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Corinthians e Fla entram em disputa do COB e podem ajudar a mudar o esporte

Demétrio Vecchioli

28/11/2017 04h00

Quando os representantes de 15 confederações escolheram anular o voto de um de seus pares para autorizar que apenas cinco atletas façam parte do colégio eleitoral do Comitê Olímpico do Brasil (COB), provavelmente imaginaram que estavam, assim, se não ganhando força, ao menos perdendo menos do que o previsto. Seis dias depois da polêmica assembleia extraordinária, porém, o que se vê é uma bola de neve que vem ganhando força e que quer empurrar esses mesmos 15 dirigentes penhasco abaixo. E o apoio de clubes como Corinthians, Vasco, Flamengo e Botafogo só reforça esse movimento.

Na segunda-feira, um grupo de 12 clubes que participam de competições de remo divulgou um comunicado conjunto cobrando o presidente da Confederação Brasileira de Remo (CBR), Edson Altino Pereira, por ter votado contra a proposta da estatuinte do COB, que sugeria que 12 atletas tivessem direito a voto no comitê. E aproveitaram a deixa para para exigir maior espaço para atletas e para os próprios clubes dentro da própria CBR.

Se a ideia dos cartolas dessas 15 confederações era manter o status quo, o tiro saiu pela culatra. Sozinho, o exemplo do remo, esporte que tem uma comunidade relativamente pequena de praticantes, pode parecer de pouco impacto. Mas, colocado ao lado de outras demonstrações dos últimos dias, ganha grande dimensão. Nunca houve um movimento tão forte no esporte brasileiro defendendo mudanças.

A postura de Paulo Wanderley, de convocar uma estatuinte no mesmo dia em que herdou a presidência do COB, já foi uma elogiada demonstração de abertura para essas mudanças. Até porque o Ministério do Esporte vinha cobrando o comitê a implantar uma série de medidas, sob o risco de deixar de receber recursos da Lei Agnelo/Piva – na semana passada, ambos assinaram um Termo de Ajustamento de Conduta, que vai nesse sentido.

Se quase todas as alterações propostas ao estatuto do COB foram aprovadas de forma unânime pelas confederações, foi exatamente a forma como aconteceu a única rejeição que chamou a atenção. Afinal, não foi a vontade da maioria que prevaleceu, mas uma jogada estratégica de um grupo de confederações que se valeu do fato de o representante da CBRu (rúgbi) sair mais cedo para anular seu voto. As 15 confederações que fizeram o movimento passaram ali um recado: continuavam apegadas ao que os clubes de remo chamam de "o velho sistema estrutural e político esportivo brasileiro".

Depois de prevalecer tantas vezes, agora essa "velho sistema" encontrou resistência. Primeiro, da ONG Atletas pelo Brasil, que se posicionou duramente. Na sequência, fizeram o mesmo a própria Comissão de Atletas do COB, que pela primeira vez subiu o tom de voz contra as confederações, e também a Comissão Nacional de Atletas (CNA), que tem Zico como presidente.

Os mesmos atletas que em outras oportunidades temeram por retaliação, desta vez se sentiram encorajados a expor publicamente seus sentimentos de contrariedade. Nas redes sociais, divulgaram a lista de confederações que votaram contra seus interesses e alteraram suas fotos de perfil para avisar que "atleta não é palhaço". A comissão de atletas da Confederação Brasileira de Vôlei (CBV) soltou comunicado criticando o presidente Walter Laranjeira por votar contra os interesses dos atletas, da mesma forma que a associação dos jogadores de basquete elogiou o voto da CBB e reclamou que "o COB perdeu uma grande oportunidade de sinalizar que está disposto a melhorar". Ídolos como Gustavo Borges, Nalbert e Magic Paula deram o exemplo.

A pressão deu resultado, a ponto de o COB anunciar a convocação de uma nova assembleia geral extraordinária para o próximo dia 6 de dezembro, para votar de novo a abertura de seu colégio eleitoral a 12 atletas. Com alguns dirigentes já anunciando publicamente que mudarão de lado, a proposta deverá ser enfim aprovada.

Empoderados como nunca, os atletas, porém, vão querer mais. Afinal, o COB vai ter aberto suas portas a eles, mas as próprias confederações ainda fazem muito pouco. Exceto algumas poucas, com destaque para as de atletismo, basquete e vela (a única que faz eleições diretas), a maioria delas dá quase nenhum poder de decisão aos atletas. Na de Desportos Aquáticos (CBDA), por exemplo, o estatuto previa 1/6 de voto de atleta contra 27 de federações. E a eleição acabou tendo mais de 100 votos de clubes, as 27 federações e só um atleta.

Em teoria, essas confederações hoje respeitam o que diz a Lei Pelé, uma vez que o texto do famoso artigo 18-A depende de uma regulamentação que detalhe, por exemplo, qual a representatividade mínima para atletas. Só que isso também está prestes a mudar. Há duas semanas, a ONG Atletas pelo Brasil teve um dia de reuniões em Brasília e acertou com o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, uma agenda de pautas esportivas. Entre elas, essa regulamentação.

Ou seja: ao entrarem numa briga na qual vão acabar saindo derrotados, esses dirigentes do "velho sistema" empoderaram um grupo de atletas que será decisivo na aprovação de regras que vão determinar, entre outras coisas, o espaço para os atletas dentro das confederações. E se enfraqueceram a ponto de permitirem que os clubes também subam o tom.

É o exemplo do remo. No comunicado assinado por clubes como Flamengo e Corinthians e citado no início deste texto, eles não cobram a CBR só sobre o voto na assembleia do COB. Vão além: também querem uma estatuinte para rever o estatuto da confederação, com representantes dos clubes e dos atletas, para que o colégio eleitoral passe a ter participação de clubes e atletas.

Ainda é cedo para dizer se de fato essas cobranças terão impacto. Mas o primeiro passo foi dado. E o segundo, o terceiro, o quarto… Como numa luta de boxe (aliás, outra das entidades que votou pela manutenção do status quo), atletas e clubes estão caminhando para frente, enquanto as confederações se aproximam, de marcha ré, das cordas. Pode até ser que elas consigam sair de lá, mas possivelmente bastante feridas.

 

 

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Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.


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