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Olhar Olímpico

'Rival' da Fifa exige que governo brasileiro pague uniforme de adversários

Demétrio Vecchioli

05/01/2019 04h00

Esta tela foi apresentada ao governo como cotação de preço de camisas para seleções.

Para receber o Campeonato Mundial de "Sand Soccer", ou "futebol de areia", o governo brasileiro se comprometeu com uma situação pouco peculiar. Vai pagar pelo uniforme de todas as 12 seleções que disputarão o torneio, que será realizado no Rio e custará R$ 2,1 milhões aos cofres públicos. Segundo o Ministério da Cidadania, onde hoje está alocado o que antes era o Ministério do Esporte, essa exigência foi feita por uma entidade chamada "Soccer World Confederation" (Confederação Mundial de Futebol).

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Apesar de informar ter patrocinadores que vão da Mastercard à Brahma, a entidade é desconhecida no esporte. Enquanto a Fifa (Federação Internacional de Futebol) é reconhecida por absolutamente todos os organismos internacionais como a autoridade máxima no futebol, no futsal e no beach soccer (que no Brasil é popularmente conhecido como futebol de areia), a SWC se apresenta como uma união internacional de federações, ligas e associações de "jogos de futebol em campos pequenos".

Isso inclui, segundo a SWC, esportes como "futebol5", "futebol6″, futebol7", sand soccer, futebol society, futnet e futevôlei. No site da confederação, que entrou no ar em dezembro e tem apenas duas notícias que juntas somam três linhas, há um calendário. Mas sites de busca na internet não encontraram informações sobre as competições supostamente realizadas. Também não existem detalhes sobre o que seriam o futebol5, futebol6 e futebol7, principais modalidades sob o chapéu da SWC. O único vídeo disponível é de uma competição amadora de futebol de praia disputada no interior do Rio Grande do Sul.

A confederação tem sua sede no Canadá e é presidida por Christian Prevost, canadense. O secretário-geral (que costuma ser quem toma conta do dia a dia da entidade) é o brasileiro Nereu Maydana, criador do torneio amador gaúcho. Ele é presidente da Confederação Brasileira de Futebol de Areia (CBFAreia), que conseguiu R$ 3,1 milhões do governo federal no finalzinho de 2018 em dois convênios, apesar de o futebol de areia ser um esporte praticamente inexistente no país – nenhuma competição com suas regras foi realizada nos últimos dois anos. Por aqui, joga-se pelas regras do beach soccer, muito parecidas.

O Olhar Olímpico fez uma reportagem sobre esses convênios na quinta-feira (4), mostrando que R$ 2,1 milhões serão gastos com o Mundial, a ser realizado no Parque Olímpico da Barra, no Rio. Estão previstos mais de R$ 70 mil para compra, para todas as seleções, de camisetas, shorts e coletes, cujos preços referenciais foram tirados de sites de varejo.

Na sexta, o Ministério da Cidadania explicou por que vai pagar pelos uniformes: "O documento apresentado pela Federação Internacional informa que é responsabilidade do país-sede fornecer todos os uniformes que, padronizados, deverão receber a marca do Governo Federal", explicou. Chama atenção que está prevista a compra de um jogo de uniforme, apenas, para cada jogador. O documento não faz parte da documentação anexada no sistema de transparência do governo, que deveria incluir todos os documentos do processo.

Em nota ao blog, o Ministério da Cidadania ressaltou que "é dever do Estado a proteção e o incentivo às manifestações esportivas de criação nacional e o futebol de areia é uma delas". "Além dos orçamentos apresentados pelas entidades proponentes para celebração de convênios, o ministério realiza pesquisas independentes e, se necessário, solicita novos orçamentos e justificativas", continuou o governo. Na mesma mensagem, o Ministério da Cidadania citou que todos os convênios e contratos celebrados nos últimos dois meses serão revisados pela atual gestão e já tiveram os pagamentos suspensos.

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.