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Olhar Olímpico

Acusado de abuso sexual, Fernando de Carvalho Lopes é banido da ginástica

Demétrio Vecchioli

31/03/2019 18h34

O tribunal pleno do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) da Confederação Brasileira de Ginástica (CBG) reviu a polêmica decisão de primeira instância e condenou o técnico Fernando de Carvalho Lopes ao banimento do esporte. O julgamento ocorreu neste domingo (31), em Aracaju (SE), onde a confederação realizou, mais cedo, sua assembleia anual. Na esfera criminal, o caso segue sendo investigado, há dois anos e meio, pelo Ministério Público de São Paulo e pela Delegacia de Defesa da Mulher de São Bernardo do Campo (SP). Ele ainda não foi denunciado à Justiça.

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Em primeira instância no STJD da ginástica, em novembro do ano passado, Fernando havia sido condenado a quase 1.500 dias de suspensão, além de multa de R$ 300 mil. A punição foi considerada branda pelos representantes das supostas vítimas, da CSMV Advogados, que queria o banimento e recorreu da decisão. Fernando é acusado de abusar sexualmente de cerca de 40 atletas, todos menores de idade, ao longo dos anos em que atuou como técnico da equipe do Mesc, em São Bernardo.

Para tanto, eles recorreram a um artigo do estatuto da Federação Internacional de Ginástica (FIG), que prevê banimento por fatos graves. A procuradoria queria a majoração da pena de primeira instância, mas com base no código desportivo brasileiro. Para a procuradoria, os 1.500 dias de suspensão seriam multiplicados por quatro, que é o número de vítimas que depuseram.

Por unanimidade, com oito votos a zero, o auditores acolheram a tese dos advogados dos atletas. Fernando não compareceu ao julgamento, assim como não havia comparecido em primeira instância. "Essa punição é exemplar e inédita, pois a legislação brasileira não prevê diretamente o banimento. Felizmente acolheram a nossa tese de aplicação das normas estrangeiras. Gostaria também de parabenizar o STJD da Ginástica, por ser a primeira esfera a entregar sua prestação jurisdicional! Agora faltam as demais esferas fazerem sua parte", escreveu, no Twitter, o advogado dos atletas, André Sica.

Ao Olhar Olímpico, em novembro, o advogado Fernando Silva Jr, presidente do STJD, que não participou do julgamento por não ser da primeira turma, já indicava que a punição seria revista. No julgamento deste domingo, também foi determinada uma multa, de cerca de R$ 1,6 milhão. O valor seria destinado à CBG, que chegou a convocar Fernando para ser um dos técnicos da seleção brasileira na Rio-2016. Mas não há nenhuma medida que force o agora ex-treinador a pagá-la. Ele alega que recebe cerca de R$ 3 mil por mês, como funcionário público em Diadema (SP).

Fernando foi acusado por diversos ginastas que treinaram sob o comando dele em São Bernardo de assediá-los. O caso tornou-se público às vésperas da Olimpíada do Rio, em 2016, quando os pais de dois alunos procuraram o Ministério Público e Fernando acabou afastado do cargo de treinador da seleção brasileira. Depois, em abril deste ano, uma extensa reportagem do Fantástico ouviu diversos relatos de que os abusos eram cometidos há anos.

Então contratado pelo Mesc, clube de campo de São Bernardo, Fernando foi inicialmente afastado de suas atividades. O Mesc informou, à época, que o acusado vinha trabalhando apenas na área administrativa, mas mães de atletas já haviam denunciado ao Conselho Tutelar da cidade que, na verdade, ele continuava trabalhando como treinador.

Em primeira instância, ele fora condenado em cinco artigos do Código Brasileiro de Justiça Desportiva: 243-B (constranger mediante violência, grave ameaça ou por qualquer outro meio), 243-C (ameaçar alguém), 243-E. (submeter criança ou adolescente, sob sua autoridade, guarda ou vigilância, a vexame ou a constrangimento), 258 (assumir qualquer conduta contrária à disciplina ou à ética desportiva não tipificada pelas demais regras) e 243-G (praticar ato discriminatório, desdenhoso ou ultrajante, relacionado a preconceito em razão de origem étnica, raça, sexo, cor, idade, condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência).

Antes desse julgamento no STJD, o caso Fernando já havia sido avaliado pelo Comitê Olímpico do Brasil (COB), onde o Comitê de Ética julgou a CBG e o técnico Marcos Goto, funcionário do COB, que teria feito troça das acusações contra Fernando e ironizado vítimas. Tanto a CBG quanto Goto acabaram inocentados.

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.