Boxe vota se assume risco de deixar de ser esporte olímpico
Demétrio Vecchioli
02/11/2018 04h00
(Peter Cziborra/Reuters)
Começa nesta sexta-feira, em Moscou, uma eleição que pode mudar os rumos da história do boxe. Presidentes de confederações nacionais do mundo todo vão votar para escolher o próximo presidente da Associação Internacional de Boxe Amador (Aiba), sabendo de um risco iminente. O voto no favorito Gafur Rakhimov pode significar a saída do boxe do programa dos Jogos Olímpicos de Tóquio, em 2020. Ou, na melhor das hipóteses, tirar a Aiba o direito de organizar o torneio, que passaria às mãos de alguma entidade que hoje atua no boxe profissional.
A Confederação Brasileira de Boxe (CBBoxe) está entre as eleitoras de Rakhimov. Originário do Uzbequistão, uma ex-república da União Soviética, ele está desde 2012 em uma lista dos Estados Unidos relacionada aos maiores narcotraficantes do mundo. "Rakhimov foi descrito como tendo passado da extorsão e do roubo de carros para se tornar um dos principais criminosos da Uzbequistão e uma pessoa importante envolvida no comércio de heroína", explicou o Departamento do Tesouro dos EUA em dezembro, ao anunciar o congelamento de todos os bens do empresário no país. Ele nega todas as acusações e diz que foi vítima de um complô dos antigos governantes de seu país.
Em janeiro, a Aiba realizou uma assembleia em Dubai (onde Rakhimov supostamente tem residência), abriu mão de promover uma eleição para escolher um presidente e apenas referendou o nome do uzbeque como interino, até a eleição deste sábado. Desde então, o boxe tem ouvido reiteradas queixas do COI, que em julho revelou uma "preocupação significativa e contínua em uma série de áreas-chave, incluindo governança e gestão ética e financeira, que exigem mais informações e confirmações".
Entre as decisões já tomadas pelo COI está "o direito de rever a inclusão do boxe no programa dos Jogos Olímpicos de Tóquio-2020". O COI ainda disse, explicitamente, que Rakhimov for o escolhido para supostamente tentar resolver os muitos problemas administrativos apresentados pela Aiba nos últimos anos, o sinal será de que na verdade o boxe não quer resolvê-los.
Além disso, até agora, o COI não engoliu as explicações dadas pela Aiba sobre o escândalo de manipulação de resultados na Rio-2016, quando 36 árbitros foram afastados. A federação nega que qualquer luta da Olimpíada tenha tido seu resultado forjado – há suspeitas sobre vitórias de russos -, mas o comitê internacional parece não acreditar. Há ainda o fato de a modalidade ser a mais atrasada na diretriz do COI de equiparar o número de categorias masculinas e femininas.
Rakhimov ao menos não será candidato único na eleição deste sábado. Depois de ter sua candidatura rejeitada, o cazaque Serik Konakbayev, presidente da associação asiática e medalhista olímpico, conseguiu na Corte Arbitral do Esporte (CAS) o direito a concorrer. Ele deve ter o apoio de parte da Ásia e da maior parte da Europa, o que não deve ser suficiente para impedir a eleição de Rakhimov.
Em novembro de 2016, o taiwanês C K Wu, presidente da Aiba pelos últimos 11 anos, foi forçado a renunciar ao cargo, depois de se tornar insustentável sua permanência. Em julho do ano passado, o comitê executivo da Aiba aprovou um "voto de não confiança" contra Wu, alegando que sua liderança era autocrática e que ele não conseguiu dar uma imagem clara das finanças da federação. Mas Wu só renunciou depois de acertar com a Aiba que ambos retirariam todas as acusações. O italiano Franco Falcinelli então assumiu, para ficar no cargo até o congresso de Dubai, em janeiro passado.
Sobre o autor
Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.
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Sobre o blog
Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.