Bobsled do Brasil ganha respeito fora do país e mira Top15 na Olimpíada
Demétrio Vecchioli
29/01/2018 04h00
A cada nova Olimpíada de Inverno, a participação do Brasil no bobsled supera mais um pouco a aparência de uma aventura exótica. Em 2018, qualquer comparação com a história do time jamaicano eternizado no filme Jamaica Abaixo de Zero é não apenas fantasiosa, como também injusta. O Brasil que vai aos Jogos de Pyeongchang é experiente, bem treinado e bem estruturado. E tem motivos para sonhar longe.
Pela primeira vez, o Brasil repetiu as principais potências da modalidade e vai competir não apenas no 4-men (trenó com quatro pessoas), mas também no 2-men (com duas). Como acontece com os favoritos, o mesmo piloto estará à frente dos dois trenós: Edson Bindilatti, 39 anos, que irá disputar sua quarta Olimpíada, um novo recorde em se tratando de brasileiros nos Jogos de Inverno – continuará empatado com Isabel Clark e Jaqueline Mourão.
A maior expectativa de resultado vem no 4-men, que terá Edson como piloto pela segunda vez consecutiva – ele foi um dos empurradores em 2002 e 2006 e, em 2010, o Brasil não participou. Depois de sempre lutar contra a última colocação, desta vez o time brasileiro vem credenciado pelo 21º lugar do ranking mundial, atrás apenas de trenós das potências: Alemanha, Canadá, EUA (cada um terá três times na Olimpíada), Letônia, Rússia, Áustria, França, Grã-Bretanha e Suíça (dois cada), exceto a França. Na Coreia do Sul, serão 30 competidores.
"A gente não está mais brigando pelos últimos lugares, mas na parte de cima das colocações. Temos mostrado que somos competitivos contra esses grandes times. Não temos a arrogância de falar que vamos ganhar uma medalha, mas de fazer um bom resultado. Dentro do circuito, do mundo do bobsled, a gente é muito respeitado, porque mostramos que não estamos lá para brincar. Para a gente, isso é muito importante. A gente chega numa competição e eles sabem que a gente não está para passear, para brincar", diz Edson.
A expectativa é alta. "Nossa ideia é ser top 15, quem sabe até top 10", aposta. No mínimo, o quarteto quer pela primeira vez se classificar para a segunda metade da prova, após duas descidas, restrita aos 20 primeiros. Ou seja: voltar para o segundo dia de competições, 25 de fevereiro.
Pela primeira vez, o 4-men terá um equipamento de ponta. "Em Sochi, a gente tinha um time fisicamente bom, nosso push (o ato de empurrar o trenó) foi o 14.º melhor, mas não tinha material adequado. Tínhamos uma lâmina só. Hoje a gente está indo com um time fisicamente muito forte, oito jogos de lâminas e um trenó competitivo. Não dá para comparar com os times que têm fornecedor próprio, trenó desenvolvido por BMW, Audi, mas o nosso é o melhor que tem para vender", explica Edson.
Outros fatores pesam a favor do Brasil. Um deles, o fato de a equipe ter tido a possibilidade de treinar na pista olímpica antes de viajar para os Jogos, algo que não aconteceu em Sochi. "Tirando os coreanos, todos treinaram lá mais ou menos o mesmo tempo que a gente", conta. Além disso, por ter oito lâminas e quase um mês inteiro para treinar (o Brasil viaja dia 1º), será possível escolher a lâmina mais adequada.
No 2-men, as chances são menores, mas ainda assim o Brasil sonha em passar para o segundo dia de disputa, em 19 de fevereiro. Para tanto, conta com um trenó alugado. "Um atleta dos Estados Unidos ficou sem vaga e alugou para a gente. É um bom equipamento", revela o piloto brasileiro.
Em sua quarta Olimpíada, ele deixa de lado o ego, diz que não se preocupa em entrar para a história do esporte brasileiro, e prefere se preocupar com o legado esportivo da empreitada. "Nosso objetivo é fazer um bom resultado para que a modalidade seja mais conhecida, atraia investidores, mais atletas, e forme grandes times. Não vai ser agora, mas quem sabe futuramente a gente possa ganhar uma medalha olímpica", sonha.
"Venho do atletismo, que é uma modalidade de alto rendimento que sempre pensou em resultado, na coisa certa. Não queria que fosse diferente aqui. Por isso, sinto que faço parte da história do lado positivo", continua Edson, que veio do decatlo e não gosta de falar publicamente sobre o passado, quando liderou um movimento de atletas para tirar do comando da Confederação Brasileira de Desportos no Gelo (CBDG) o primeiro piloto do bobsled brasileiro, Eric Maleson, que foi afastado pela Justiça e hoje é voz crítica contra o COB e Carlos Arthur Nuzman.
Possivelmente, essa será sua última Olimpíada. Depois dos Jogos na Coreia, Edson quer iniciar um processo de transição para um novo piloto, que ainda precisará ser formado. "Se eu paro hoje, tem mais três que empurram o trenó e não vão poder competir mais porque não tem piloto. Precisa ser algo natural", atesta.
Sobre o autor
Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.
Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.
Sobre o blog
Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.