Gestão Doria zera verba da Virada Esportiva e banca eventos de vereadores
Principal evento esportivo organizado pela Prefeitura de São Paulo, programado para o próximo fim de semana, a Virada Esportiva deste ano viu todo o seu orçamento, de R$ 3 milhões, ser completamente cortado porque a gestão de João Doria (PSDB) não tem certeza se terá verbas para manter a Secretaria Municipal de Esportes e Lazer (SEME) até o fim do ano.
Depois disso, porém, a mesma secretaria liberou mais de R$ 3 milhões para realizar eventos solicitados por vereadores a partir de emendas. Quase todos de artes marciais. Nenhum deles ligado a uma confederação ou federação esportiva reconhecida pelo Comitê Olímpico do Brasil (COB).
Em 18 de julho a prefeitura lançou um chamamento público para "seleção para propostas de realização da Virada Esportiva". Naquele documento constava que "o teto de recursos disponibilizados para execução da Virada Esportiva, mediante celebração de parcerias, seria de R$ 3 milhões".
Menos de um mês depois, em 11 de agosto, a SEME cancelou o chamamento. A razão foi explicitada em despacho publicado em Diário Oficial: "Ante a possibilidade de haver insuficiência de recursos para manutenção integral de serviços essenciais da pasta (a SEME) até o final de 2017 (…) sendo necessário destinar os recursos que seriam utilizados para o custeio dos projetos objeto do presente chamamento para assegurar o pleno funcionamento da pasta".
A SEME contava com um orçamento de R$ 227 milhões para 2017, valor aprovado pela Câmara Municipal no ano passado, mas viu R$ 37 milhões serem congelados pela administração municipal.
Após cortar a verba da Virada Esportiva, porém, a secretaria iniciou um movimento de liberação de emendas de vereadores. Os valores somados já superam os R$ 3 milhões "economizados" com a Virada Esportiva e alguns desses eventos estão marcados para acontecer exatamente durante a Virada Esportiva, no próximo fim de semana.
Sabe sobre esses convênios? Entre em contato com o blog
É o caso da "5ª Copa Revelando Talentos", competição que não deixa claro de qual modalidade e que será realizada pela "genérica" Federação Paulista de Artes Marciais Interestilos no Clube Escola José de Anchieta, na Zona Leste, custando R$ 164 mil ao município. O evento, marcado para o próximo domingo, é um dos tantos solicitados pelo vereador Celso Jatene (PR), secretário municipal de Esportes na gestão Fernando Haddad (PT).
São pelo menos 20 eventos, todos eles publicados em Diário Oficial a partir de 10 de agosto – ou seja, desde o cancelamento dos R$ 3 milhões destinados à Virada Esportiva. É o caso do Muay Thai Classic GP – 1ª Edição, que promete 14 lutas no Clube Esportivo da Mooca no próximo sábado. O evento vai custar R$ 174 mil para a prefeitura e beneficia a também genérica Federação Paulista de Lutas e Artes Marciais.
Entre emendas dos vereadores Souza Santos (PRB) e Conte Lopes (PP), a desconhecida FEPLAM vai receber mais de R$ 450 mil para realizar três eventos nos próximos finais de semana. Ela também será responsável pelo Showdown Muay Thai Pro 2017 e pelo Arena Brazil X. Já o Instituto Mais Esporte vai promover o Top Thai Brasil VI e o Amazing Fight Brazil 2017, com mais de R$ 350 mil destinados pelos mesmos vereadores. O presidente da FEPLAM, Fernando Ameneiro Couto, é também quem assina, como presidente, o estatuto do Instituto Mais Esporte, comandado pela irmã dele, Maria José Ameneiro Couto.
Não-olímpicos – A destinação de verbas da SEME para o mesmo grupo restrito de entidades promotoras de eventos de artes-marciais, sempre a partir de emendas de um grupo de vereadores, não é exclusividade da gestão Doria. Os mesmos organizadores, usando essas entidades não reconhecidas pelo COB ou pelo CPB, já dominavam os convênios com Gilberto Kassab (PSD) e Haddad.
Entre os eventos autorizados por Doria estão o 3º Circuito Brasileiro de Tampadaki, realizado pela Confederação Brasileira de Scientific Hapkido System, e o Projeto 19º Kung-Fu Fight 2017, proposto pela Liga Nacional
Garra de Águia Kuoshu Wushu Kung-Fu Tradicional. Cada um deles custando mais de R$ 130 mil.
