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Olhar Olímpico

Tifanny projeta jogar Pan e Olimpíada e se coloca à disposição para testes

Demétrio Vecchioli

04/06/2018 15h35

Não fosse um veto da Federação Internacional de Vôlei (FIVB), Tifanny poderia estar defendendo a seleção brasileira feminina na Liga das Nações. No mesmo dia em que o técnico José Roberto Guimarães divulgou sua convocação, a FIVB anunciou que decidiu fazer, em suas palavras, um "exame minucioso para garantir o equilíbrio competitivo de todos os atletas", barrando especificamente a possibilidade de convocação de Tifanny. Em entrevista exclusiva ao Olhar Olímpico, entretanto, a jogadora do Sesi/Vôlei Bauru revelou que até agora não foi convidada a se submeter a nenhum exame, ainda que tenha se colocado à disposição, e sonha em estar na seleção no Pan de Lima (Peru), no ano que vem, e na Olimpíada de Tóquio (Japão), em 2020.

"Acho que para essa temporada ainda não poderei se convocada. Mas talvez nas próximas, que são regidas pela regra do COI (Comitê Olímpico Internacional). A Federação Internacional (de Vôlei, FIVB) não pode mexer. Se eu receber convocação para jogar para o Pan, é regra normal. Para a Olimpíada também, vale a regra do COI", aponta Tifanny.

As regras sobre elegibilidade no esporte são cheias de nuances. A regra que vale para a Superliga Feminina não é a mesma que vale para as competições da FIVB, que também não é a mesma da Odepa, organizadora dos Jogos Pan-Americanos, ou do COI. O documento que define os atletas elegíveis para Tóquio-2020 especifica que poderão jogar a Olimpíada os atletas que se encaixarem no que rege a Carta Olímpica, a Regra 41 (sobre nacionalidades) e a Regra 43 (código mundial antidoping). Nenhuma delas impede Tifanny de defender a seleção brasileira.

Leia também: Prós e contras: entenda o que está em discussão no caso Tifanny

Pensando nas competições internacionais desta temporada, quando a Confederação Brasileira de Vôlei (CBV) divulgou a lista do técnico Zé Roberto, deixou claro que Tifanny estava de fora não por opção do treinador, mas por conta de uma determinação da FIVB. Isso foi em 13 de abril, data em que a federação internacional prometeu criar um grupo de trabalho encarregado especificamente de pesquisar e consultar o COI, outros órgãos esportivos e os principais especialistas em ética médica. Ao mesmo tempo, informou que não faria novos comentários.

Nesta segunda-feira, ao Olhar Olímpico, Tifanny revelou que até agora não foi chamada, mas que está à disposição dos médicos. "Ainda não entraram em contato, mas tenho recebido mensagens de uma médica do COI, que é responsável pelas pesquisas, e vai saber a forma como vai agir. Eu estou totalmente de acordo se eles quiserem fazer um teste só comigo, para saber se estou acima de alguém. Estou abrindo as portas para outras meninas. É preciso que eles vejam em mim a realidade de outras", comentou.

A médica que está em contato direto com Tifanny é a norte-americana Joanna Harper, também ela uma mulher trans, professora no Providence Portland Medical Center, nos Estados Unidos, e membro da comissão COI que decidiu, em 2015, autorizar atletas trans no esporte com algumas condições. Em um estudo, Harper concluiu que corredoras trans amadoras não apresentaram ganho de performance na comparação com atletas cis. Mas, ao mesmo tempo, admitiu que em esportes como vôlei e basquete, a altura e a força podem ter influência expressiva.

Tifanny não nega que seja uma atleta forte, mas diz que o cansaço o tratamento hormonal pelo qual passou, que reduziu drasticamente a testosterona de seu corpo, para níveis permitidos pelo COI, afeta seu desempenho.

"(Se eu fosse falar com os médicos do COI), colocaria a verdade, o que eu sinto, o cansaço, a força que eu perdi. A Dificuldade que sinto de jogar no feminino, não tenho mais a mesmo força. Não tenho mais nada do passado. Tenho menos que elas, sofro mais que elas. Ao mesmo tempo que eu cresço, eu caio. Se for pegar força e altura, mais de 20 jogadoras estrangerias são mais fortes que eu", argumenta.

Na próxima temporada, o cansaço tende a diminuir. É que o Vôlei Bauru, time que Tifanny defendeu na Superliga passada, agora se fundiu ao Sesi, e recebeu reforços de peso. Entre eles, a italiana Valentina Diouf, que joga como oposta. A tendência inclusive é que Tifanny volte à sua posição original, passando a atuar na ponta. A central Thaisa também pode chegar, o que aumentaria a distribuição de bolas no jogo.

"Não vai ter aquela coisa de que eu recebia 70 bolas por jogo. Com uma equipe mais homogênea, fica mais distribuído o jogo, meu cansaço não vai ser mais tão forte. Eu ficava dois dias com câimbra, o corpo não aguentava. Para mim o descanso era dois dias a mais que as meninas. O corpo não acompanha. Agora vai melhorar", projeta, colocando-se, desde já, à disposição da seleção nas duas funções. "Continuo fazendo meu bom trabalho e vou esperar a hora correta. Se estiver liberada e eu for chamada, seja como ponta ou oposta, vou ficar muito feliz."

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.