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Olhar Olímpico

Na Torre de Babel do atletismo, cubano tem colegas de 5 países e defende Azerbaijão

Demétrio Vecchioli

11/08/2017 08h49

Alexis Copello disputa salto triplo no Mundial de atletismo

O cubano Yasmani Copello compete pela Turquia, junto com Ramil Guliyev, que nasceu no Azerbaijão, país defendido por Alexis Copello, também cubano, que por sua vez tem faz parte do "time Pedroso", que ainda tem a venezuelana Yulimar Rojas, a casaque Olga Rypakova, a espanhola Ana Peleteiro e o português Nelson Evora, todos finalistas do salto triplo, além do francês Teddy Tamgho, ex-campeão mundial da prova. Como se vê, nacionalidade não é exatamente um parâmetro para se levar em consideração no Mundial de Atletismo. Ainda mais quando o assunto é Cuba.

Alexis Copello é, talvez, o melhor reflexo dessa Torre de Bebel que vem se tornando o atletismo, apesar das limitações que a federação internacional, a IAAF, tenta impor. Medalhista no Mundial de 2009, ouro no Pan de 2011 e finalista na Olimpíada de Londres-2012, sempre como cubano, ele ficou com quinto no salto triplo do Mundial competindo pelo Azerbaijão, ainda que seu uniforme não tivesse a bandeira do país.

"Decidi sair de Cuba para ficar com minha família. Sou casado com uma espanhola, que estava esperando uma linda menina. Eu continuo sendo cidadão cubano, tenho dupla nacionalidade, e posso voltar para meu país quando eu quiser. Vou lá para visitar minha família", contou Copello ao Olhar Olímpico, depois de um resultado histórico para o Azerbaijão, o melhor da história do país em Mundiais de Atletismo.

Ele diz que não escolheu o Azerbaijão por questões financeiras, apenas pela oportunidade que lhe foi oferecida para competir em alto nível e que viveu dois anos em Baku. Mas a verdade é que a tentativa de naturalização de Copello veio em um momento no qual o Azerbaijão tentava montar equipes fortes para disputar a primeira edição dos Jogos Europeus, em 2015, disputados exatamente em Baku. Como Cuba não autorizou a mudança de nacionalidade, Copello teve que ficar três anos sem competir internacionalmente, em uma espécie de quarentena cobrada pela IAAF para evitar esse tipo de situação. Só estreou pelo Azerbaijão em abril passado. Outro cubano, Lorenzo Sotomayor, passou pelo mesmo processo e ganhou a prata na Rio-2016 o boxe como azeri.

No atletismo, a regra não tem sido empecilho para muitos atletas cubanos desertores – o que Alexis Copello diz não ser. No total, são oito cubanos que disputam o Mundial de Atletismo por outros países. A lista é puxada pelo espanhol Orlando Ortega (sétimo nos 110m com barreiras) e seu colega Yidiel Contreras, da mesma prova, e pelo turco Yasmani Copello (prata nos 400m com barreiras). Mas, além deles, estão em Londres as italianas Yadisleidy Pedroso (400m com barreiras), Yusneysi Santiusti (800m) Libania Grenot (4x400m), a dominicana Yordanis Durañona (salto triplo) e a uruguaia Aguelmis Rojas (maratona). Yasmani Copello e Ortega estão entre as deserções mais sentidas, porque ambos ganharam medalha na Rio-2016, respectivamente de bronze e prata.

E o próximo da lista é Pedro Pablo Pichardo, que no primeiro semestre desertou durante um estágio de treinamento na Alemanha. Prata no salto triplo nos dois últimos Mundiais e dono da quarta melhor marca da história, ele tinha propostas da Turquia e da Espanha, mas assinou contrato com o Benfica, de Portugal, e, daqui a três anos, poderá começar a competir como português, a se confirmarem todos os prognósticos – para Cuba, ele não pode voltar nos próximos oito anos.

Exemplo no triplo – Ao terminar em quinto no salto triplo, o cubano/azeri Copello foi procurado pela imprensa portuguesa para falar sobre seu colega Nelson Évora, português, que chegou à quarta medalha em seis Mundiais, desta vez de bronze. "É muito legal ver um colega de equipe chegar ao pódio", disse. Na prova feminina, também já havia sido assim, com a venezuelana Rojas, ouro, e a casaque Rypakova, bronze, comemorando juntas.

São todos atletas de Ivan Pedroso, cubano que dominou o salto em distância entre 1993 e 2001, conquistando nove títulos mundiais (indoor e outdoor) no período. Pedroso trabalha na Espanha e atraiu para lá alguns dos atletas que hoje são os melhores do mundo. Além dos quatro citados, seu time tem a espanhola Ana Peleteiro, sétima colocada, e o francês Teddy Tamgho, que foi campeão do mundo em 2013.

"Não é qualquer equipe que coloca três atletas entre as oito primeiras de um prova de um Mundial. É um grande feito do time Pedroso", exaltou Rojas, após dar a primeira medalha de ouro da história da Venezuela em Mundiais de Atletismo.

Também no fundo – A confusão de nacionalidades ficou nítida ontem à noite, com as finais do salto triplo e dos 200m, vencida pelo turco Guliyev, que é nascido no Azerbaijão e mudou sua nacionalidade esportiva só em 2015, depois de também passar pela quarentena de três anos.  Mas o fenômeno se repete em diversas outras provas, especialmente as de fundo, seja por naturalização tardia ou de atletas que migraram quando crianças ou jovens.

Na final dos 10.000m, no sábado passado, os somalis Hassan Mead e Mo Farah representavam EUA e Grã-Bretanha, respectivamente, enquanto que outros quatro quenianos competiam por EUA (dois deles), Turquia e Bahrein. O pequeno país árabe, aliás, também conquistou seu primeiro ouro em Mundiais, com uma maratonista nascida no Quênia e que só viveu 19 dias no Bahrein antes de conseguir passaporte.

 

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.