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Olhar Olímpico

Empresa investigada por fraudar antidoping atuou no Rio-2016 a pedido da Wada

Demétrio Vecchioli

22/06/2017 11h00

Pouco mais de dois meses depois de ver chegar ao fim uma suspensão de quase seis meses, a Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem (ABCD) pode novamente ser punida pela Agência Mundial Antidoping (Wada). A própria entidade internacional, porém, pediu ao Comitê Organizador dos Jogos Rio-2016 que contratasse a empresa No Doping, que agora é o alvo de investigação.

Há duas semanas, o polêmico documentário da rede de tevê alemã ARD sobre o doping no Brasil mostrou uma ligação telefônica na qual a representante de uma empresa que faz colheita de amostras antidoping diz que, depois de coletar amostras no evento de um contratante e enviá-los a um laboratório credenciado da Wada, poderia obter os resultados diretamente com a ABCD. Só que pelo que rege os códigos mundial e brasileiro antidoping, a empresa terceirizada de coleta jamais poderia ter acesso aos resultados dos exames.

Reportagem do jornal "Folha de S.Paulo" na semana passada revelou que a empresa que ofereceu o serviço aos produtores do documentário é a No Doping e que a pessoa gravada é Alexandra Nunes, explicando detalhadamente as regras infringidas. Ela é filha de Alexandre Nunes, diretor de operações da ABCD. Foi ele quem abriu a No Doping e a transformou em líder de mercado no Brasil em coleta de exames antidoping. Recentemente, ele passou a empresa para o nome dos filhos para poder assumir uma posição de comando no controle de doping no Brasil.

O áudio mostrado em partes no documentário e citado na reportagem da "Folha" chegou até a Wada. O departamento de inteligência da agência foi acionado e esteve no Brasil por uma semana em meados de maio, inclusive fazendo uma espécie de varredura na sede da ABCD, em Brasília.

A própria Wada, porém, também contou com os serviços de Alexandre Nunes e da No Doping no ano passado. Por recomendação da agência internacional, Alexandre foi um dos chefes do departamento antidoping da Rio-2016, como braço-direito de Eduardo de Rose. E, também a partir de um pedido da Wada, o Comitê Rio-2016 contratou a No Doping como forma de "terceirizar" os serviços de Alexandre.

Questionada sobre a contratação, a Wada disse apenas que, uma vez que essa informação está ligada a uma investigação em curso, ela não pode fazer comentários adicionais. A entidade já havia afirmado que havia recebido o material exibido pela tevê alemã e que o caso está sendo liderado pelo seu departamento de inteligência.

Na semana passada, o presidente da ABCD, Rogério Sampaio, esteve na sede da Wada, em Montreal, no Canadá. O encontro inicialmente foi marcado para que ele apresentasse um balanço do seu primeiro ano de trabalho, mas também serviu para tratar as investigações em curso. Segundo ele, a Wada ficou "muito satisfeita" com o que encontrou na visita do mês passado.

A posição oficial da ABCD, porém, é de que a entidade "cumpre todas as diretrizes da Wada e está em conformidade com os Códigos Brasileiro e Mundial Antidopagem". Já o Ministério do Esporte, a quem a ABCD é ligada, afirmou que "confia na lisura do trabalho técnico desempenhado pela ABCD e aguarda a conclusão do processo de investigação aberto pela Wada, esperando que isso ocorra o mais rápido possível para total esclarecimento". O blog não conseguiu contato telefônico com a No Doping.

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.