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Olhar Olímpico

Sem água e papel higiênico, evento no Parque Olímpico tem mulher agredida

Demétrio Vecchioli

07/11/2017 04h00

(Divulgação)

O primeiro evento esportivo de médio porte organizado na Arena Carioca 1 depois dos Jogos Olímpicos do Rio teve diversas falhas de organização e terminou em confusão. Uma aluna de comunicação da Facha (Faculdade Integrada Helio Alonso) diz ter sido agredida com um tapa no rosto pelo pai de um jogador da engenharia da UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro). A agressão deu início a uma confusão generalizada, não contida pelos organizadores, que receberam de graça a permissão para utilizar as Arenas 1 e 2 durante todo o feriado prolongado.

A cessão do espaço para a realização dos "Jogos Nacionais Universitários" já havia sido tema de reportagem do Olhar Olímpico em setembro. À época, a Autoridade de Governança do Legado Olímpico (AGLO) afirmou que o festival universitário iria reunir 2.000 atletas e atrairia um público de quatro mil pessoas por dia. A entidade defendeu que os estudantes são "atletas sérios" que treinam "em estruturas profissionais".

A reportagem conversou com três pessoas que estiveram em todos os quatro dias de evento e nenhuma delas apostou em mais de mil participantes. Além disso, a promessa de realização de uma competição "nacional" não foi cumprida. Participaram apenas as atléticas que costumam disputar os InterENG (jogos entre faculdades de engenharia do Rio), a Facha e a Rural. Apesar de não pagar aluguel, os organizadores, da JC2 Eventos, cobraram R$ 80 de cada participante. Eles alegam que o festival era sem fins lucrativos, ainda que a empresa seja privada e viva de organizar eventos do tipo.

Os relatos convergem em críticas. Até domingo, os banheiros não haviam sido limpos nenhuma vez. Além disso, não havia papel higiênico à disposição. "Dava vontade de vomitar", contou uma atleta de handebol. Nos bebedouros não havia água. A JC2 nega tudo, dizendo que contratou empresa de limpeza e que só em um dia houve falha no abastecimento de água, culpa da Autoridade de Governança do Legado Olímpico (AGLO), que cuida da área.

Os seguranças contratados não conseguiram impedir uma briga no sábado. De acordo com relatos de integrantes da Facha, quatro pessoas ligadas à UERJ se infiltraram entre as garotas daquela torcida para ofendê-las. "Eles ficavam xingando de gorda, chamando de 'xis-bacon', e as meninas ficaram chateadas, pedindo para eles pararem", conta Dannis Heringer, presidente do diretório estudantil da Facha. Cada torcida deveria ficar de um lado da quadra, para evitar brigas.

Os organizadores da JC2 também foram procurados e alegaram, segundo o pessoal da Facha, que nada poderiam fazer. Acabado o jogo, um pai de aluno, identificado como Cesar D'Avila, fotógrafo, reclamou que foi atirado gelo nos atletas na quadra e acusou uma aluna da Facha, L., que negou. "Ele me empurrou e me deu um tapa na cara", conta L., que abriu Boletim de Ocorrência e, seguindo recomendação da delegada, pediu para não ter o nome divulgado.

Após a agressão, o fotógrafo foi protegido pelos seguranças enquanto que a torcida, revoltada, invadiu a quadra, partindo para cima do homem de 45 anos e de seu filho. César negou ao Olhar Olímpico que tenha agredido a jovem, disse que ele e o filho é que deveriam abrir boletim de ocorrência, e reclamou que os torcedores da Facha estavam bêbados – estava proibido consumo de bebidas no Parque Olímpico. Não havia policiamento no local. Ele ainda alega que chegou ao local antes da torcida rival e que por isso se negou a sair, negando também as ofensas.

Só a faculdade de comunicação foi punida, com sua torcida sendo expulsa do evento. Cesar foi escoltado pelos seguranças da JC2 para deixar o local. "Sabendo da agressão e tendo o agressor identificado, a organização do evento não se esforçou em levar um homem que bate numa mulher para uma delegacia", reclamou, no Facebook, um dos participantes.

Victor Marconi, proprietário da JC2, alega que os torcedores da UERJ estavam no meio da torcida rival porque queriam ficar perto do banco de reservas do time e diz que a confusão começou no intervalo, quando César já havia sido acusado de agressão. Sobre ter liberado o fotógrafo mesmo após o novo relato, Marconi diz que "era a palavra dele contra a dela" e que, se mantivesse o pai do jogador no ginásio, o evento poderia terminar em tragédia.

Em nota, a JC2, que tem como dono um ex-aluno da UERJ, disse que "jamais compactuou ou compactuará com esse tipo de violência e já se colocou à disposição para a identificação do alegado agressor para que a integrante da delegação da Facha possa tomar as medidas que entender cabíveis". O filho dele, porém, participou normalmente da final do futsal, no domingo.

"Temos a convicção de que os verdadeiros responsáveis pelo crescimento do esporte universitário e os que realmente amam o esporte universitário não mereciam o ocorrido e jamais apoiariam atos lamentáveis como os ocorridos no dia de hoje", completou a JC2, em nota.

Importante frisar que o festival não é reconhecido pela Confederação Brasileira de Desporto Universitário (CBDU), que ficou incomodada com o fato de a autarquia ligada ao Ministério do Esporte ter apoiado um evento que tentou se comparar aos Jogos Universitários Brasileiros, realizados uma semana antes.

A AGLO, em nota ao Olhar Olímpico, não respondeu sobre a falta de água nos bebedouros nem o estado dos banheiros, afirmando que não teve participação na organização do evento. A entidade diz desconhecer que houve consumo de bebidas alcoólicas durante o evento – fato fartamente divulgado em fotos dos organizadores – e, sobre a agressão sofrida por uma estudante, comentou que "episódios envolvendo discussões entre torcidas são comuns em casos de descontentamentos de resultados negativos por parte de uma delas".

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.