam a partir de emendas da cota anual deles.

Na queda de braço, acabaram prevalecendo os pedidos dos vereadores, que viram as emendas serem liberadas especialmente em dezembro. Mas a secretaria não só perdeu Daniela Castro, indicada pela ONG Atletas pelo Brasil, como viu a renúncia coletiva de seus conselheiros, entre eles o empresário João Paulo Diniz e Paulo Nigro, presidente do LIDE Esporte. O LIDE, vale lembrar, é uma empresa da família de Doria. Eles nunca declararam publicamente, mas o incômodo sempre foi por conta dos eventos pontuais.

O secretário Jorge Damião se viu sozinho, liberou os convênios, mas foi até a Controladoria-Geral do Município para pedir uma auditoria. Afinal, a SEME também não teria condições de fiscalizar a aplicação dos recursos. Quase todos os 76 eventos ocorreram em dois finais de semana de dezembro, de forma concomitante. Alguns deles, escolares, em pleno período de férias.

Ao Olhar Olímpico, nesta segunda, após reunião com o prefeito Bruno Covas (PSDB), Damião fez questão de lembrar que foi por determinação dele que foi iniciada a auditoria interna nas parcerias e que, ao mesmo tempo, a secretaria pediu a fiscalização da Controladoria.

Problema antigo

Essas mesmas entidades que firmaram convênios agora suspeitos atuam na prefeitura há pelo menos três gestões. Quando ainda no Estadão, em abril de 2015, este blogueiro mostrou que um grupo de vereadores bancava uma série de convênios irregulares. Esses parlamentares circulavam em torno do ex-judoca Aurélio Miguel, que não conseguiu se reeleger para a Câmara dos Vereadores, e do deputado federal Campos Machado (PTB). À época, a controladoria prometeu uma auditoria.

Passados três anos, os mesmos problemas vêm à toa. A reportagem da CBN, única que teve acesso ao relatório preliminar até agora, relatou que o vereador Milton Ferreira, do PTN/Podemos, patrocinou sete eventos que custaram R$ 814 mil. Milton, por sua vez, terceirizou a culpa. "Esse chefe de gabinete ele me ajudou na minha campanha e eu tinha um acordo de passar algumas emendas pra ele trabalhar", disse à CBN.

O chefe de gabinete de Milton Ferreira é Mauzler Paulineti, ex-assessor de Aurélio Miguel e membro do Conselho Nacional do Esporte. Em torno de Mauzler estão a enorme maioria das entidades que conseguiram firmar mais de 80 convênios com a prefeitura no ano passado. Até 2013, ele presidia a União das Federações Esportivas (Ufeesp) e o Sindicato das Entidades de Administração do Desporto (Seadesp), que organiza eventos de MMA. Ele ainda é ligado ao Sindicato dos Profissionais de Educação Física e à Academia Brasileira de Marketing Esportivo.

A reportagem ainda revela que o vereador Caio Miranda, do PSB, chegou a enviar um ofício pedindo à Controladoria que os auditores acompanhassem a realização de um campeonato de judô que já tinha sido apadrinhado por Aurélio, seu antecessor.

Atílio Francisco (PRB) apadrinhou 14 eventos que custaram juntos R$ 2,2 milhões e, em dez deles, segundo a CBN, foram encontrados superfaturamentos. Outro vereador citado pela reportagem da rádio é Conte Lopes, hoje no PP, que disse "desconhecer do que se tratavam os eventos que apoiou". Em 2015, Conte Lopes, então no PTB, deu a mesma declaração a este repórter.

Importante ressaltar que as investigações da Controladoria ocorrem apenas no âmbito da SEME e dos convênios. Ou seja: a auditoria vai apontar onde houve irregularidade, se deve haver devolução de dinheiro e como corrigi-las. Mas o relatório será enviado ao Ministério Público Estadual de São Paulo que, se detectar a participação de vereadores ou outros agentes públicos no esquema, pode investigá-los.

As investigações

A prefeitura diz que o relatório da controladoria ainda não está pronto e que a CBN o obteve a partir de um vazamento. O trabalho vinha sendo conduzido por Guilherme Mendes, que deixou o cargo na última sexta-feira, por decisão do prefeito Bruno Covas. A reportagem do Olhar Olímpico esteve na controladoria há duas semanas, tinha conhecimento da auditoria, mas não chegou a acessá-la.

A reportagem da CBN conta detalhes do que foi encontrado: em uma das corridas batizadas de "Avenida Saúde", que custaram R$ 218 mil, apenas 12 pessoas participaram. O plano de trabalho previa 12 mil folderes e 1600 camisetas. Outro evento, de slackline, previa mais de R$ 14 mil para alugar 30 colchões de segurança. A auditoria só encontrou dois.

No fim do ano passado, a secretaria alegava que não tinha muito o que fazer, exceto apontar superfaturamento em preços. Mas se o vereador libera R$ 318 mil para um festival de rúgbi e a entidade proponente apresenta orçamentos compatíveis com o mercado para utilizar essa verba, não há muito o que fazer, exceto fiscalizar.

O primeiro convênio foi executado em setembro. Foi o Campeonato de Futebol Amador de São Mateus, na Zona Leste. Mas que o organizou não foi a Liga de Futebol de São Mateus, acostumada a firmar convênios, mas um clube de judô do Butantã, a Associação Butantã Atlético Clube. Quando a verba saiu, o campeonato já tinha começado. A prefeitura informou à época, ao Olhar Olímpico, que não havia irregularidades – o dinheiro só bancaria o restante do torneio e cabe ao vereador proponente indicar a entidade que vai organizar a competição. No caso, Milton Ferreira.

Ainda em setembro, outros convênios foram assinados e, pelo que apurou a reportagem, houve fiscalização da SEME. Um funcionário da secretaria chegou a enviar ao Olhar Olímpico o áudio de uma dirigente acostumada a firmar convênios para organizar eventos de lutas no qual ela reclamava da fiscalização e, literalmente, dizia que "assim não dá". No áudio, ela dizia que iria cancelar os demais convênios.

Outro lado

Procurada pelo Olhar Olímpico para comentar as denúncias sobre os convênios suspeitos, a assessoria da prefeitura de São Paulo soltou a seguinte nota oficial: "As investigações na Secretaria de Esportes foram iniciadas por determinação do secretário Jorge Damião, que já havia adotado novos procedimentos de fiscalização. Em função disso, cerca de 500 mil reais deixaram de ser repassados a entidades ou foram devolvidos aos cofres públicos. A Controladoria Geral do Município de São Paulo irá se manifestar quando as investigações forem concluídas. Seu relatório final será enviado ao Ministério Público".

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Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.


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