Pego no doping em novembro, Somália tem caso no 'limbo' e segue jogando
Demétrio Vecchioli
10/09/2017 04h00
Satiro Sodré/Agif/Divulgação
No jogo no qual eliminou o Aparecidense, de Goiás, e avançou às quartas de final da Série D do Campeonato Brasileiro, em julho, o América-RN contou no banco de reservas com o volante Somália, jogador com passagem pelo Botafogo. Já fazia oito meses desde que ele havia sido flagrado em exame antidoping pelo uso de um corticoide, situação mantida em sigilo até hoje. Foi em um jogo da Série B do ano passado. Até agora, não há qualquer sinal de julgamento.
Não é o que diz Somália. "O advogado do CRB apresentou a minha defesa e eu fui liberado para atuar", disse ao Olhar Olímpico. "Nunca usei nada para me favorecer ou esconder algo em meu corpo. Quem pode esclarecer outras dúvidas é o advogado do CRB", completou. No caso, Osvaldo Sestário, figurinha carimbada no ramo do direito "futebolístico", que diz nunca ter ouvido falar da situação. "Esse caso não chegou até mim".
O resultado analítico adverso de Somália foi identificado após o jogo de 19 de novembro do ano passado, contra o Brasil de Pelotas, pela Série B do Campeonato Brasileiro. O blog procurou em todos os "editais", "resultados" e "acórdãos" do site do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) do futebol e não encontrou nenhuma citação a Somália – Paulo Rogério Reis Silva – desde então. Depois de atuar pelo América-RN, Somália voltou a São Paulo para cuidar de um problema pessoal.
Subprocurador-geral da 1ª Comissão Disciplinar do STJD do futebol e presidente do Tribunal de Justiça Desportiva Antidopagem (TJDAD), Luciano Hostins diz que o caso não está no primeiro órgão, mas não pode comentar a respeito do segundo, que usa uma polêmica interpretação da lei brasileira e do código da Agência Mundial Antidoping (Wada) para manter sigilo sobre todos os seus processos.
Ainda que o blog tenha apurado que Somália é um dos 14 jogadores de futebol que estão aguardando julgamento no TJDAD, essa informação não é confirmada pelo tribunal. Da mesma forma, o TJDAD não revela se Somália é um dos oito jogadores que já tiveram sua suspensão provisória assinada por Luciano Hostins e remetida na sexta-feira à tarde para a CBF, após a denúncia do UOL – entenda aqui.
A situação de Somália é ainda mais peculiar por ele ter sido flagrado ainda em novembro. O TJDAD foi criado no fim de 2016, mas só foi implantado de fato em 9 de maio. Até então, foi acertado com o STJD do futebol que todos os procedimentos abertos até esta data seriam julgados pelo STJD ou pelos TJDs estaduais, para o caso de atletas flagrados nos regionais. Os seguintes, pelo TJDAD.
Atualmente, no STJD, estão apenas dois casos. Um, do zagueiro Marquinhos, do Figueirense. Ele foi flagrado em 6 de novembro (menos de duas semanas antes de Somália) e recebeu suspensão provisória em fevereiro. Um julgamento no STJD chegou a ser marcado, mas foi adiado porque a defesa pediu análises de DNA. Ele segue jogando.
O outro é o de Leandro Cardoso, que já foi julgado em segunda instância. O defensor, pego em exame antidoping na partida entre o CSA, clube que ele defendia, e o São Bento, no dia 11 de setembro, até chegou a jogar pelo Rio Branco-PR antes de ser suspenso, este ano. Ele levou dois anos de gancho e só poderá voltar a atuar em abril de 2019.
De acordo com listagem da Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem (ABCD), há atualmente no Brasil apenas cinco jogadores de futebol suspensos por doping após julgamento. Além de Leandro, os irmãos gêmeos Mario e Matheus Augusto Destro, que atuavam no São Carlos, time do interior de São Paulo, estão fora até 2018. O lateral Medina, ex-União Barbarense, também levou dois anos de gancho e será liberado em maio do ano que vem, enquanto Wagner Peres, meia que defendia Água Santa, foi flagrado por substância encontrada na cocaína e ficará suspenso até 2020.
Entre 2010 e 2016, a CBF registrou 62 casos de doping no Brasil, uma média de nove por ano. Os 14 resultados analíticos adversos deste ano (incluindo aí o do meia Ederson, do Flamengo, que tem câncer e não será processado) foram todos identificados até abril, durante a realização dos Estaduais. Assim, o número total ainda não sofre impacto do início dos exames surpresa nos clubes da Série A, a partir de julho.
Sobre o autor
Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.
Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.
Sobre o blog
Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.