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Olhar Olímpico

Fora da TV, Mayra vinga colegas, bate duas japonesas e é bi mundial

Demétrio Vecchioli

01/09/2017 13h30

(AFP PHOTO / ATTILA KISBENEDEK)

Depois de cinco derrotas de brasileiras para japonesas no Mundial de Judô, todas depois finalistas, o tabu chegou ao fim. E em dobro. Mayra Aguiar venceu duas japonesas em sequência, na semi e na final, para conquistar o seu segundo título mundial. A conquista veio com 11 segundos de golden score, quando a brasileira encaixou um golpe na então campeão Mami Umeki. O feito, porém, não pôde ser visto na tevê – nenhuma emissora comprou os direitos da competição, disputada na Budapeste Arena, na capital da Hungria.

A medalha é a quinta da carreira de Mayra em Campeonatos Mundiais, voltando a se isolar como a brasileira que mais vezes foi ao pódio nesta competição. Ela estava empatada com Érika Miranda, que na terça-feira ganhou o bronze na categoria até 52kg, sua quarta medalha seguidas em Mundiais.

Mayra também alcançou esse feito, mas entre 2010 e 2014. Foi prata em 2010, bronze em 2011 e 2013 e ouro em 2014. A série só foi interrompida em 2015, quando a brasileira foi surpreendida por uma polonesa na segunda rodada. Nesse meio tempo, desde 2010, ela ainda ganhou dois bronzes olímpicos. Agora bicampeã mundial, ela se iguala a João Derly, campeão em 2005 e 2007 e um dos seus tutores – os dois são gaúchos e crias da Sogipa. Tudo isso aos 26 anos, apenas.

Na campanha até chegar à semifinal, Mayra venceu Klara Apotekar (Eslovênia), Bernadette Graf (Áustria) e a francesa Audrey Tcheumeo, sua algoz na Rio-2016, sempre por ippon – esta última, aliás, ainda tomou dois wazaris.

Na semi, Mayra foi beneficiada por uma arbitragem polêmica. A brasileira encaixou um wazari no chão sobre a japonesa Ruika Sato e ficou em vantagem, em um momento em que as duas rivais tinham dois shidôs (punições). Com três, a atleta é desclassificada. Faltava um minuto para o fim da luta e Mayra não poderia mais ser punida, ao mesmo tempo em que precisava se defender.

Faltando cerca de nove segundos para o fim da luta, Mayra fez um falso ataque, que é quando a judoca finge tentar um ataque e vai direto para o chão, fugindo de um golpe. O árbitro central pediu que as duas rivais ajustassem seus quimonos, como se fosse punir a brasileira e encerrar a luta, mas mandou que o confronto continuasse.

Na final, não houve poréns. Mayra foi muito superior. Umeki, campeã mundial em 2015, só se defendeu a luta toda. A brasileira conseguiu um golpe a 1min34s do fim, mas que não contou como wazari – o shidô foi abolido. A luta seguiu empatada até o fim dos 4 minutos regulamentares, forçando o golden score e com Umeki sempre comprometida com duas punições – a terceira a eliminaria. A vitória, porém, veio com um golpe, um wazari.

O feito de Mayra ganha relevância quando se considera que as judocas japonesas vêm dominando o Mundial de forma incrível. Até aqui, com oito participantes, o Japão ganhou três medalhas de ouro, outras três de prata e uma de bronze.

FORA DA TV – Tudo isso não foi transmitido por nenhuma emissora no país, nem mesmo na TV a cabo. É que nenhuma das cinco emissoras fechadas dedicadas exclusivamente ao esporte adquiriu os direitos de transmissão do Mundial. Para acompanhá-lo, só recorrendo ao Youtube, com transmissão em inglês.

O cenário é novo. O Mundial de 2015, por exemplo, foi transmitido simultaneamente por quatro desses canais: SporTV, Esporte Interativo, ESPN e BandSports. Só a a Fox Sports ficou fora do pool, liderado pelo Esporte Interativo, que repassava os direitos à ESPN, que por sua vez repassava ao SporTV e à Bandsports.

Um modelo de negócio complexo que não pôde ser repetido em 2017 por conta do preço cobrado pela Federação Internacional de Judô (IJF, na sigla em inglês). "Os preços (direitos, satélite, horários, rating, etc) estavam proibitivos agora, não apenas para a ESPN, mas para todo mundo", explicou a ESPN ao Olhar Olímpico.

Já o SporTV, que transmitiu os Mundiais de Atletismo, Natação e Canoagem Velocidade em sequência (todos com medalha para o Brasil), também que tinha interesse em comprar também os direitos da competição de judô. "Esse ano não chegamos a um acordo com a IJF para essa competição", pontuou o canal, sem entrar em detalhes, e reforçando que transmite os principais eventos da Confederação Brasileira de Judô (CBJ).

O blog apurou, porém, que os valores pedidos pela IJF eram muito acima do usual. Mais caros, por exemplo, do que o Mundial de Esportes Aquáticos, que teve a disputa de seis modalidades, durante mais de duas semanas, e cujas finais eram atrativas mesmo sem conter atletas brasileiros.

CAMPANHA – Nesta sexta, duas brasileiras foram até esse bloco final. Na categoria até 70kg, Maria Portela venceu duas lutas até chegar às quartas de final contra a japonesa Chizuru Arai, que a venceu e seguiu no caminho para ser a nova campeã mundial. Na repescagem, a brasileira levou um wazari e acabou derrotada pela espanhola Maria Bernabeu, que já havia sido sua algoz no Mundial de 2015 e na final de um Grand Slam no ano passado.

Além das duas gaúchas, o Brasil ainda teve nesta sexta-feira a estreia em Mundiais de Samanta Soares, de 24 anos. Atleta da mesma categoria de Mayra, ela deu azar ao estrear já contra a japonesa Mami Ureki, que depois viria a fazer a final contra Mayra.

Aliás, essa foi a sina das brasileiras em Budapeste. Stephanie Arissa (48kg) foi eliminada por Funa Tonaki, sua colega de treinos em uma universidade do Japão e agora campeã mundial. Sarah Menezes (52kg) parou em Ai Shishime, que também foi campeã da categoria, enquanto Érika Miranda saiu do caminho do ouro ao ser derrotada por Natsumi Tsunoda, prata nesta mesma categoria até 52kg.

Das brasileiras que competiram até agora no Mundial, só Rafaela Silva e Ketleyn Quadros não tiveram pela frente rivais japonesas. Rafaela perdeu na estreia para a portuguesa Telma Monteira, bronze na Rio-2016, enquanto Ketleyn ainda ficou em sétimo, depois de perder de uma polonesa e, depois, de uma mongol, ambas medalhista de bronze no Mundial. No masculino, nenhum brasileiro terminou entre os oito primeiros.

No sábado, o Brasil terá cinco competidores e grandes chances de medalha. Especialmente na categoria peso pesado masculina, com David Moura, líder do ranking mundial, e Rafael Silva, que deu azar no sorteio e pega o francês Teddy Riner nas quartas de final (se os dois avançarem, claro). Maria Suelen Altheman também não se saiu bem no sorteio e pode pegar a chinesa Song Yu, atual campeã mundial, já na segunda luta. Já Luciano Corrêa (até 100kg) entra na competição como azarão.

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.