Comitê Rio-2016 audita dívidas e só tem dinheiro para se manter até outubro
Demétrio Vecchioli
20/08/2018 04h00
REUTERS/Nacho Doce
O Comitê Rio-2016 está perto do fim. Ao menos do ponto de vista financeiro. Enquanto contabiliza suas dívidas, o comitê organizador dos Jogos Rio-2016 não tem mais fontes de receita. E o dinheiro guardado a sete chaves, para manter uma estrutura com apenas nove funcionários, tem data para acabar: meados de outubro. Em novembro não haverá mais dinheiro para manter qualquer operação.
Contratado em junho como diretor-geral, Ricardo Trade é quem responde pelo processo de dissolução do comitê. Ex-presidente do Comitê Organizador Local da Copa do Mundo de 2014, Baka, como é conhecido, lidera uma equipe de outros oito funcionários e três colaboradores. Segundo ele, a prioridade total é apresentar até o começo de outubro um balanço financeiro auditado.
Isso porque a última vez que o Co-Rio-2016 fez um raio-x de sua situação financeira foi com base em números de 31 de dezembro de 2016. Desde então todos os números apresentados correspondiam à contabilidade interna do comitê. " Nossos stakeholders (partes interessadas) nos colocaram que precisam dos números reais. Vamos colocar à mesa os números finais", explica Baka.
O comitê sempre bateu na tecla de que, por contrato, a prefeitura e o governo do Estado têm a responsabilidade por arcarem com eventuais dívidas deixadas pelo comitê quando de sua dissolução. Essas dívidas ficarão claras daqui a cerca de 45 dias, depois que quatro empresas contratadas apresentarem seus relatórios: um balanço financeiro, uma lista de credores, e uma auditoria para cada uma desses dois documentos.
"O comitê está focado na sua missão atual, que é se dissolver. A grande ação é pegar todos esses problemas que envolvem números e auditar para que os stakeholders tenham confiança nos números que a gente citar", explica Mario Andrada, ex-diretor de comunicação do comitê e hoje um consultor voluntário.
Dissolução
Essas quatro contratações serão das últimas a serem feitas pelo comitê, que se planejou para continuar existindo por dois anos depois do fim dos Jogos apesar dos diversos processos judiciais que tentam bloquear suas contas, entre eles da GL Events, antiga parceira e hoje maior credora. "Se esse dinheiro for bloqueado, a gente pode no mesmo dia pegar a chave, trancar o escritório, e ir embora", argumenta Baka.
Com as contas e as dívidas auditadas, o Co-Rio-2016 pretende colocar todos os seus stakeholders em uma mesma mesa, em outubro. A lista inclui o Comitê Olímpico do Brasil (COB), formalmente responsável, as confederações olímpicas, que formam a assembleia, o Comitê Olímpico Internacional (COI), o Comitê Paraolímpico Internacional (IPC), os três níveis de governo e os credores. "Vamos apresentar: aqui está nossa situação hoje. E discutir o que vamos fazer para poder resolver", projeta Baka. "A partir de outubro é um novo plano, que vai ser construído com todos os stakeholders, com informações confiáveis", completa Andrada, que não quer adiantar hipótese. "Vamos estudar como cruzar a ponte quando chegar a hora de atravessar o rio."
Em meio a esse processo, o comitê não pode priorizar pagar essa ou aquela dívida, ainda que reconheça diversas delas. Isso impede que o comitê reembolse torcedores revenderam ingressos por uma plataforma do Rio-2016. Mario Andrada diz que todos aqueles que apresentaram seus dados até uma data limite foram ressarcidos. Quem fez o pedido depois, já com o comitê quebrado financeiramente, terá que aguardar as definições que vierem a serem tomadas nessa reunião de outubro.
O encontro com os stakeholders também deverá definir outras questões, como o futuro de todo o arquivo da Rio-2016, além dos direitos sobre as marcas. Processos trabalhistas são pouco mais de 300, alguns já solucionados, com o comitê pagando o determinado pela Justiça em primeira instância. "Cerca de 2/3 desses processos são de terceirizados, que processaram o comitê porque não receberam das empresas que prestaram serviço para a gente", explica o consultor de comunicação.
Prisão
Na semana passada, o Comitê Rio-2016 voltou ao noticiário policial. Edson Menezes, seu presidente, foi preso pela Polícia Federal por acusação de ter fraudado um pregão. Ainda que o pedido de prisão feito pelo Ministério Público Federal (MPF) cite o fato de ele ser o presidente do comitê e ter sido diretor financeiro do COB, a acusação nada tem a ver com sua gestão à frente do Co-Rio-2016.
"Ele não participava do dia-a-dia do comitê. Quem toca o comitê hoje sou eu, respaldado pela assembleia e pelo conselho das confederações", explica Baka, que foi escolhido como CEO pela assembleia geral do Rio-2016, em que têm direito a voto as confederações olímpicas. Depois da renúncia de três conselheiros, entre eles Luiza Trajano, do Magazine Luiza, essas confederações indicaram os presidentes das entidades de pentatlo moderno, badminton e canoagem.
Todas as decisões importantes do comitê são aprovadas por esses três cartolas, todos ligados ao COB e a Paulo Wanderley que, depois de se recusar a assumir a presidência do Co-Rio-2016, hoje trabalha em cooperação.
Sobre o autor
Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.
Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.
Sobre o blog
Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.