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Olhar Olímpico

Após Câmara aprovar privatização, qual o futuro do Pacaembu?

Demétrio Vecchioli

01/09/2017 04h00

A Câmara Municipal de São Paulo autorizou na noite da última quarta-feira que a prefeitura conceda o Pacaembu à iniciativa privada por 35 anos. Mas o que isso quer dizer? Nada muito complexo. O projeto de lei enviado pelo prefeito João Doria (PSDB), aprovado com 42 votos a favor e 12 contra, tem apenas pouco mais de uma página. De acordo com a oposição, trata-se de um cheque em branco para a administração municipal, que até o fim do ano deve abrir a concorrência pelo estádio a partir de regras que ela ainda vai definir.

"O texto aprovado não especifica como vai ser feita essa concessão. Por isso a gente está chamando de cheque em branco. O projeto não diz, por exemplo, se será uma concessão patrocinada, que é quando o poder público dá a concessão mas ainda assim precisa investir dinheiro para o bem se manter de pé, precisa colocar dinheiro. A prefeitura vem alegando que vai nos fazer economizar R$ 9 milhões por ano, mas nada garante que não precisará gastar. A lei aprovada não deixa delimitado que não vai ter custo", critica a vereadora Sâmia Bonfim, do PSOL.

O partido dela apresentou um dos textos substitutivos ao projeto inicialmente enviado por Doria à Câmara. O mesmo fizeram, entre outros, Eduardo Suplicy (PT), Antonio Donato (PT) e José Police Neto (PSD). Este último liderava um grupo de 17 vereadores descontentes com o ritmo imposto pela prefeitura para as privatizações, mas acabou, como os demais, aprovando o projeto de Doria. Os substitutivos sequer foram votados.

"[O projeto aprovado] não tem contrapartida do esporte enquanto política pública. Você quer conceder o Pacaembu, mas qual a contrapartida que você vai dar para a população? Porque a gente está perdendo o espaço público, um complexo esportivo que pode perder sua função. Hoje existem aulas gratuitas de uma série de modalidades, tem quadras, ginásio, piscina. Esse projeto não dá existe contrapartida de políticas para o esporte", continua Sâmia.

Após a apresentação do primeiro texto, deste que é o primeiro item do Plano Municipal de Desestatização (PMD) que segue para sanção de Doria, a Câmara teve 90 dias para discutir o tema. O secretário de desestatização, Wilson Poit, chegou a participar de uma audiência pública, recolheu sugestões dos vereadores, mas as modificações apresentadas no texto que acabou aprovado ditam principalmente sobre urbanismo.

Para ficar com o Pacaembu, o concessionário deverá elaborar um PIU (Programa de Intervenção Urbana), o que inclui alargar calçadas, mitigar impactos de trânsito, instalar paraciclos e pontos de aluguel de bicicletas, entre outras melhorias urbanísticas. Além disso, deverá manter pública a Praça Charles Miller. Todas as demais obrigações deverão constar no edital.

Além dos vereadores do PT e do PSOL, que fazem oposição a Doria, apenas o ex-secretário de Esportes Celso Jatene (PR) votou contra o projeto. "O que eles (governo) apresentam como melhorias já são obrigações legais. O PIU está estabelecido no Plano Diretor. Os avanços não existiram, continua genérico", reclamou Jatene ao site da Câmara – procurado, ele não atendeu ao Olhar Olímpico.

Uma das preocupações do grupo é que a lei até trata da necessidade de respeitar a atual legislação de tombamento histórico do imóvel prevista pelo Conpresp (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental de São Paulo), mas o tombamento do Pacaembu não inclui o Tobogã, construído depois. A prefeitura já concluiu um primeiro chamamento público, no qual pediu estudos preliminares para o Pacaembu. De acordo com uma reportagem da ESPN Brasil, dos cinco projetos apresentados, em quatro o Tobogã seria derrubado.

Os projetos estão sendo analisados no Conpresp e também no Condephaat. Neste último, órgão estadual, de acordo com a Folha, três dos cinco projetos foram aprovados. Ainda segundo a Folha, o projeto mais bem avaliado foi o do escritório Fernandes Arquitetos Associados e da alemã SBP (Schlaich Bergermann Partner), que inclui a cobertura do estádio. Os dois órgãos ainda definirão os consórcios habilitados a apresentarem estudo. A partir daí, eles terão 60 dias para fazê-lo, novamente submetendo-o aos conselhos patrimoniais. Só com esses projetos em mãos é que a prefeitura vai definir o modelo que vai constar no edital de concessão do estádio.

Por enquanto, ninguém fala em valores. Em 2015, a prefeitura então sob a gestão de Fernando Haddad, também convidou interessados para uma fase de estudos, em processo também comandado por Poit, o agora secretário de desestatização de Doria. Na época, o projeto mais barato sairia por R$ 350 milhões.

O blog conversou com Poit. Ele alegou que, à época, havia a exigência de que o concessionário cobrisse o Pacaembu e o deixasse no "padrão Fifa", e que era isso que encarecia o processo. Agora, porém, a cobertura vem novamente à tona. De acordo com a Folha, seria uma forma de diminuir o impacto sonoro dos "shows e eventos" que o projeto de lei aprovado pela Câmara autoriza. A associação de moradores do bairro do Pacaembu, porém, há anos conseguiu na Justiça a proibição de shows no estádio.

De acordo com a prefeitura, só a partir dos estudos é que será aprovado o modelo de concessão, "com regras, contrapartidas, entre outros". A prefeitura garante ainda que "o acesso da população ao Centro Esportivo será mantido". "Com a concessão, além da revitalização de um estádio histórico, a cidade receberá recursos para investimento em saúde, educação, habitação e transporte, entre outros", argumenta a administração, que ressalta que eventuais alterações na estrutura do Pacaembu "só deverão ocorrer com anuência do Conpresp e também do Condephaat".

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.