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Olhar Olímpico

Nascido no Azerbaijão e ídolo do Fenerbahce, quem é o sucessor de Bolt nos 200m

Demétrio Vecchioli

10/08/2017 19h10

Tetracampeão mundial, Usain Bolt preferiu não correr os 200m rasos em seu último Campeonato Mundial. Alegou que a preparação para a prova, desgastante, poderia comprometer a reta final da sua carreira. Sem o jamaicano, todos apontavam que o próximo campeão seria ou seu compatriota Yohan Blake, ou os africanos Wayne van Niekerk e Isaac Makwala. Apenas Ramil Guliyev jurava que seria ele o sucessor de Bolt. E estava correto. Tanto que tinha pronta uma exclusiva bandeira meio turca, meio azeri, à sua espera.

Mas quem é o turco todo tatuado, parcialmente careca aos 27 anos, que ganhou os 200m no Estádio Olímpico de Londres, na noite desta quinta-feira? Ainda que nunca tivesse subido ao pódio de uma grande competição, Guliyev não era exatamente um desconhecido no atletismo, tendo sido prejudicado pelos três anos sem poder competir enquanto mudava de nacionalidade.

Há dez anos, em Ostrava, na República Tcheca, ele foi medalhista de prata dos 200m no Mundial Júnior, numa prova que também contou com o francês Lamaitre, que nem final conseguiu fazer em Londres. À época, Guliyev competia pelo Azerbaijão, país onde nasceu e foi criado.

Foi há cerca de sete anos que o corredor se mudou para a Turquia, país vizinho. A morte do pai e as dificuldades encontradas em continuar vivendo do atletismo em Baku o fizeram migrar para Istambul, onde o Fenehbaçe mantém um programa de alto rendimento, pagando salários aos melhores atletas.

Melhor europeu nos 200m no Mundial de 2009, quando foi sétimo colocado, Guliyev, que já havia disputado a Olimpíada de Pequim no ano anterior, solicitou a naturalização em 2011, mas só a obteve em 2014. Foram três longos anos de espera, uma vez que a federação azeri não autorizou a mudança de nacionalidade – pelas regras da federação internacional, a IAAF, o prazo só cai para um ano quando o país natal concorda com a alteração.

Proibido de disputar a Olimpíada de Londres, já que a IAAF não lhe concedeu autorização especial, Guliyev continuou defendendo o Fener em competições locais, seguiu sendo campeão nacional turco, mas só foi voltar a aparecer em uma competição de grande nível em 2015, quando foi finalista do Mundial de Pequim, repetindo o feito na Rio-2016. Este ano, tornou-se o segundo homem branco a quebrar a barreira dos 10 segundos nos 100m – o primeiro foi exatamente Lamaitre.

Se para todo o mundo o resultado desta noite foi uma surpresa, o mesmo não pode-se dizer de Guliyev. "Isso não é um choque para mim, ao mesmo tempo que parece que não é real. Estou muito orgulhoso. Mostrei meu melhor durante toda a competição. Fiz minha melhor prova na hora certa. É o melhor momento da minha carreira", afirmou.

Não só da carreira dele, mas da história da Turquia no atletismo. Até esta quinta, os turcos nunca haviam ganhado uma medalha de ouro. Ela foi conquistada com o tempo de 20s09, ainda longe do recorde europeu que Guliyev quer bater – os 19s80 de Lamaitre devem ser homologados se a federação europeia de fato revogar os seus antigos recordes, por suspeita de doping.

Foram apenas dois centésimos de vantagem sobre Van Niekerk, que ficou com a prata, e o trinitino Jereen Richards. Só o photofinish mostrou que o sul-africano chegou à frente, ainda que o tempo dos dois tenha sido idêntico. Depois de chegar a ficar fora das eliminatórias, Makwala foi só o sexto colocado, com 20s44. Ao correr sozinho ontem, autorizado pela IAAF, fez 20s20.

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.