Dinheiro para esporte escolar volta, mas precisa ser melhor aproveitado
Chega ao fim nesta terça-feira o pesadelo vivido pelo setor esportivo ao longo dos últimos dois meses. A Medida Provisória 841 dará lugar a uma nova MP, que não vai mais tirar do esporte recursos que eram (e voltarão a ser) destinados ao esporte escolar, ao esporte universitário, às competições estaduais de nível estudantil e às categorias de base dos clubes sociais. O setor se uniu em torno do tema ao pressionar o governo e conseguiu o dinheiro de volta.
Agora, porém, é preciso ampliar o controle sobre o uso do dinheiro. Para isso, o blog separou um exemplo. Um recente convênio firmado entre o Ministério do Esporte e a prefeitura de Paraguaçu Paulista, cidade do interior de São Paulo. A partir de uma emenda do deputado federal Capitão Augusto (PR), o governo autorizou o repasse de R$ 100 mil para a realização dos Jogos Escolares da cidade.
Por ser uma emenda parlamentar, o ministério tem a obrigação de repassar o recurso. Mas tem o direito (e dever) de exigir que sejam cumpridos os princípios constitucionais de: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Destaque para esse último: eficiência significa fazer mais com menos.
No plano de trabalho aprovado pelo Ministério do Esporte, a prefeitura de Paraguaçu Paulista propôs comprar bolas de futebol, vôlei, basquete masculino, basquete feminino e futsal. Quarenta e cinco de cada. E estipulou as características obrigatórias das bolas "oficiais": peso e circunferências padrão, miolo removível… nada diferente do que se vê por aí.
Como determina a lei, apresentou os orçamentos de três lojas. Vai comprar da mais barata. Topou pagar R$ 255 por uma bola de vôlei "oficial FIVB" da Penalty, por exemplo. É o modelo de altíssimo padrão, usado apenas em competições oficiais adultas, o mais caro do catálogo. O torneio é entre escolas de ensino fundamental, para adolescentes até 15 anos, mirins. A própria Penalty faz a bola utilizada em campeonatos nacionais da categoria. Custa R$ 179. Uma bola comum, também da Penalty, dessas disponíveis em clubes e escolas, sai por menos de R$ 90.
O vôlei é só um exemplo. O Ministério do Esporte aceitou que a prefeitura pague R$ 225 em uma "bola oficial CBFS" da Penalty, ainda que a marca venda bolas com selo de oficial da CBFS a partir de R$ 130, e de um padrão mais baixo, ideal para crianças e adolescentes, por R$ 80. Novamente, será comprada a mais cara do catálogo. Nenhuma das três concorrentes ofereceu vender do modelo mais barato, que também se encaixa nos critérios exigidos pela prefeitura. Teria ganhado a concorrência.
No total, o Ministério do Esporte vai pagar mais de R$ 60 mil para comprar 225 bolas, sempre do modelo de mais alto padrão da Penalty, destinada exclusivamente ao esporte de alto-rendimento. Pelo mesmo valor, da mesma marca, poderia comprar não 30, mas até 90 de cada bola. Fosse esse blogueiro a fazer as compras, os R$ 60 mil dariam para comprar mais de 700 bolas.
Não se trata, aqui, de uma denúncia de superfaturamento – caso as bolas entregues venham a ser mesmo as de valor mais alto do catálogo. Mas é obrigação do Ministério do Esporte presar pela eficiência. Preocupar-se em, com o mesmo dinheiro, comprar não 225, mas 500 bolas, 600, 700, 800. Para que mais crianças e adolescentes tenham acesso ao material, ainda assim de qualidade.
Tudo isso, porém, é reflexo de uma falta de política pública esportiva que determine, por exemplo, que mais importante que ter uma bola "oficial" em um campeonato escolar, seja que haja mais bolas para mais gente praticar esporte e chegar ao torneio. Não é dos Jogos Estudantis de Paraguaçu Paulista que vai sair o próximo convocado para a seleção brasileira de vôlei – talvez um jovem saia de lá para um clube pequeno, depois para um grande, depois para a seleção. Será nos próximos passos desse caminho que ele vai encontrar a melhor bola.
Nos últimos meses, o Ministério do Esporte ampliou o controle sobre recursos repassados ao COB e, consequentemente, às confederações. De fato, o governo tem sido muito rígido com critérios quando lida com o alto-rendimento. Mas muito pouco adianta fiscalizar só um setor e continuar repassando recursos sem critérios a prefeituras e governos estaduais. É preciso fazer bom uso dos recursos, até para ter serviço a mostrar quando tentarem de novo tomar o dinheiro do esporte.
Outro lado
O blog procurou o Ministério do Esporte, que disse que todos os valores apresentados pela Prefeitura de Paraguaçu Paulistestão respaldados em orçamentos emitidos por empresas do Estado de São Paulo, devidamente inscritas na Receita Federal do Ministério da Fazenda.
"A análise dos custos realizada pela equipe técnica do ministério seguiu as determinações da Instrução Normativa nº 3/2017 e da orientação "Convênios e outros repasses – 6ª edição", do Tribunal de Contas da União (TCU), que têm como parâmetro a pesquisa com os fornecedores, mediante a apresentação de três orçamentos para cada despesa.
Para assegurar o cumprimento dos procedimentos análogos aos estipulados na Lei nº 8.666/93, a pasta também realizou uma quarta cotação orçamentária. O procedimento comprovou, à época, os preços orçados, de modo que se averiguou a adequação da proposta apresentada, em consonância com os valores praticados no mercado", informou a pasta, lembrando que a liberação de recursos ocorrerá somente após a realização do processo licitatório.
Procurada, a prefeitura de Paraguaçu disse que solicitou cotação de "materiais de primeira qualidade" e que coube às empresas apresentarem orçamentos com marcas e preços. O blog pediu um detalhamento, mas há 18 dias não obtém respostas.
(Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL)
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