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Olhar Olímpico

MPF apresenta nova denúncia contra Coaracy e cita Cielo como vítima

Demétrio Vecchioli

06/06/2018 15h30

Cesar Cielo é homenageado por Coaracy Nunes (Satiro Sodré/SSPress)

O Ministério Público Federal (MPF) de São Paulo apresentou nesta quarta-feira uma segunda denúncia contra Coaracy Nunes e a antiga cúpula da Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA), numa prorrogação da Operação Águas Claras. Agora, a acusação é relativa à recorrente contratação de uma mesma agência de turismo, a Roxy, a partir de licitações supostamente fraudadas. Diversos e-mails são apresentados como provas de que a CBDA definia o preço que pagaria à Roxy e apresentava duas empresas "de fachada" para serem derrotadas na concorrência. Além disso, as compras eram feitas com sobrepreço e, muitas vezes, prejudicando atletas.

Exemplificando a forma de agir da CBDA e da empresa, a denúncia mostra uma viagem de Cesar Cielo paga com recursos públicos. Para ir e voltar de Belo Horizonte a Lyon (França), ele passou pelo Rio e por Paris, num total de seis voos, que saíram por R$ 17.674,26 aos cofres públicos – a viagem foi paga com recursos de um convênio. A Polícia Federal constatou que o trecho poderia ser realizo com valores entre R$ 3,4 mil e R$ 5,5 mil.

No texto enviado à imprensa pelo MPF, é informado que "muitas das passagens adquiridas pela confederação, por meio da Roxy, envolviam conexões mais extensas e as mais desconexas possíveis, com relação ao destino final das equipes, justamente para tornar mais longos os trechos aéreos, encarecer os bilhetes e, assim, justificar uma demanda excedente por recursos públicos".

"Essa prática era inaceitável, pois cabe a qualquer confederação zelar, em primeiro lugar, pelo bem-estar físico e mental do atleta de alto rendimento, para que ele tenha um melhor desempenho nos treinamentos e competições", comentou a procuradora da República Thaméa Danelon, autora da denúncia, via assessoria de imprensa.

A acusação de que as passagens com longas conexões tinham como intuito justificar uma demanda excedente por dinheiro público, contudo, não consta na denúncia apresentada pelo MPF à Justiça Federal. No documento, é citado apenas que a PF verificou "que era comum a solicitação da CBDA à Roxy para emissão de passagens aéreas com prazo muito curto, poucos dias de antecedência da data da viagem, o que, indubitavelmente, é um fator que gera a emissão de passagens aéreas com valores muito elevados".

Para o MPF, a fraude consistia principalmente na simulação de processos licitatórios para compra de passagens aéreas e contratação de hospedagem. Essa tese, que permeava as investigações desde seu início, no ano passado, e que já havia sido alvo de apontamentos de auditoria da Controladoria Geral da União (CGU), ficou demonstrada depois da apreensão de documentos.

"Com a análise dos e-mails, resta evidente que, em vez de a CBDA solicitar orçamentos de diversas empresas e simplesmente se valer do menor preço apresentado, os orçamentos eram montados pela própria CBDA, que por sua vez solicitava à Roxy que os colocassem em papel timbrado, enviando de volta à CBDA como se tivesse sido originariamente elaborado pela empresa. Na sequência, a CBDA, com a ajuda da própria Roxy, se encarregava de conseguir 'orçamentos de cobertura', em valor superior, para validar a sua proposta como a melhor", detalha a denúncia de Danelon. Esses e-mails são fartamente apresentados na denúncia.

Acusações

São denunciados o ex-presidente da CBDA Coaracy Nunes, seu braço-direito e antigo diretor administrativo Ricardo de Moura, o ex-coordenador de polo aquático Ricardo Cabral, o ex-diretor financeiro Sérgio Lins Alvarenga, além dos empresários Michael Wernie e Flávio Correa, pelo crime de fraude em licitação. Os dois empresários também são acusados de integrar organização criminosa, crime pelo qual os demais já foram acusados na primeira denúncia, apresentada no ano passado.

Fernanda Magnani Teodoro Altieri de Oliveira, sócia da empresa F2 Viagens, Rosiene Lopes Hancio, Sue Elen de Araújo Diniz e Yvanete Penna Trindade Silva, da Mundi Tour, se livraram da acusação porque o MPF entendeu que elas são "possivelmente sócias laranjas" e que não há comprovação do envolvimento delas nas fraudes e nos crimes investigados.

No entender do MPF, os acusados fraudaram o caráter competitivo de quatro procedimentos licitatórios com o intuito de obter, para Michael Wernie, dono da Roxy, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação. Eles ainda teriam desviado cerca de R$ 3 milhões de convênios com o Ministério do Esporte, a partir de contratações da Roxy, além de outros R$ 21 mil para Maria da Glória Nunes, esposa de Coaracy.

Maria da Glória agora é citada porque ela realizou três viagens a partir de recursos dos convênios, para Mococa (no interior de São Paulo, onde acontecia a principal competição juvenil do país), São Paulo (para o Troféu José Finkel, campeonato nacional adulto) e para o Canadá (Mundial de Piscina Curta). À época, em 2015, Coaracy já estava bastante debilitado, se locomovia quase que apenas de cadeira de rodas, e tinha na esposa uma espécie de cuidadora.

Outro lado

A defesa da Roxy enviou à reportagem o seguinte comunicado:

A presente denúncia é cópia do processo de improbidade administrativa. Este como aquele basearam-se em um inquérito produzido para buscar a verdade que o MPF queria. Entretanto é eivado de erros de datas, valores e conclusões. Como exemplo veja a página 7 da denuncia.  No e-mail referido o mesmo tem data de 24/03/16 para fundamentar suposta fraude de 2013/2014. Como pode este e-mail provar fato passado?

Outro erro comum e grosseiro é usar o valor inteiro da verba destinada a um determinado evento e afirmar que toda ela teria sido desviada.  A primeira pergunta é: Os atletas embarcaram? Receberam hospedagem e alimentação?
A todas estas perguntas afirmamos, categoricamente, que nunca foi descumpridor qualquer contrato ou cumprido com superfaturamento. Não se pode comparar preços entre DECOLAR e embarque de atletas de eleita. Não existe qualquer empresa fantasma. Pela defesa apresentada pela F2 junto ao processo civil verificamos que a mesma é ativa e emite notas com regularidade. Quanto a MUNDI TOUR nós mesmo a localizamos e a processamos antes destas ações começarem, por desavenças comerciais.

A CBDA se posicionou da seguinte forma:

A Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos lamenta estar no centro de investigações de corrupção, o que vem prejudicando o recebimento de recursos para o fomento de suas cinco modalidades olímpicas. A Nova Gestão da CBDA reitera que irá colaborar em todas as investigações do Ministério Público Federal na medida em que for acionada.

 

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.