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Rio tem 6 ginásios olímpicos, mas Fla depende de gambiarra para jogar NBB

Demétrio Vecchioli

14/11/2019 04h00

NBB diz que a arquibancada da imagem tem capacidade para mil pessoas sentadas (Fábio Balassiano/Blog Bala na Cesta)

Maracanãzinho, Arena da Barra (Jeunesse Arena), Arena Carioca 1, Arena Carioca 2, Arena Carioca 3 e Arena da Juventude (Deodoro). O Rio de Janeiro tem seis ginásios que foram construídos ou reformados para receber os Jogos Olímpicos de 2016. Mas o Flamengo precisou praticamente construir um ginásio provisório para poder disputar no Rio duas partidas do NBB esta semana, na terça (12) e na sexta (15).

Os dois jogos foram marcados para a Arena Carioca 2, que recebeu as competições de judô e wrestling na Rio-2016 e que foi desmontada depois dos Jogos. No "modo legado", o local é um galpão, sem quadra, sem arquibancada, que pode receber treinamentos de diversas modalidades ao mesmo tempo. Ali fica o CT do wrestling, por exemplo.

Jogar contra Pato Basquete e Mogi na Arena 2 foi a única solução encontrada pelo Flamengo, que também chegou a especular montar uma quadra no meio do Velódromo mas desistiu porque a iluminação daquela estrutura é voltada para a pista, não para o miolo, onde seria o jogo. A opção foi instalar uma quadra provisória, uma arquibancada provisória, e espalhar cadeiras.

Todos os outros ginásios olímpicos estavam vetados. A Arena Carioca 1 teve um evento de e-esporte no fim de semana e a desmontagem ainda não teria terminado. O Maracanãzinho, administrado pelo Flamengo, não tem piso para jogos de basquete. A Jeunesse Arena também não – além disso, o aluguel lá é considerado fora da realidade do esporte brasileiro. A Arena da Juventude vai receber um evento escolar no fim de semana e não poderia ser usada na sexta.

A falta de ginásios é um problema crônico da cidade que, há três anos, recebeu os Jogos Olímpicos. Tanto que existe uma corrida desenfreada pela locação do ginásio do Tijuca Tênis Clube, considerado o mais bem localizado, e que é a casa de quatro equipes profissionais e de todos os muitos times de categorias de base do próprio Tijuca. A demanda é muito maior do que a oferta.

A noite de terça-feira foi um exemplo. O time masculino de basquete do Flamengo, se pudesse escolher, jogaria no Tijuca. Mas o time feminino de vôlei do próprio clube rubro-negro chegou antes. Depois, na sexta, nenhum dos dois vai poder jogar no Tijuca porque desta vez foi o time feminino de vôlei do Sesc a bloquear a data – tanto que o Flamengo vai jogar na Superliga neste dia na Gávea. Nessa briga, o basquete saiu atrás, porque o NBB divulgou sua tabela detalhada depois da Superliga.

O Tijuca não diz quanto cobra pelo aluguel do ginásio. Cita apenas que é "menos do que R$ 20 mil", mas o Olhar Olímpico apurou que o valor gira em torno de R$ 8 mil ao menos para um cliente. O valor é menos do que os R$ 11 mil em tese cobrados pelo governo federal pela Arena 1 (leia mais adiante) e o ginásio tem o benefício de vir com a operação pronta – é chegar e jogar. No Parque Olímpico é necessário terceirizar a operação.

Por isso, a concorrência é grande. Só nos próximos 37 dias, até a folga de fim de ano, o ginásio está reservado para 15 jogos de três equipes de vôlei: Sesc (masculino e feminino) e Flamengo. Seriam mais partidas se houvesse datas, porque o Flamengo fará ainda mais um jogo na Gávea. Isso sem contar o time de basquete do Flamengo, que faz outros três jogos no período em "local não confirmado", pelo que consta na tabela do NBB.

Concessionário do Maracanãzinho, o clube não considera por enquanto levar jogos para o maior ginásio da cidade, como fez na final do NBB passado. O time feminino do Sesc jogou diversas vezes na Jeunesse Arena, na Barra, mas não renovou para esta temporada o contrato com a dona do naming rights do ginásio. O Sesc, como entidade, também rescindiu o acordo que tinha com a prefeitura para utilizar a Arena Carioca 3. E ninguém se interessa em jogar na distante Arena da Juventude, em Deodoro.

