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Olhar Olímpico

Federação de futebol society fará próximos amistosos da seleção feminina

Demétrio Vecchioli

18/06/2019 15h00

Seleção feminina que disputa o Mundial (divulgação)

A Federação Internacional de Futebol 7 Society, que tem no currículo quatro "Mundialitos" de society e futebol de areia, é a responsável pela organização dos próximos amistosos da seleção feminina do Brasil. A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) ainda não assinou os documentos, mas já deu o aval para que o Brasil volte a jogar em agosto e setembro, em São Paulo, no Pacaembu, em um torneio do qual também devem participar Itália, Canadá e México. A competição é financiada com recursos da Lei de Incentivo ao Esporte (LIE) e já arrecadou pelo menos R$ 1,4 milhão.

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O projeto foi apresentado ao Ministério do Esporte ainda em 2017 pela Fif7, uma entidade com diretoria 100% brasileira, criada para organizar competições de futebol society, sempre com dinheiro incentivado. O projeto tem o nome de "Torneio Internacional Feminino de Seleções", repetindo o "Torneio Internacional" usado em oito competições entre seleções femininas entre 2009 e 2016 – as quatro primeiras delas exatamente no Pacaembu.

Esse torneio pertencia à empresa Sport Promotion, parceira histórica da CBF e do ex-presidente Marco Polo Del Nero. Em 2017 o evento foi cancelado depois que a Caixa Econômica Federal, principal patrocinadora, retirou o apoio.

Para 2018, quem assumiu a responsabilidade pelo torneio foi a Fif7. O calendário da Lei de Incentivo, porém, inviabilizou que a competição fosse realizada no fim do ano passado, como previsto, e foi feita uma readequação para que ela aconteça em agosto próximo. Seriam duas rodadas, nos dias 29 de agosto e 1 de setembro – datas Fifa. A seleção feminina não joga no país desde o fim de 2016.

Procurado pela reportagem, o coordenador de futebol feminino da CBF, Marco Aurélio Cunha, disse que não poderia falar sobre o torneio porque quem o promove é a Sport Promotion. A prefeitura de São Paulo, por sua vez, disse que chegou a ser procurada pela Sport Promotion, mas que não havia fechado o aluguel do Pacaembu. O Consórcio Patrimônio SP, que deve assumir o estádio a partir de 10 de julho, informou que não foi procurado pelos organizadores. Em agosto, o estádio deverá estar em gestão compartilhada, com os acordos firmados pela prefeitura mantidos.

Quando o Olhar Olímpico procurou a Sport Promotion, foi informado que na verdade a competição é da Fif7 e que a empresa só estaria atuando na "comercialização do projeto", enviando o plano comercial para potenciais patrocinadores. Ou seja: é ela quem lida com o dinheiro que entra no projeto. A Fif7 é quem presta contas ao governo.

"Mexer com dinheiro do governo é mexer com dinheiro do povo. Quando a gente faz, a gente faz um negócio bem feito. Um dos parceiros que a gente gosta sempre de trabalhar é a Sport Promotion", diz Marcelo Sangiovanni, que é vice-presidente da Fif7 e toca a entidade no dia a dia.

Vale ressaltar que a Lei de Incentivo ao Esporte não permite que empresas privadas sejam proponentes. É comum que entidades de atuação restrita a projetos incentivados apresentem projetos para organizar eventos sabidamente pertencentes a grandes empresas. O Olhar Olímpico já mostrou diversos casos, os dois maiores do Brasil Open e do Rio Open de tênis.

Marcelo Sangiovanni, que comanda a Fif7 (reprodução/Facebook)

Lei de Incentivo

Com a promessa de contar com a seleção brasileira no torneio, os organizadores conseguiram pelo menos R$ 1,4 milhão. No sistema de transparência da Secretaria Especial do Esporte (que não é atualizado em tempo real) constam doações do supermercado Atacadão (R$ 385 mil), da cooperativa de crédito Sincred (R$ 203 mil), da loja de material de escritório Kalunga (R$ 140 mil), da estatal paulista Sabesp (R$ 500 mil) e da empresa de alimentos Maratá (R$ 200 mil).

Além disso, recentemente a Uber anunciou que será patrocinadora da competição, sem explicar se via Lei de Incentivo ou com verba conhecida como "de marketing". A Sport Promotion foi a responsável pela captação.

Foi a Uber que anunciou que o torneio terá a presença de Brasil, México, Itália e Canadá. A Fif7 diz que também negocia com a Argentina e que não tem nenhuma seleção fechada. A CBF alega que cabe ao presidente Rogério Caboclo assinar os documentos que assegurariam a participação do time brasileiro. A Fif7 diz que está para enviar esses documentos.

Sangiovanni não vê nada de errado na organização de um torneio de futebol feminino, válido para o ranking da Fifa, por parte de uma organização de futebol society. "Mais ou menos uns três nós mudamos o estatuto da entidade para fazer todo tipo de futebol. Nossa modalidade é jogada como futebol de 5, 6 ou 7. Como tava crescendo o 5 e 6 no mundo, a gente mudou a nomenclatura. A gente também tem a visão para tudo que é futebol. Hoje a gente faz faz beach soccer, 5, 6, 7, varzeano e normal", explica o dirigente, presidente da Confederação Brasileira de Soccer Society. As duas entidades ficam no mesmo endereço no centro de São Paulo.

No seu site, a Fif7 conta que "foi necessária sua  fundação pois muitos países já praticam este esporte" e que houve "inúmeros pedidos de todos os quadrantes do mundo ávidos em conhecer as regras oficiais" do society. Na página, a entidade mostra notícias de alguns poucos eventos realizados, todos no Brasil: Mundialito de Beach Soccer 2016, Mundialito de Soccer Society 2017 e 2016 e Mundialito de Clubes de Soccer Society de 2017. Todos com recursos da Lei Paulista de Incentivo ao Esporte. 

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.