Delegada diz que material já convence para que técnico seja indiciado

Há um mês e meio como delegada em exercício da Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) de São Bernardo do Campo (SP), Teresa Alves de Mesquita Gurian acredita que já tenha elementos suficientes para recomendar o indiciamento do técnico Fernando de Carvalho Lopes por crime de abuso sexual. A investigação ocorre em segredo de Justiça desde junho de 2016, mas ganhou grande repercussão depois de reportagem do Fantástico revelar que mais de 40 atletas dizem ter sofrido abuso.

"Com o material que eu tenho, já é suficiente para formar meu convencimento. Não temos prova material, não houve o ato sexual em si, mas as vítimas todas relatam o mesmo modus operanti. Os abusos existiram. Ao final da nossa investigação, um relatório final vai ser aferido e levado ao conhecimento do promotor, para que ele o denuncie. Tudo está caminhando neste sentido", revelou a delegada ao Olhar Olímpico.

Por tratar-se de segredo de Justiça, Gurian não informou ao blog quantas testemunhas já foram ouvidas, confirmando apenas que a Polícia Civil já tem mais de 10 relatos de atletas que sofreram abuso. Na semana passada, depois que a Globo já havia iniciado a fase final de produção da reportagem exibida no domingo, mais dois ex-atletas, ambos já adultos, foram até a delegacia voluntariamente para relatar casos de abuso. Na segunda e na terça a delegacia ficou fechada, mas, na manhã desta quarta, mais um ex-atleta de Fernando apareceu para dar seu depoimento.

Leia: Como dinheiro transformou Fernando Lopes de caça-talentos a técnico de seleção

"Todas as vítimas alegavam que ele passava a mão nos órgãos genitais delas durante o treinamento e para alguns ele pedia para ver o estágio de desenvolvimento do pênis, que é uma prática absurda", diz a delegada, que acredita que a prática se configura como crime de abuso sexual. "Uma criança pode ser que não tenha entendido aquilo como abuso naquele momento, mas o técnico não pode pedir para ficar mostrando os órgãos genitais. Ele não é médico. O técnico se aproveitava da imagem de uma figura de confiança."

Siga @Olhar_Olimpico

Gurian disse que os funcionários da delegacia teriam ficado incomodados com a "sensação" deixada pela reportagem do Fantástico de que o caso estava parado. "Isso não procede. Todo mundo que trabalha aqui é vocacionado. Não é fácil trabalhar na Delegacia de Defesa da Mulher. Todos os nossos casos são prioritários, são quase todos de Lei Maria da Penha. A vida não pode ser tratado primeiro ou segundo lugar de prioridade", argumenta.

A delegada precisa remeter a investigação a cada 30 dias à Justiça e ao Ministério Público, que foi quem solicitou a abertura da investigação e diz que, se houvesse letargia, ela já teria sido advertida. "O que acontece é que temos que ouvir pessoas que estão em outras cidades, ou fora do país, e isso leva tempo", aponta. O próprio Petrix Barbosa, ginasta que topou aparecer na reportagem do Fantástico, atualmente mora em Miami, nos Estados Unidos.

Ainda que todos os relatos de abuso sexual por parte de Fernando tenham partido de atletas e ex-atletas do sexo masculino, o caso é investigado pela Delegacia de Defesa da Mulher porque não há, em São Bernardo, uma delegacia para crimes contra crianças e adolescentes. Assim, cabe à DDM investigar denúncias de abuso sexual contra vulneráveis, incluindo meninos.

Outro lado

A reportagem tentou contato com Luis Ricardo Davanzo, advogado que faz a defesa de Fernando, mas ele não retornou a ligação do UOL Esporte. Na segunda-feira, ele disse que o treinador "nega tudo".