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Olhar Olímpico

Melhor maratonista brasileiro ataca confederação e vai boicotar Mundial

Demétrio Vecchioli

21/08/2019 04h00

Daniel Chaves (divulgação)

Melhor maratonista do país na atualidade, Daniel Chaves não irá disputar o Mundial de Doha (Qatar) em outubro, em resposta ao que julga ser uma falta de apoio da Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt). Faltando pouco mais de cinco semanas para a prova, ele reclama que sequer foi ainda convocado para a competição e que só recebeu na segunda-feira (19) uma ligação da entidade "especulando" seu interesse em representar o Brasil em um Mundial pela primeira vez.

"Nós sabemos que se preparar para uma maratona demanda três meses. Estamos há um mês da viagem e não tenho tempo hábil para treinar. Iria faltar preparação e eu iria chegar aquém do que eu posso exibir, ainda mais num Mundial de altíssimo nível. Apenas ontem (segunda) tivemos uma sondagem se iríamos para o Mundial, sem se falar em preparação, em nada", explicou Daniel, ao Olhar Olímpico.

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O corredor, que só no ano passado completou sua primeira maratona, foi 15º colocado na fortíssima Maratona de Londres desse ano com o tempo de 2h11min10s e lidera o ranking brasileiro. Pelos critérios de convocação da CBAt, cinco brasileiros fizeram índice para o Mundial, mas a preferência é pelos três melhores tempos. Ainda assim, na segunda, a confederação o convocou para disputar o Sul-Americano de Maratona, que vai acontecer uma semana antes do Mundial, na Argentina. "Temos um Mundial e eles me convocam para um Sul-Americano? Eu preciso adivinhar que eu vou para o Mundial? Eles não falam nada. Se eu sabia que ia ser convocado, eles também", protesta.

A marca feita em Londres é índice olímpico para a federação internacional (IAAF), mas, faltando menos de um ano para a Olimpíada, a CBAt ainda não anunciou quais os critérios de qualificação para o Brasil. Por isso, mesmo com índice, Daniel não pode dizer que está classificado para Tóquio. "A IAAF já soltou há seis meses. O mundo todo sabe o que precisa fazer para ir à Olimpíada, por que a gente não sabe?  Sem a CBAt confirmar os índices eu não tenho apelo para os patrocinadores, de já ser classificado. Aí perco apoio privado, e já não tenho apoio público nenhum", lamenta Daniel.

A demora da CBAt em anunciar seus critérios de classificação vem incomodando a atletas e treinadores. Durante os Jogos Pan-Americanos, diversos atletas fizeram resultados que valeriam índice internacional, mas não puderam comemorar a classificação olímpica. Outros terminaram suas provas sem saber se deveriam ter dado um pouco a mais pelo índice – Altobeli Santos levou bronca por festejar a vitória nos 3.000m com obstáculos antes da reta final, perdendo segundos que provavelmente o dariam o índice.

Mas Daniel Chaves reclama que sua situação é ainda pior. "Eles tão pagando a preparação do 4x100m com foco em Doha desde o começo do ano. Os lançadores fizeram dois camping. Os velocistas fizeram dois camping, fizeram um baita resultado, fruto dos treinamentos, mas por que eu não posso ter esse direito também? O revezamento são seis, com treinador, fisioterapeuta e não sei o que. Eu sou só eu e meu treinador. Não tenho nada do COB e da CBAt, nada. Nem uma ligação: 'Ô seu m…, que é o melhor da maratona, você tá precisando de algo? De um psicólogo?' Passei por um período barra pesada de depressão ano passado, superei, mas estou voltando ao fundo do poço porque não consigo me preparar para o meu sonho".

Como mostrou o Olhar Olímpico, Daniel chegou a largar o esporte no ano passado, quando passou por período de depressão profunda. Ele chegou a tentar se matar, mas conseguiu se recuperar graças ao esporte. Mesmo depois dos ótimos resultados nos últimos meses, segue sendo atleta amador, dividindo o tempo entre os treinamentos e uma assessoria esportiva.

Procurada, a CBAt não quis comentar.

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.