Dentre os 26 eventos publicados em Diário Oficial, quase todos custando entre R$ 150 mil e R$ 200 mil, o Olhar Olímpico só encontrou cinco de modalidades olímpicas. São dois torneios de futebol de várzea, um evento de skate, promovido pela Federação Paulista, e dois de taekwondo. Um, da Liga Nacional de Taekwondo. Outro, da Federação Paulista de Taekwondo Olímpico. Nenhuma das duas entidades é reconhecida pelo COB, uma vez que a gestão da modalidade no país é da Confederação Brasileira de Taekwondo.
Questionada sobre o problema, a SEME disse que "os convênios de artes marciais foram firmados ainda na gestão anterior", o que não é verdade. Todos os contratos foram firmados em 2017, após serem aprovados nos últimos dois meses pela Comissão de Seleção Ordinária, ligada à secretaria.
A SEME ainda lembrou que realizou convênios com o Instituto Cesar Cielo, o Instituto Peninsula (NAR) e a Confederação Brasileira de Rugby, deixando de ressaltar que em nenhum dos casos houve transferência de recursos – no caso do Instituto Cesar Cielo, por exemplo, a prefeitura há anos, desde a gestão Haddad, autoriza o uso da piscina do Centro Olímpico para que a criançada atendida pelo projeto treine.
Sobre a liberação de um pacote de 26 emendas parlamentares em menos de um mês, depois de um ano inteiro sem realizar eventos, a SEME disse que "as emendas parlamentares são positivas e salutares para as secretarias, uma vez que possibilitam a ampliação do oferecimento de atividades e de manutenção da estrutura de seus equipamentos", explicou que "cabe ao parlamentar encaminhar a cada secretaria as emendas que julgar importantes" e que "neste ano, excepcionalmente, esse processo teve início apenas no segundo semestre".
Virada Esportiva – Apesar do corte de todo o orçamento destinado a ela, a Virada Esportiva vai acontecer. A programação, que vem sendo atualizada pela SEME, tem eventos principalmente dentro de equipamentos públicos como os CEU's e os Centros Esportivos. A grande maioria dos mais de mil eventos agendados são "atividades livres" nestes equipamentos – ou seja, espaços/quadras/campos liberadas para quem quiser jogar/dançar/lutar.
A gestão Doria diz que esta será "a maior Virada Esportiva já feita, com 1.136 atrações", ainda que, em 2015, a programação tenha tido mais de 2.000 atrações. A SEME afirma ainda que "isso nos mostra que é possível estabelecer um novo modelo de gestão mais sustentável para este tipo de evento, priorizando parcerias e otimizando a utilização de recursos públicos".
Na planilha disponível no site da SEME, os poucos eventos detalhados são quase todos ligados ao SESC, que está organizado um amplo calendário de atividades em todo o país durante a Semana Move Brasil. Em São Paulo, esses eventos incluem clínicas com diversos ex-atletas olímpicos, como Fernando Meligeni e Hugo Hoyama.
Dos poucos eventos patrocinados na Virada, destaque para o Passeio Ciclístico do Carrefour, no centro de São Paulo (bancado com recursos da Lei de Incentivo ao Esporte, federal), a Arena Adidas, no Largo da Batata, e a 25ª edição da Maratona de Revezamento Pão de Açúcar. Entre as poucas novidades, a Virada Oriental, na Liberdade, com modalidades originárias da Ásia.
Outro lado – Após a publicação da reportagem, o secretário Jorge Damião, da SEME, entrou em contato com o blog para esclarecer algumas questões. Segundo ele, o dinheiro que deixou de ser investido na Virada Cultural foi aplicado na renovação de convênios para manter os 'Clube Escola', em diversos centros esportivos da cidade. Sem a verba, o projeto, criado por ele mesmo em 2005, quando era adjunto na gestão José Serra (PSDB), teria que ser interrompido em outubro.
Com relação à Virada Esportiva, ele ressaltou que a SEME tem como meta o aumento da atividade esportiva na cidade. "Eu vejo o esporte como ferramenta, estou preocupado com uma política de esporte. Criamos um projeto chamado São Paulo Cidade Ativa, para aumentar o número de atividades físicas da população paulistana. Hoje, apenas 30% dos alunos da escola pública praticam esporte. Os números são alarmantes. A falta de política de prevenção obriga a cidade a gastar R$ 25 milhões por ano com remédios para hipertensão e R$ 47 milhões para diabetes. Pesquisas mostram que 87% dos que morreram de diabetes poderiam estar vivos se praticassem esporte regularmente", argumenta.
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