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Olhar Olímpico

Sem competições, arenas olímpicas têm culto gospel e festival universitário

Demétrio Vecchioli

26/09/2017 04h00

(Divulgação/Governo Federal)

Ao mesmo tempo que cobrou para alugar as arenas do Parque Olímpico da Barra para confederações como a de vôlei, a Autoridade de Governança do Legado Olímpico (AGLO) decidiu ceder de graça as Arenas Cariocas 1 e 2 durante o feriado de Finados para que uma empresa privada organize um festival universitário, desses em que a parte festiva é tão ou mais importante que a esportiva. A competição não é oficial, uma vez que não é reconhecida pela Confederação Brasileira de Desporto Universitário (CBDU).

Um ano após o encerramento dos Jogos Paraolímpicos e 10 meses após a criação da AGLO, por enquanto só uma competição oficial de nível nacional ou internacional foi realizada nas instalações olímpicas: o Circuito Mundial de Vôlei de Praia, no Centro Olímpico de Tênis. Sem eventos esportivos, Arenas Cariocas 1 e 2 estão servindo para outros fins.

No próximo fim de semana, a Arena Carioca 1 vai receber o Rio Carioca Games, uma competição de crossfit, enquanto que em 28 de outubro o ginásio que recebeu as competições de basquete da Rio-2016 será palco de um culto gospel para comemorar os 500 anos da Reforma Protestante. Para usar o local, o Sínodo do Rio de Janeiro terá que desembolsar mais de R$ 50 mil, enquanto que os promotores do evento de crossift deixarão uma taxa de 20% sobre a receita total do evento.

A postura contrasta com a tomada diante do festival universitário. Questionada pelo Olhar Olímpico, a AGLO, que é uma autarquia ligada ao Ministério do Esporte, confirmou que não irá cobrar pelo aluguel, mas não explicou as razões da decisão. Sequer uma porcentagem dos valores cobrados dos universitários pela promotora será retida pela AGLO, que entende que a empresa "não visa lucro". Os universitários pagam para participar.

Ao anunciar a realização da primeira edição dos "Jogos Nacionais Universitários" no Parque Olímpico da Barra, aliás, a AGLO criou desconforto com a CBDU, que terá acabado de realizar a edição 2017 dos Jogos Universitários Brasileiros, em Goiânia, de 18 a 29 de outubro. Os JUBs, como a competição é conhecida, são realizados anualmente e fazem parte do sistema nacional esportivo. Ou seja: são os JUBs o torneio que define os campeões nacionais universitários brasileiros.

Enquanto isso, os "Jogos Nacionais Universitários" são mais uma dessas competições que, nos feriados prolongados, atraem universitários para cidades normalmente interioranas. Em São Paulo, é o caso do JUCA (alunos de comunicação), Economíadas (economia), Jurídicos (direito), InterMed (medicina), InterUSP (da USP), InterUnesp (da Unesp) e por aí vai.

Em São Paulo, esses eventos têm tido cada vez mais dificuldade de encontrar sedes, uma vez que ao mesmo tempo que atraem uma multidão de universitários/turistas para uma determinada sede, também geram impacto negativo pela algazarra das festas que acompanham a competição.

No Rio, a empresa JC2 Esportes conseguiu o pulo do gato. As competições serão realizadas nas arenas mais modernas do país, concentrando as competições em uma mesma estrutura (as Arenas Cariocas 1 e 2 são interligadas) e oferecendo segurança aos universitários dentro de um parque fechado, que será dotado de food trucks e bares. Além disso, a AGLO tem uma carteira de parcerias com hotéis da região, que oferecem descontos. Boa parte dos alunos de fora do Rio, porém, deve ficar hospedados em escolas públicas – ao menos, esse é o plano. Tudo sem ter que pagar nada.

Ao blog, a AGLO negou que o festival seja uma "festa", alegando que as arenas foram solicitadas para "práticas esportivas" e disse que não há "necessidade" de o evento ser chancelado pela CBDU. Em entrevista ao jornal O Globo, o presidente da AGLO, Paulo Márcio, disse que a empresa privada que organiza o evento tem intenção de "fomentar o esporte, e não necessariamente de lucro".

Em texto enviado à imprensa na semana passada, a AGLO afirmou que o festival vai reunir 2000 atletas universitários e deve atrair um público de quatro mil pessoas por dia. A entidade tentou defender que os estudantes são "atletas sérios" que treinam "em estruturas profissionais". Ao redor das arenas serão instalados bares.

O material da AGLO ainda faz propaganda da JC2 Esportes, que há sete anos organiza esses festivais universitários no Rio. Para o presidente da AGLO, Paulo Márcio, o festival esportivo será uma oportunidade de descobrir atletas com potencial para alto rendimento que poderão disputar Campeonatos Mundiais. O blog tentou contato com a JC2 Esportes, que não respondeu aos e-mails enviados.

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.