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Olhar Olímpico

Delegação mais velha do Mundial, Brasil vê geração de 'trintões' quebrar tabus

Demétrio Vecchioli

25/07/2017 04h00

(Satiro Sodré/SSPress/CBDA

Se o critério de classificação do Mundial de Natação fosse a idade, o Brasil seria o líder do quadro de medalhas. Basta ver as provas realizadas até agora. Felipe Lima (32 anos) era o mais velho nos 100m peito e repete o feito nos 50m peito, nesta terça – João Gomes Junior, de 31, é o terceiro das listas. Joanna Maranhão (30) é a segunda mulher mais velha de todo o Mundial. Nos 100m costas, Guilherme Guido (30) era o segundo mais velho entre os inscritos nos 100m costas, enquanto Cesar Cielo (30) era o segundo mais velho entre os 32 nadadores na final do revezamento 4x100m livre.

O expoente dessa turma toda, Nicholas Santos, de 37, é o atleta mais velho de toda a competição, tendo nascido quatro anos antes que o segundo colocado nesse ranking. E é também Nicholas o maior exemplo de que, pelo menos por enquanto, idade não tem sido sinônimo de problema para a delegação brasileira. Ele foi medalhista de prata nos 50m borboleta e ampliou seu recorde de mais velho medalhista da história dos Mundiais de Natação. Joanna bateu o recorde sul-americano dos 200m medley, Guido está na final dos 100m costas pela primeira vez na carreira, Cielo quebrou um tabu de 17 anos e foi medalhista no revezamento e os dois peitistas ficaram entre os 11 melhores do mundo na primeira prova que nadaram em Budapeste. Nenhum deles fala abertamente em parar antes da próxima Olimpíada.

Nem mesmo Nicholas, que já era considerado "velho" para a natação nos Jogos de Londres, quando tinha 32 anos – Michael Phelps, por exemplo, parou de nadar logo após completar 31. "Eu me cuido bastante. Quem convive comigo sabe como sou sério com o propósito de dar resultado. Cuido da minha alimentação. Me desafio o tempo todo. É isso que me mantém competitivo e consequentemente competitivo a nível mundial", diz o medalhista de prata, que admite que também há uma questão genética envolvida. "Eu não pareço ser um cara de 37 anos quando a gente faz exames laboratoriais", conta.

Após ganhar a medalha, ele foi informado por um repórter estrangeiro que ele seria o mais velho medalhista de Mundial em atividade. E muito provavelmente a situação é a mesma para Poliana Okimoto, que segue nadando as provas de maratonas aquáticas e foi medalhista olímpica aos 33 anos, no ano passado. Em Budapeste, nenhuma das competidoras da modalidade tinha mais de 32.

"Isso quer dizer que a gente está bem", argumenta Felipe Lima, que tenta encontrar uma explicação técnica sobre o fenômeno que acontece com os nadadores brasileiros. "Acho que é a forma de a gente encarar o esporte de alto rendimento. Antes, as pessoas treinavam muito forte e acabavam se desgastando na final da carreira. A gente tem treinado mais específico, adaptando o treinamento à forma que a gentes se sente e isso tem levado à longevidade na natação. A idade está dentro da nossa cabeça", argumenta.

Mas a explicação não pode se restringir ao treinamento específico. Afinal, nadadores de todo o mundo também dosam melhor os treinos a partir de uma certa idade. O ponto é que os brasileiros conseguem se manter competitivos acima dos 30 anos. Além dos citados, Kaio Márcio (32) e Felipe França (30) também fizeram índices para o Mundial, mas não foram convocados.

A realização de dois grandes eventos no Brasil no período de nove anos tem algum peso. Cielo, Felipe Lima, Nicholas Santos e Poliana, por exemplo, são da "geração do Pan". Os resultados obtidos naquele evento, também graças a Thiago Pereira, que parou no ano passado, aos 30 anos, impulsionaram os investimentos na natação, visando a Olimpíada do Rio.

A competição em casa fez o governo federal criar mecanismos de apoio aos atletas de alto rendimento, especialmente os que tinham possibilidade de medalhas. Os que já estavam entre os melhores do mundo receberam incentivo financeiro para se manterem lá. Exatamente os "trintões" de agora, beneficiários do Bolsa Pódio. Não que tenha sido a grana a incentivá-los a continuar na natação – esse papel foi cumprido pelo sonho de competir uma Olimpíada em casa -, mas ela permitiu que eles continuassem nadando em alto nível.

Passados os Jogos do Rio, quase todos eles acabaram transformando a frustração de não conseguir uma medalha em casa (Nicholas, Cielo e Felipe nem se classificaram para a Olimpíada) em motivação para continuar nadando, mesmo passando por novas dificuldades – Fratus está sem clube, por exemplo.

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.