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Olhar Olímpico

Empresário de crossfit, brasileiro medalhista já foi garçom e salvou vidas no mar

Demétrio Vecchioli

26/07/2017 15h23

Foto: Satiro Sodré/SSPress/CBDA

João Luiz Gomes Jr entrou para a lista dos grandes nomes da natação brasileira ao conquistar, nesta quarta-feira, a medalha de prata nos 50m peito no Mundial de Budapeste, na Hungria. Antes de começar a se destacar entre os melhores do país no estilo, porém, o atleta natural de Vitória, no Espírito Santo, usou a natação para algo ainda mais nobre: salvar vidas na praia em sua cidade natal.

"É muito gratificante você poder servir a alguém. Hoje estou servindo à minha pátria, mas naquela época eu ficava muito feliz de poder cuidar de uma pessoa. É muito gratificante salvar uma vida e depois receber um abraço da família. Já recebi vários presentes de gente que chegava e dizia: 'Você salvou meu filho'. É muito legal, é muito emocionante quando você chega a esse ponto", conta João.

O emprego como guarda-vidas ajudou a pagar os treinos de natação entre os 16 e os 21 anos e foi só uma etapa de uma vida marcada pela capacidade de adaptação. João também já foi garçom, se formou na faculdade em sistemas de informação sonhando trabalhar com computadores, e hoje é dono de uma academia de crossfit. Mesmo no esporte as mudanças foram drásticas: em 2007, aos 21 anos, o capixaba nadou as seletivas para o Pan tanto nos 50m e 100m peito, suas especialidades, quanto nas maratonas aquáticas.

"A gente é adaptável. Acho que não só eu, mas o brasileiro como um todo é adaptável. O que der para mim eu estou fazendo, estou abraçando a ideia, estou me jogando de cabeça. Quem fica sabendo que já competi 10k e hoje nado 50m diz que é uma loucura, mas a gente faz de tudo um pouco."

João não lembra mais sua classificação naquela seletiva para o Pan, disputada na praia de Copacabana. Aposta no 10º lugar, ou algo assim. Naquela época, já acumulava cinco anos como guarda-vidas, com incontáveis vidas salvas, e outras tantas perdidas.

"Na primeira semana de trabalho já acabei tendo que tirar um corpo morto do mar. No começo é difícil, mas depois você esquece. É muita rotatividade no trabalho. Ainda mais num carnaval, virada de ano, que você nem conta mais. Mas consegui salvar mais vidas do que gente que morreu", calcula. "As pessoas vêm depois agradecer, te exaltar. A gente ali acaba pras vítimas virando um Deus, um salvador."

A passagem como garçom, também na praia de Vitória, foi mais pela gana de ganhar mais dinheiro do que por qualquer outra coisa. "Um amigo meu tem uns parentes que têm restaurante em beira de praia. Ele falava que ganhava 450 reais no fim de semana e eu pensava: 'Nossa!' Fui pelo dinheiro, sem pensar o tanto que tinha que trabalhar, mas para poder pagar a natação. Trabalhei como garçom por ganância, para juntar mais dinheiro. Trabalhava como um burro."

A natação de alto rendimento veio tarde, só depois de encerrada a faculdade. João optou por "atrasar" a saída de Vitória para um grande centro para primeiro obter um diploma universitário. "Sempre tive a cabeça no lugar de que amo o que eu faço, a natação, mas preciso ter uma válvula de escape, um plano B. O plano B era ter uma faculdade. Se tudo desse errado, eu teria para onde correr. Graças a Deus deu tudo certo e estou no plano A."

Os primeiros bons resultados apareceram em 2008, quando João ganhou o Open, no fim do ano, e se classificou para o Mundial de Roma, onde seria finalista nos 50m peito. Ali, convenceu o técnico Arilson Soares a aceitá-lo no Pinheiros, onde está até hoje.

Em paralelo à vida de nadador, João ainda é empresário. Junto com um ex-treinador, abriu uma box de crossfit em Vitória. "Ele queria e eu abracei a ideia dele. Passo mais tempo longe, porque moro em São Paulo. Dou mais apoio moral e financeiro mesmo", revela o nadador, que, aos 31 anos, nem pensa em parar. Quinto colocado na Rio-2016 nos 100m peito, quer estar na próxima Olimpíada novamente.

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.