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Olhar Olímpico

Temer dobra verba para legado olímpico, mas Bolsa Atleta continua sob risco

Demétrio Vecchioli

14/11/2017 04h00

(Marcelo Camargo/Agência Brasil)

A articulação política do ministro Leonardo Picciani (PMDB) nas semanas que antecederam a votação a votação da denúncia contra o presidente Michel Temer (PMDB) na Câmara dos Deputados parecem ter rendido frutos para o esporte. A nova versão da Lei Orçamentária Anual (LOA) enviada por Temer ao Congresso reduziu o impacto dos cortes no orçamento total do Ministério do Esporte, na comparação com a proposta inicial. Ainda assim, porém, programas fundamentais como o Bolsa Atleta continuam correndo risco e a maior parte deles terá que funcionar com menos da metade da verba de 2017.

Em setembro, o Olhar Olímpico revelou que o orçamento para 2018 cortava em 87% os recursos para programas do Ministério do Esporte, sem considerar os gastos administrativos, na comparação com o LOA de 2017. Na nova versão do orçamento, enviada ao Congresso depois que a Câmara arquivou a segunda denúncia contra o presidente da República, Temer propõe um aumento considerável no orçamento total do Esporte, de R$ 490 milhões para R$ 805 milhões. É um valor mais próximo dos R$ 972 milhões previstos no LOA de 2017 e que, depois de passar pela Câmara, recebeu emendas impositivas até chegar a R$ 1,4 bilhões.

Chama atenção o fato de o Ministério do Planejamento, responsável pela formulação do LOA, ter mais do que dobrado os recursos destinados à Autoridade de Governança do Legado Olímpico (AGLO), autarquia que funciona dentro de poucas salas no Velódromo Olímpico do Rio e tem como única responsabilidade cuidar de duas arenas, o próprio velódromo e o Centro Olímpico de Tênis, todos no Parque Olímpico da Barra.

Se a primeira versão previa R$ 81 milhões (sendo R$ 24 milhões para administração e R$ 56 milhões em custos), a versão final disponibiliza um total de R$ 174 milhões. O custo fixo se mantém, mas serão R$ 150 milhões para "esporte, cidadania e desenvolvimento". A autarquia, vale lembrar, não promove atividades esportivas e cobra aluguel dos espaços que administra.

O mesmo tratamento recebido pela AGLO não teve o programa Bolsa Atleta, que sempre foi a menina dos olhos do Ministério do Esporte e que, a grosso modo, mantém o esporte brasileiro de alto rendimento funcionando. O orçamento de 2018 passou de R$ 70 milhões para R$ 82 milhões, o que continua passando longe de ser suficiente para mantê-lo em pé nos moldes que ele é hoje. Vale lembrar que a Câmara ainda pode apresentar emendas que abasteçam o programa.

Este ano, só os atletas beneficiados entre maio e junho pelo Bolsa Pódio deverão consumir R$ 31,5 milhões em 12 meses. O governo ainda não divulgou os beneficiários do primeiro edital do Bolsa Atleta de 2017, mas, no ano passado, os mais de 6 mil beneficiados custaram mais de R$ 90 milhões ao governo. Para este ano, as regras são exatamente as mesmas e o número de beneficiados deve inclusive subir, porque há cinco novas modalidades no programa olímpico. Como essas regras são definidas a partir de uma legislação específica, que determina quem tem e quem não tem direito ao benefício, ela precisará ser revista reduzindo o valor das bolsas ou barrando o acesso a elas por parte dos esportistas que hoje têm direito a ela.

Aumento – A rubrica do Bolsa Atleta foi a que teve menor aumento na comparação com a primeira versão do orçamento. Outros programas do Ministério do Esporte viram a situação melhorar para 2018, ainda que o cenário seja de menos recursos disponíveis do que em 2017.

O combate ao doping, por exemplo, vem tendo dificuldades de se manter em pé com os R$ 8,7 milhões disponíveis para esse ano e viu o orçamento de 2018 passar de R$ 2,7 milhões para R$ 4 milhões. Ainda assim, menos do que a metade na comparação com 2017.

A rubrica "preparação de atletas e capacitação de recursos humanos para o esporte de alto rendimento", de onde saem recursos para convênios com confederações, foi de R$ 56,6 milhões em 2017 para R$ 10,4 milhões na nova LOA de 2018 – eram R$ 7,2 milhões na primeira versão. Em 2016, como comparação, foram autorizados R$ 134 milhões.

Outra rubrica importante para o esporte de alto rendimento do Brasil, a que trata da "preparação de seleções principais para representação do Brasil em competições internacionais", que foi de R$ 40 milhões em 2017 (ainda que muito pouco disso tenha sido aplicado) e será de apenas R$ 7,0 milhões em 2018, se o projeto de lei não sofrer alterações no Congresso.

Se no orçamento de 2017 havia R$ 60 milhões para "implantação de infraestrutura esportiva de alto rendimento", em 2018 a previsão agora é de R$ 20 milhões, contra apenas R$ 13 milhões na primeira versão da LOA. Para manter a aclamada "Rede Nacional de Treinamento" serão só R$ 30 milhões no ano que vem, contra R$ 100 milhões este ano e R$ 20 milhões da primeira versão.

Mas o grosso no corte de orçamento está na rubrica "implantação e modernização de infraestrutura para esporte educacional, recreativo e de lazer", utilizada, principalmente, para pequenas obras em equipamentos públicos espalhados por todo o país. Depois de disponibilizar R$ 462 milhões em 2017, o governo pretende liberar só R$ 65 milhões em 2018. Ainda assim é um aumento grande na comparação com a primeira verão do LOA 2018, que previa meros R$ 7 milhões.

Se na primeira versão não havia qualquer referência à "implantação dos Centros de Iniciação ao Esporte", que mereceram R$ 200 milhões no orçamento deste ano, agora o ministério terá R$ 50 milhões disponíveis para o programa.

No total, o orçamento para o Esporte, que foi de R$ 1,245 bilhões na LOA de 2017, excluindo pessoal, transferências obrigatórias por legislação e créditos extraordinários, foi reduzido para R$ 220 milhões no primeiro projeto enviado por Temer à Câmara. Agora, mantendo a mesma conta, serão disponibilizados R$ 486 milhões.  Um corte de mais de 60%.

Em breve nota, o Ministério do Esporte disse que trabalha para manter o mesmo nível orçamentário de 2017 e que "as negociações têm avançado nesse sentido". Além disso, informou que não há previsão de cortes no programa Bolsa Atleta. Quanto à AGLO, afirmou que a autarquia tem autonomia administrativa e financeira para aplicação dos recursos previstos no orçamento.

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.