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Olhar Olímpico

Com 4º título da Champions, Duda admite que já é 'lenda' do handebol

Demétrio Vecchioli

15/05/2018 13h49

Duda na final da Champions (divugação/Gyori)

Se o Real Madrid vencer o Liverpool daqui a duas semanas, Casemiro e Marcelo vão se tornar os primeiros brasileiros a alcançarem quatro títulos da Liga dos Campeões. Isso no futebol. É que no handebol o feito inédito já foi obtido por Duda. A ala da seleção faturou o tetra da Champions no domingo, quando o Győri, da Hungria, ganhou a taça pela quarta vezes nos últimos seis anos, diante de um ginásio lotado com mais de 12 mil espectadores em Budapeste.

Titular em todas as conquistas, desta vez Duda foi ainda mais protagonista. Tida como a melhor defensora do mundo, ela brilhou no ataque não apenas marcando o gol que levou o jogo para a prorrogação, mas também anotando quatro dos sete gols do time dela no tempo extra, todos em momentos nervosos – os três primeiros e também o último.

Pergunto a Duda, por telefone, se ela considera que essa atuação a credencie para ser eleita mais uma vez, como em 2014, como a melhor do mundo. A resposta dela não tem falsa modéstia. "Melhor do mundo eu não sei , mas eu entro como uma das lendas do handebol. São pouquíssimas que têm quatro títulos de Champions, só uma outra jogadora tem seis. Eu estou entre as 10 que mais tiveram resultado durante a carreira em todos os tempos."

Não há como discordar. Irmã mais nova de Ana Amorim, também jogadora de seleção, Duda fez parte da seleção ideal do Mundial Júnior de 2005, ano em que conquistou seu primeiro título nacional na Macedônia. Ela seria tetracampeã pelo Kometal Skopje antes de se transferir para o Győri ETO, onde ganhou outros oito títulos. Com exceção da temporada 2014/2015, quando perdeu a final por um gol, foi campeã nacional todos os anos da carreira profissional, em países de tradição no handebol – a final da Champions foi contra um time da Macedônia.

Na Liga dos Campeões, que no handebol tem o mesmo peso do futebol, o primeiro título veio em 2014. "Na primeira vez que a gente foi jogar uma final, o coração estava na boca, não conseguia ficar calma. Era uma pressão enorme, a gente tinha perdido algumas semis nos anos anteriores. Parecia que eu ia morrer se não ganhasse", lembra.

Ganhou, não morreu, e aprendeu a liderar um time vencedor. Na avaliação da própria Duda, o Győri não tem o melhor time no papel, mas sabe ganhar títulos. "A gente sabe jogar como equipe. O Bucaresti (Romênia), da semifinal, tem um elenco que no papel é melhor, com mais opções de troca, mas nossa diferença foi saber jogar em equipe. Na maioria dos momentos dos jogos a gente tinha aquela confiança de que vai dar certo", comenta.

E confiança é com Duda. A brasileira havia feito apenas dois gols na partida decisiva quando pediu para receber a bola que seria de vida ou morte para a equipe, no final do tempo regulamentar. Abriu espaço pela ala esquerda e marcou lindo gol. Depois, no começo da prorrogação, voltou a chamar a responsabilidade. Fez outros três.

"Eu decidi que a gente tinha que ganhar aquele jogo. Simplesmente não sei, aconteceu o momento que você relaxa, vai com toda confiança do mundo. Fiquei um tempo de fora, levei 2 minutos, então estava um pouco mais fresca", lembra.

A festa, que começou no domingo, durou o dia todo de segunda-feira. Nesta terça o foco já voltou par a Liga Húngara. Faltam duas partidas, no domingo e na quarta-feira da semana que vem, e o Győri tem que atropelar. O campeonato deve ser decidido no saldo de gols e o time de Duda, que tem sete gols a mais, tem rivais mais difíceis que o segundo colocado. Mesmo assim, a meta é fazer 15 gols de diferença fora de casa, no domingo, e pelo menos 20 na última rodada. "Dá para ganhar, deve dar tudo certo."

Começo do fim

Duda já decidiu. Vai se aposentar após os Jogos Olímpicos de Tóquio. Ou seja: daqui a pouco mais de dois anos. Estará prestes a completar 34 anos e quer realizar o sonho de ser mãe, ter uma vida independente das quadras, seja no Brasil, na Hungria ou na Macedônia, terra do marido.

"Quero terminar no topo ou que esteja caindo só um pouquinho. Acho que consigo mais um ano ter uma boa performance e talvez no último ano tentar manter o ritmo. Depois disso eu quero parar. Quero viver o máximo da minha carreira, quero me doar 100%,, ficar no topo até o fim da carreira."

São dois anos, portanto, para continuar liderando a seleção brasileira num momento de transição. A equipe caiu na primeira fase do Mundial do ano passado, numa campanha que Duda recusa a avaliação de decepcionante, mas quer voltar a brigar por medalha até Tóquio.

"O que mais esse Mundial trouxe foi a esperança. As meninas são novas, é normal esperar que a gente não fique entre os oito. A última fase de treinamentos contra a França foi uma fase que me deu muita esperança. Umas meninas vieram falar: 'Você falou para eu fazer coach e eu estou fazendo'. São meninas com sede de melhorar em dois anos. No próximo Mundial já pode de novo sonhar em estar entre os oito. Para Tóquio, não é real hoje falar que pode ganhar uma medalha, mas a gente vai brigar para ser", promete.

Antes, apesar de uma temporada desgastante na Hungria, Duda vai defender a esvaziada delegação brasileira nos Jogos Sul-Americanos, em Cochabamba, na Bolívia, que começam daqui a duas semanas. A competição vale vaga nos Jogos Pan-Americanos, que por sua vez é classificatória para a Olimpíada, e a possível melhor do mundo não quer arriscar.

"Estar na seleção continua sendo um prazer. Se eu quero estar Tóquio, tenho que estar em campeonatos menos importantes. Não concordo com isso (pedir dispensa), nunca concordei. Se você quer a seleção tem que estar em todo momento. Se de repente tiver um jogo mais difícil, é aí que você vai aprender como as outras atletas se portam. Não posso deixar de participar", diz, colocando-se à disposição para ser um exemplo para as mais novas. "Muitas vezes elas querem construir uma carreira, mas não veem um caminho. Não sou uma pessoa que vai chegar e fala: vai fazer isso. Mas se ela estiver perguntando para mim, vou ter todo o prazer de compartilhar as experiências."

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.