O Botafogo conseguiu uma autorização especial do NBB para seguir jogando em seu ginásio particular ao menos nas quatro primeiras rodadas do torneio. General Severiano tem capacidade para 720 pessoas, e nenhum espaço para construir arquibancadas provisórias. Foi aceito um plano de se retirar poltronas, ainda não executado. Já o time feminino do Fluminense, no vôlei, tem alugado o acanhado ginásio da Hebraica, nas Laranjeiras, onde cabem menos de 700 pessoas, também.

Contrato secreto

O Ministério da Cidadania mantém em sigilo como se deu a locação da Arena Carioca 2 para o Flamengo. A pasta diz que o contrato é regulado pela Portaria nº 37, da Autoridade de Governança do Legado Olímpico (AGLO), que deixou de existir em julho. Em entrevista ao Olhar Olímpico ainda em julho, o secretário-adjunto de Esporte, coronel Marco Aurélio Araújo, disse que, com o fim da autarquia, deixava de valer também a portaria.

O governo, porém, segue usando aquele documento que precifica o valor de aluguel, o que, para dois advogados ouvidos pelo Olhar Olímpico, ambos especializados em contratos públicos, é ilegal. O blog já perguntou três vezes ao Ministério da Cidadania qual o entendimento jurídico que justifica que a portaria siga sendo usada, mas a pasta não responde as mensagens com este teor.

O Ministério da Cidadania também diz que "as informações sobre os contratos de utilização das arenas olímpicas administradas pelo Ministério da Cidadania são publicadas no Diário Oficial da União (DOU)", mas, desde o fim da AGLO, o Olhar Olímpico não localizou nenhum contrato publicado no DOU referente ao aluguel das arenas. O governo não respondeu aos questionamentos sobre quanto cobrou pelo aluguel. O site da AGLO não tem sido atualizado.

Antes de a Arena Carioca 2 ser usada pelo Flamengo, ela serviu por mais de uma semana para treinamentos da seleção feminina de basquete. O Comitê Olímpico do Brasil (COB), que tem administrado o basquete enquanto a CBB está impossibilitada da receber recursos públicos, confirmou que nunca assinou qualquer contrato de aluguel. "O COB enviou todos documentos solicitados e aguarda envio da versão final do Termo de Intenções a ser formalizado entre as partes", informou a entidade.

Capacidade fere o regulamento

O regulamento do Novo Basquete Brasil (NBB) é claro: "as arenas deverão ter capacidade mínima para 1.000 pessoas sentadas, salvo por determinação do Conselho de Administração, em situações que julgar pertinente". A Liga Nacional de Basquete (LNB), que organiza o torneio, admite que não fez qualquer vistoria para calcular a capacidade de público da Arena Carioca 2.

Apenas aceitou um contrato firmado entre o seu atual campeão e a empresa que montou as arquibancadas provisórias, que apontava capacidade para 1.000 pessoas sentadas, sendo 902 na arquibancada e outras 100 em cadeiras.

Para chegar a esse número, a empresa que montou a arquibancada considerou que cada assento teria 40 centímetros. Documento do antigo Ministério do Esporte que disciplina segurança em estádios de futebol (não há regras específicas para ginásios) exige assentos de 46 centímetros. Esse mesmo documento cita que 95% de homens e mulheres têm 48 centímetros de medida ombro a ombro. Considerando 46 centímetros por assento, a capacidade seria de no máximo 700 pessoas.

Ao blog, a LNB disse que "o Flamengo apresentou o contrato feito com a empresa responsável pela montagem das arquibancadas e o mesmo atesta a capacidade de 1.000 lugares" e citou que "a equipe rubro-negra colocou 100 cadeiras de quadra".

Já o Flamengo informou que tinha 200 cadeiras para colocar na altura da quadra, se fosse necessário, o que não aconteceu por que o jogo teve pouco público. O do blog Bala na Cesta escreveu texto criticando a presença de apenas 346 jogos na primeira partida do atual campeão no Rio – nas duas primeiras rodadas, o Flamengo mandou suas partidas em Brasília, exigência de um contrato de patrocínio.

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.