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Olhar Olímpico

Conselho Tutelar sabia que Fernando atuava como técnico e demorou para agir

Demétrio Vecchioli

25/05/2018 04h00

No dia 24 de abril, a mãe de um garoto que treinava na equipe de ginástica artística do Mesc, em São Bernardo do Campo (SP), procurou o Conselho Tutelar da cidade para fazer uma denúncia. Fernando de Carvalho Lopes, afastado do cargo de treinador do time em junho de 2016, depois de iniciada investigação de abuso sexual, estava novamente trabalhando diariamente com as crianças, como treinador. O órgão de proteção à criança e o adolescente, porém, só foi tomar atitudes depois da exibição de reportagem no Fantástico e após o próprio Mesc anunciar o afastamento de Fernando do clube.

O treinador trabalhava há 20 anos no Mesc (Movimento de Expansão Social Católica), ainda que desde 2007 o popular clube de campo de São Bernardo não fosse mais, diante da prefeitura, o responsável por manter financeiramente a equipe de ginástica artística treinada por Fernando. Em meados de 2016, quando dois ginastas procuraram o Ministério Público para denunciar supostos abusos, o Mesc o afastou.

Inicialmente o afastamento foi completo, com Fernando deixando de frequentar a sede do clube. Depois, ele voltou ao Mesc, mas para trabalhar na área administrativa. No dia seguinte à reportagem do Fantástico que revelou que 40 ginastas também tinham queixas de abuso sexual, o Mesc foi pressionado por associados e pela opinião pública e decidiu novamente afastar o funcionário. À época, em 30 de abril, informou que Fernando vinha trabalhando na área administrativa, sem contato com os ginastas.

Mas não era bem assim. Cinco dias antes da reportagem do Fantástico, a mãe de um ginasta procurou o Conselho Tutelar de São Bernardo para denunciar que, apesar da investigação no MP e na Polícia Civil, Fernando continuava trabalhando diretamente com os ginastas no ginásio. Dias depois, a Rede Globo exibiria um vídeo comprovando isso.

O Conselho Tutelar, porém, só agiu nove dias depois, em 3 de maio, quando sugeriu ao Ministério Público o afastamento do Fernando de qualquer atividade que envolvesse crianças e adolescentes. "E se fosse um caso de vida ou morte? A criança morreria se dependesse deles…", criticou a mãe, que não quer se identificar – a identidade do filho dela, uma das supostas vítimas, também vem sendo mantida em sigilo.

Em nota enviada ao Olhar Olímpico, o Conselho Tutelar disse que, após receber a denúncia, levou a matéria para discussão em assembleia. "Considerando a gravidade da denúncia o colegiado decidiu por unanimidade em sugerir ao Ministério Público que o acusado fosse afastado de qualquer atividade que lhe possibilitasse contato com crianças ou adolescentes até que o processo de investigação fosse finalizado", explicou o órgão, sem detalhar por que precisou de nove dias para fazer tal recomendação.

O blog também questionou o Mesc a respeito da denúncia, mas o clube disse que não ia comentá-la. O Mesc também não respondeu o Olhar Olímpico sobre se o afastamento de Fernando, anunciado em 30 de abril, envolve o total desligamento do profissional.

Desde que as denúncias vieram à tona, o Mesc tem evitado falar com a imprensa. Das poucas informações passadas, informou que nunca firmou convênio com a prefeitura de São Bernardo, o que é desmentido por leis municipais e mecanismos de transparência. Confrontado, o Mesc não respondeu.

O advogado de defesa de Fernando, Luiz Ricardo Davanzo, também tem evitado a imprensa. Ele falou com a reportagem do UOL Esporte apenas uma vez, na manhã seguinte à reportagem do Fantástico, e depois nunca mais atendeu ligações ou respondeu a mensagens de texto. Em depoimento no Senado, Fernando negou todas as acusações contra ele.

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.