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Olhar Olímpico

Confederação de Handebol tem até hoje para devolver R$ 9,6 mi ao governo

Demétrio Vecchioli

19/04/2018 04h00

Manoel, de cabelos brancos, presidente afastado da CBHb, e ao seu lado Ricardo Souza, vice, agora presidente em exercício

De todos os golpes sofridos pela Confederação Brasileira de Handebol (CBHb) nos últimos dias, o mais duro deles vinha sendo mantido em sigilo. A entidade tem até esta quinta-feira para devolver R$ 9,6 milhões (R$ 9.648.465,46 exatamente para o Ministério do Esporte, sob pena de ser inscrita como inadimplente no governo. Isso impossibilitaria a entidade de firmar novos convênios e, mais adiante, inclusive de receber verbas descentralizadas da Lei Agnelo/Piva pelo COB.

A decisão apaga o pouco de luz que restava no fim do túnel da confederação, tudo por causa da realização de um Mundial Feminino de Handebol no país, em 2011. A confederação pegou dinheiro com o Ministério do Esporte e usou de forma irregular, pelo que agora atestaram os técnicos do governo. Também pediu dinheiro emprestado à Federação Internacional de Handebol (IHF, a quem continua devendo). A má gestão dos recursos públicos fez o presidente Manoel Oliveira ser afastado pela Justiça e incentivou o Banco do Brasil, patrocinador master, a avisar que não vai renovar o acordo, que vence no fim do mês que vem. Os Correios também já haviam reduzido drasticamente o apoio dado.

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No caso do Ministério do Esporte, foram necessários seis anos e meio até que a pasta analisasse detalhadamente a prestação de contas do convênio firmado para realizar o Mundial. Antes disso, a Controladoria Geral da União (CGU) já havia feito o mesmo e listado um sem número de irregularidades. Uma vez que os documentos eram públicos, eles também já haviam sido denunciados na imprensa e motivado a ação popular – interposta por federações da oposição – que culminou com o afastamento de Manoel. Na quarta-feira, Manoel finalmente deixou o cargo e Ricardo Souza, seu aliado, eleito como vice-presidente, assumiu o comando da entidade.

Alagoano e muito próximo do sergipano Manoel (os dois estados são vizinhos), Ricardo terá que lidar com os questionamentos do Ministério do Esporte, que enfim reconheceu as falhas no mal-fadado convênio para a realização do Mundial. A começar pela chamada pública que permitiu o contrato: o resultado dela saiu dia 28 de novembro de 2011, o convênio foi assinado em 2 de dezembro e começou a valer no dia seguinte. Mas o Mundial já iniciara no dia 2.

"Não há dúvidas de que a organização de um evento de tal magnitude precisa ser providenciada com antecedência. Assim, resta evidente que isso ocorreu antes da assinatura do convênio. Cumpre ressaltar que a partida inicial do campeonato ocorreu no dia 2, antes da realização das cotações. Entendemos, portanto, que toda a estrutura já estava montada e funcionando, uma vez que o relatório de cumprimento do objeto, enviado pela convenente, e o parecer técnico sobre a execução, emitido pela área técnica do ME, não indicam o contrário", explica a divisão de Análise Financeira do ME.

A CBHb alega que não havia como fazer diferente, uma vez que a homologação do convênio só poderia acontecer a partir do dia 2. Mas o ministério retruca: "Ao decidir participar da seleção, a Convenente estava ciente das regras e concordou em cumpri-las".

Acusada pela CGU de simular licitações, durante todo o processo, a confederação alegou que realizou contratações sem cotações por conta dessa falta de tempo, mas, para o ministério, o processo contrariou os princípios constitucionais da "legalidade, impessoalidade, moralidade, eficiência e publicidade". O ministério, porém, lembra que o problema não é só esse.

Em relatório ao qual o Olhar Olímpico obteve acesso, as falhas são detalhadas. Vale citar alguma delas, como a contratação de geradores de emergência, feita em um pregão às 6h do dia 3, em Aracaju. Manoel Oliveira assina o documento, mas ele estava em São Paulo. No caso da contratação de transporte, o relatório do Ministério do Esporte aponta ter havido superfaturamento em todos os itens.

Em 29 de dezembro do ano passado, Maria Eunice Maués, coordenadora-geral de prestação de contas do Ministério do Esporte, assinou o documento que determinou a devolução de R$ 5,5 milhões (dos R$ 6 milhões do convênio), que atualizados chegavam a quase R$ 9 milhões. Além disso, cobrou que a confederação apresentasse documentos que justificassem a escolha de pessoas contratadas para realizar serviços, assim como documentos que comprovassem o pagamento. Como isso não ocorreu, ficou determinada a glosa total do convênio.

A reportagem do Olhar Olímpico falou rapidamente com Ricardo Souza, o Ricardinho, novo presidente da CBHb, por Whatsapp, na quarta-feira à noite. Ele confirmou que é o novo presidente da entidade, ressaltando que "em exercício" e disse que o departamento jurídico está tomando as providências quanto ao convênio.

 

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.