Topo

Olhar Olímpico

Record bloqueia R$ 1 milhão da Confederação de Tênis de Mesa, que pode fechar

Demétrio Vecchioli

23/06/2017 08h07

com Leo Burlá, do UOL Esporte

Uma dívida de 1999 pode fazer a Confederação Brasileira de Tênis de Mesa fechar as portas. A TV Record está cobrando que a CBTM pague duas duplicatas, que juntas somam cerca de R$ 650 mil, referentes à veiculação do "Bingão da Felicidade, o Bingão do Leão", durante os meses de julho e agosto de 1999. Por enquanto, a Record já conseguiu bloquear mais de R$ 1 milhão da CBTM e cobra que a confederação pague outros R$ 4 milhões. Para não precisar fechar as portas, a entidade já procurou socorro no Comitê Olímpico do Brasil (COB) e no Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB).

Mas o que a CBTM tem a ver com o Bingão do Leão? Até a criação da Lei Agnelo/Piva, em 2001, que passou a financiar o COB e as confederações olímpicas com recursos de loterias federais, as confederações aproveitavam que a legislação as autorizava a realizar bingos, terceirizando o serviço.

Em 1999, a CBTM se associou à Carinho Produções, ligada ao apresentador Gilberto Barros, e comprou espaço comercial na Record para o Bingão do Leão, que sorteava cinco carros de luxo por mês, incluindo uma Ferrari. Em setembro daquele ano, a Folha chegou a noticiar que houve suspeita de fraude. Passados 17 anos, porém, no fim do ano passado, a Record decidiu cobrar a dívida.

No último dia 22 de maio, a Record conseguiu decisão favorável na Justiça de São Paulo, que bloqueou todo o dinheiro que estava nas contas da CBTM: R$ 1.036.423,00. A confederação já entrou com uma petição pedindo a liberação do recurso, uma vez que todo o montante seria fruto de verba pública. Este, aliás, é o grande problema da CBTM para pagar a dívida, que pode ultrapassar R$ 5 milhões, levando em consideração juros de 1% ao mês.

Sem um patrocinador privado, a CBTM depende de verbas públicas (convênios e recursos repassados pelo COB e pelo CBP a partir da lei Agnelo/Piva) para existir. Assim, caso não consiga reverter a decisão judicial, não teria como liquidar a dívida. Além disso, os comitês devem parar de repassar verbas, uma vez que tudo que cair nas contas da CBTM pode vir a ser penhorado.

Foi num cenário assim, causado por dívidas da época dos bingos, que a Confederação Brasileira de Vela e Motor (CBVM) pediu intervenção do COB em 2007, dando lugar, em 2013, à Confederação Brasileira de Vela (CBVela), que surgiu com CNPJ e estatuto novo.

Alaor Azevedo

Consecutivamente reeleito presidente da CBTM desde 1995, Alaor Azevedo sequer viajou para o Mundial de Tênis de Mesa, disputado na Alemanha, na tentativa de colocar as coisas nos prumos. À época, a assessoria de imprensa da CBTM disse ao blog que ele tinha questões pessoais a resolver. Na verdade, o problema é da confederação, que em 31 de maio demitiu 11 de seus então 28 funcionários.

Alaor já procurou tanto o COB quanto o CPB para pedir ajuda. De Carlos Arthur Nuzman, de quem é rival político histórico (chegou a entrar na Justiça para impedir mais uma reeleição), ouviu que o COB se compromete a pagar as viagens de pelo menos dois atletas: Hugo Calderano e Bruna Takahashi. Já o CPB pode inclusive ir mais longe e assumir o controle do tênis de mesa paraolímpico, uma das poucas modalidades paraolímpicas que continuam nas mãos de uma confederação e não do CPB.

A CBTM, porém, diz que a cobrança é ilegal. "A gente entende que é totalmente indevida. Ao nosso entender, como se transcorreu um prazo muito grande entre a ultima atitude da Record no processo, está prescrita a ação", afirma Thiago Alves Peixoto, advogado da entidade. Ele ainda alega que uma das duplicatas (de R$ 150 mil) já foi declarada nula e diz que, por isso, a CBTM está cobrando uma reparação de danos da própria Record.

Só que esse não é o único processo que a CBTM responde por causa do tal Bingão do Leão. Em processo que também corre desde 1999, Maria Josefa de Lima cobra que a confederação, a Record e a Carinho Produções paguem a ela a Ferrari F355  que ela alega ter ganhado no sorteio realizado em 22 de agosto de 1999. Josefa já ganhou em primeira e segunda instâncias, em valor equivalente a metade do que custava a F355 em 1999, mas os três réus entraram com recurso no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

"Esse processo não nos preocupa. Demora mais de três anos para um recurso andar no STJ e são três os recursos. Ele ainda vai ser primariamente analisado por um ministro, depois o pleno do STJ. Na prática demora. Depois, mesmo que ela vença, ainda tem uma eventual discussões sobre o valor a ser pago. Além disso, são três réus e o mais óbvio é que ela cobre de quem tem mais posses, que não é a CBTM", argumenta o advogado. O blog também falou com a defesa de Josefa, que afirma que o processo está em fase de liquidação e aposta que logo ela será ressarcida.

Procurada, a Record não se pronunciou. Seus advogados também não quiseram falar com a reportagem. Já a CBTM afirmou que falaria sobre hipóteses e, por isso, não comentou a possibilidade de fechar as portas. A entidade também não quis tecer comentários sobre sua situação financeira.

 

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.