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Olhar Olímpico

Com redistribuição de medalhas e Rússia banida, doping segue no centro do Mundial

Demétrio Vecchioli

06/08/2017 15h04

Foto: AP Photo/Matt Dunham

Todos os dias, antes da sessão noturna do Mundial de Atletismo começar no Estádio Olímpico de Londres, pelo menos duas cerimônias de medalhas são realizadas de forma até constrangedora. São atletas voltando ao pódio para receber premiações que deveriam ter ganhado em edições passadas, quando foram superados por competidores que depois foram suspensos por doping. Só neste domingo, três atletas foram "promovidos" por resultados cassados no Mundial de Daegu, em 2011.

As cerimônias, que neste fim de tarde tornaram a grávida britânica Jessica Ennis-Hill campeã mundial do heptatlo de seis anos atrás, depois da desclassificação da russa Tatyana Chernova por doping, são muito mais motivo de vergonha para o atletismo do que de festa. Afinal, a cada vez que um atleta sobe no pódio para ganhar uma medalha, vem à toa a lembrança de que ninguém sabe se, daqui a alguns anos, os resultados que estão sendo obtidos no Mundial de 2017 também serão revistos.

O doping continua no centro do atletismo, apesar da ausência de uma delegação da Rússia, que está suspensa pela federação internacional, a IAAF, desde o final de 2015. É que os russos estão presentes no Mundial com uma delegação de 19 atletas, que compõem a "ANA" (Atletas Neutros Autorizados). Por enquanto, nenhum deles subiu ao pódio, mas dificilmente isso continuará assim até domingo que vem, quando o Mundial chegará ao fim.

No salto em distância, por exemplo, Aleksandr Menkov, campeão mundial de 2013, foi quarto colocado. E ninguém pode apontar o dedo contra ele, que nunca foi pego em exame antidoping, sem citar o exaltado sul-africano Luvo Manyonga. O novo campeão mundial caiu no doping em 2012 e recebeu uma suspensão branda, de apenas 18 anos, com o tribunal de seu país alegando que, por ser pobre, ele desconhecia as regras antidoping.

Como o caso é desconhecido do grande público, Manyonga não teve a mesma recepção de outro campeão mundial do domingo, o norte-americano Justin Gatlin, diversas vezes vaiado pelo público, mesmo quando bateu Usain Bolt na final dos 100m. Ninguém se esquece que ele teve duas punições por doping e, pela segunda, em 2006, deveria ter sido banido do esporte para sempre. Levou oito anos de suspensão, cumpriu quatro, e voltou para ser o homem mais rápido do mundo aos 35 anos.

Mesmo o ídolo britânico Mo Farah, tricampeão dos 10.000m, já teve seu nome ligado a suspeita de doping mais de uma vez, especialmente pelo fato de seu técnico estar sendo investigado nos Estados Unidos. A desconfiança, claro, é assunto quase proibido em Londres.

Na entrevista coletiva após a prova dos 100m, no domingo, uma repórter brasileira questionou Bolt e Gatlin se o fato de os resultados do Mundial serem os mais lentos em quase 15 anos pode indicar uma preocupação com doping. Era uma avaliação que muita gente fazia, mas os dois foram bastante duros na resposta, indicando muito incômodo com a desconfiança.

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.