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Olhar Olímpico

Justiça suspende eleição do sindicato dos árbitros após acusação de fraude

Demétrio Vecchioli

25/03/2019 12h35

Arthur Alves Junior (Divulgação/Safesp)

Com Napoleão de Almeida

O Tribunal Regional do Trabalho suspendeu, na manhã desta segunda-feira (25), a eleição do Sindicato dos Árbitros Profissionais do Estado de São Paulo (Safesp), que deveria ter início às 9 horas. A comissão eleitoral só havia aceitado uma chapa, do presidente Arthur Alves Júnior, que concorre à terceira reeleição e que, nesta segunda, está em João Pessoa (PB) – ele também é presidente da comissão de arbitragem da Federação Paraibana. A chapa de oposição foi rejeitada pela comissão eleitoral porque os candidatos residem no interior, e não em São Paulo capital.

Arthur Alves Júnior tem uma série de escândalos no currículo. Em 2016, o UOL Esporte mostrou que ele foi demitido da Federação Paulista de Futebol (FPF) após ser acusado de assédio sexual por diversas árbitras e auxiliares. A responsável por denunciá-lo, Regildência de Holanda, está na chapa cassada. O cartola ainda é acusado de fraudar atas de assembleias e de usar recursos do sindicato para levar ex-funcionárias ao motel. Na ocasião, ele negou as acusações.

Agora, Aurélio Sant'Anna Martins, árbitro que atua com regularidade na Série A-2 do Campeonato Paulista, acusa o grupo que comanda o sindicato há muitos anos de fraudar o processo eleitoral para se perpetuar no poder. "Querem forçar uma fraude na eleição do sindicato. O sindicato de árbitros não trabalha para os árbitros, eles (a diretoria) estão mais preocupados em ter cargos na Federação, na CBF, do que trabalhar em prol da arbitragem. O presidente atual, que está forçando essa fraude, já está há dois mandatos assim", reclama Martins.

A chapa dele foi rejeitada pela comissão eleitoral, nomeada por Alves Júnior. O presidente da comissão é Bruno de Aquino Godoy, filho do atual diretor financeiro entidade, Jair Godoy, eleito na chapa de Alves Júnior. As alegações têm como base o regimento eleitoral – um adendo ao estatuto social – que valia até 2003. Em 2004, de acordo com Martins, um novo regimento foi aprovado e registrado em cartório.

Pelo regimento antigo, candidatos a presidente e vice deveriam morar na capital e tanto o presidente quanto o diretor financeiro deveriam pedir afastamento da arbitragem antes de concorrerem. Em novembro de 2004, depois de uma mudança no Código Civil, o regimento foi alterado. Os candidatos podem morar em qualquer lugar do Estado (Martins é de Jacareí e Regildência de Holanda é de São Bernardo do Campo) e o candidato a vice, não o diretor financeiro, deveria pedir afastamento. A chapa de oposição seguiu as exigências, mas a chapa acabou impugnada, com base no regimento antigo – o candidato a diretor financeiro Fabricio Porfirio de Moura não se afastou.

Presidente em exercício, o vice Leonardo Schiavo Pedalini não quis comentar a decisão da comissão eleitoral. "Isso daí vai ser resolvido judicialmente. A partir do momento em que ele (Martins) entrou na Justiça, vai ser uma decisão judicial", disse.

Pedalini informou que o presidente do sindicato não se encontrava em São Paulo na manhã desta segunda. De acordo com a oposição, Alves Júnior usou sua influência como presidente do maior sindicato estadual de árbitros do país para assumir a comissão de arbitragem da Paraíba, onde dá expediente. Para o vice, não faz diferença onde o candidato à reeleição passe seu tempo. "Ele mora em São Paulo. Onde ele passa o tempo é indiferente. Nenhum regimento diz que tem a ver isso aí com a eleição."

Fake news

Na manhã da eleição, o presidente em exercício do Safesp não soube dizer quantos associados tem o sindicato. "Em torno de 400", aponta. Cada um deles tem que pagar uma anuidade de R$ 450. Além disso, o sindicato recolhe 2% de todas as taxas recebidas pelos árbitros paulistas. O valor total da conta é uma incógnita. Pedalini  diz que não sabe qual a receita da entidade e alega que o Safesp não precisa publicar o balanço financeiro em seu site.

Na véspera da eleição, no fim de semana, o mesmo número que envia a escala de arbitragem por SMS para os árbitros enviou um pedido para que estes paguem a anuidade de 2019. "Árbitro associado: verifique se a sua contribuição está em dia para votar dia 25/03. Entre em contato com a secretaria", diz a mensagem. Para votar, porém, os árbitros têm que estar em dia apenas com a anuidade de 2018.

Em nota, o sindicato negou ser responsável pela mensagem. "Nós do sindicato não solicitamos nada e isso só prejudica o processo eleitoral. Não temos por que ficar enviando nada para ninguém, até porque estamos sendo o mais transparente possível para que a eleição ocorra sem problemas. Não fizemos e nem vamos fazer algo que seja disparado em número de celular para que liguem em nossa sede", comentou Alves Júnior. Na nota, o sindicato diz que a mensagem é: "fake news".

"A Safesp é dos árbitros"

Advogado, Martins advogou em causa própria. Entrou com a ação na Justiça e conseguiu que o juiz plantonista Fábio do Nascimento Oliveira determinasse, por liminar, a suspensão preventiva da eleição, impondo multa de R$ 50 mil ao sindicato em caso de descumprimento.

Ele é candidato pela chapa "A Safesp é dos árbitros", que reclama que o sindicato serve de trampolim político ao mesmo grupo que o comanda há muitos anos. Antes de Alves Júnior, o Safesp foi presidido por Sergio Corrêa, que de lá saiu para presidir a comissão nacional de arbitragem, da CBF.

Martins dá como exemplo o fato de o Safesp ter uma cadeira na Tribunal de Justiça Desportiva (TJD) da FPF, ocupada por um deputado estadual, Delegado Olim (PP). "Isso é livre critério do sindicato. Não tem nenhuma definição nem no nosso estatuto, nem no nosso regimento interno, falando como tem que ser a indicação", defende o presidente em exercício, alegando que Olim tem longa trajetória no direito esportivo – ele, porém, não soube citar nenhuma atuação do deputado na área. "A indicação não foi feita por mim", defendeu-se, depois.

O candidato da oposição reclama, ainda que, que os árbitros têm que fazer longas viagens de carro dentro do estado e que eles estão sendo obrigados a atuar com patrocínio no uniforme, sem ganhar nada por isso. "Você já viu um sindicato que não tem nenhuma ação contra o sindicato patronal, no caso a federação?", questiona.

Atualmente nos Estados Unidos, o árbitro Guilherme Ceretta de Lima é um dos críticos ao atual trabalho do sindicato. "Se ele (Arthur) tivesse feito algo para ter credibilidade durante o tempo em que esteve lá, não se preocuparia com as eleições. O grande problema é ele achar que o pouco que ele fez ser o bastante. Colocar água, fruta, barra de cereal, massagista e ambulância no teste físico é mais que obrigação, mas para ele foi uma conquista enorme."

O presidente em exercício rebate. Diz que o sindicato nunca recebeu demanda de árbitro reclamando da viagem de carro. Ele diz que o sindicato está estudando o que fazer no caso do patrocínio e lista áreas de atuação: "Nós que fazemos toda a folha de pagamento dos árbitros, recolhemos impostos, INSS. Oferecemos seguro de vida… A gente também acompanha os testes físicos dos árbitros, com toda estrutura de tenda, hidratação. É que não tem tudo na ponta da língua..", completa.

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.