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Ativista LGBT e estrela do Barcelona, saltadora une a Venezuela

Demétrio Vecchioli

05/03/2018 12h32

Rojas, à esquerda, beija a namorada (reprodução/Facebook)

Em crise financeira, política e institucional, com milhões passando fome, a Venezuela encontra poucos motivos para sorrir. Um deles responde pelo nome de Yulimar Rojas. Aos 22 anos, a triplista parece ser a única unanimidade em um país dividido entre aqueles que apoiam o regime cada vez menos democrático de Nicolás Maduro e os tantos que, para sobreviver, atravessam fronteiras rumo a qualquer lugar que os permita um prato de comida. No fim de semana, foi a foto dela que estampou a capa de todos os jornais do país.

Rojas é um exemplo do país que deu certo, para os dois lados. Há quem aponte que só depois de deixar o país, como milhões de outros venezuelanos se veem obrigados, é que a triplista conseguiu se estabelecer como a melhor do mundo no salto triplo. Rojas, afinal, leva uma boa vida na Espanha, onde mora desde 2015.

Mas não há como negar, ao mesmo tempo, que o regime socialista tem muita influência nos resultados de Rojas. A saltadora mora na Espanha porque lá é a base de treinamento de Iván Pedroso, seu técnico, um dos muitos cubanos que aproveitou o estímulo estatal do governo castrista para se tornar o melhor do mundo, no salto em distância – Pedroso foi nove vezes campeão mundial seguido, entre 1993 e 2001, nas competições a céu aberto e indoor. Além disso, foi a federação venezuelana de atletismo quem inicialmente franqueou sua ida à Espanha.

Alegria e problemas na mesma capa do La Verdad

Hoje, Rojas já caminha com pernas próprias. Antiga saltadora em altura, prata dos Jogos Bolivarianos em 2013, ela começou naquele ano a ter seus primeiros resultados nos saltos horizontais. Em 2015, já era campeã sul-americana no triplo. Foi por essa época que surgiu no Facebook a "sugestão de amizade" com Pedroso. Rojas o adicionou, enviou uma mensagem a ele se apresentando com uma jovem venezuelana que o tinha como fã, pedindo para ser aceita como sua atleta. Ele aceitou e, em novembro ela se mudava para Guadalajara.

As coisas a partir dali aconteceram rápido. Em março de 2016, o primeiro título mundial, indoor. Em agosto, a prata na Rio-2016. Em novembro, a contratação para ser a estrela da equipe de atletismo do Barcelona. Não que o Barça tenha um grande time, mas é o atual campeão nacional feminino, sendo Rojas sua principal atleta, a ponto de ter merecido apresentação oficial no Camp Nou.

(Paco Largo/Barcelona)

Foi também no fim de 2016 que Rojas assumiu sua homossexualidade. Sem escândalo, sem grandes declarações, passou a postar nas redes sociais fotos com a namorada. Na premiação de gala da Associação das Federações Internacionais de Atletismo (IAAF), no fim do ano passado, chegou de mãos dadas com a nova acompanhante, Maria Gomez, a quem apresentou ao mundo como namorada.

Um passo enorme num país onde os direitos dos homossexuais são quase nulos – os casamentos entre pessoas do mesmo sexo não são reconhecidos, nem mesmo para efeitos de planos de saúde ou herança, por exemplo. "Tenho uma relação muito bonita com essa pessoa (Maria), ela é muito importante para mim, e gostaria que no meu país se pudesse respeitar o amor entre pessoas do mesmo sexo", defendeu Rojas, em entrevista ao site El Estímulo, de oposição.

De acordo com o El Estímulo, ela é a primeira atleta venezuelana a assumir sua sexualidade, além de ser também a primeira a ser campeão mundial de atletismo. Ao mesmo site, ela defendeu o respeito à igualdade de gênero, disse que se sente identificada com atletas que lutam por mais espaço para as mulheres, e revelou que nunca sofreu nenhum "inconveniente" por ser homossexual.

Suas aparições na Venezuela são cada vez mais raras. Entre o título mundial do ano passado, em Londres, e o título mundial indoor de sábado, em Birmingham, também na Inglaterra, só teve uma rápida passagem pelo país. Seus planos são continuar na Europa. "Espero continuar treinando ali por muitos anos, consolidar minha carreira em Guadalajara e trabalhar para que o esporte na Venezuela seja maior, mais bonito e mais reconhecido", disse ao El Estímulo.

 

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Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.


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