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Olhar Olímpico

Novo "mico"? Seleção de futsal vira problema que ninguém quer administrar

Demétrio Vecchioli

19/07/2017 04h00

Divulgação/Fifa

Heptacampeã do mundo, a seleção brasileira de futsal poderia ser um produto nobre, disputado por patrocinadores, alvo de cobiça de dirigentes. Mas o que se vê cinco anos após o último título mundial é o "ativo" pulando de mão em mão. Uma "batata assando" que não atrai empresas, não gera dinheiro e, consequentemente, não tem conseguido atrair o interesse de ninguém. No jargão do mercado, a seleção teria se tornado um "mico" para se administrar.

Há duas semanas, o Grupo Águia, que havia assumido a "gestão" da seleção brasileira, a devolveu para a Confederação Brasileira de Futsal (CBFS), que não tem dinheiro para levar a equipe para qualquer lugar. A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) também participou do processo e está tirando o corpo fora. A dor de cabeça não é dela, afinal.

A crise começou há mais de três anos, quando Falcão anunciou que não jogaria mais pela seleção, reclamando de uma "ditadura" dentro da confederação. A lista longa lista de críticas incluía atletas deixados de fora de convocações por desavenças pessoais, falta de apoio à seleção feminina e até corte de internet na concentração. "A administração atual é triste, pífia e deprimente", chegou a reclamar Falcão.

As críticas, no início de 2014, chegaram em um momento delicado. A CBFS, que parecia ir de vento em popa patrocinada por Chevrolet, Correios (R$ 10 milhões ao ano) e Banco do Brasil (R$ 4,5 milhões ao ano), de uma hora para outra se viu sem nenhum patrocinador. Ao mesmo tempo, os protestos dos jogadores derrubaram o presidente Aécio de Borba.

Marcos Madeira foi eleito em março de 2015 sem o apoio dos jogadores, que mantiveram um boicote até julho. Em paralelo a isso, a CBFS teve suas contas reprovadas, o que a impedia de sequer negociar com patrocinadores estatais, como Banco do Brasil e Correios. Como não é confederação olímpica, a CBFS também não tem acesso a recursos da Lei Angelo/Piva. Já os clubes se rebelaram e tornaram a Liga Futsal independente da confederação. Ou seja: ficou sem nenhuma fonte de recursos.

Para piorar a crise, em 2016 a equipe perdeu nas oitavas de final do Mundial, para o Irã, e pela primeira vez ficou sem medalha. A dívida, que em 2015 era de R$ 6 milhões, cresceu, mas a CBFS não fala em valores.

Sem dinheiro, a CBFS deu um passo atrás. No fim de 2016, procurou a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e pediu socorro. É que, pelo estatuto da Fifa, só há uma confederação nacional reconhecida por país. Mas a CBF nunca quis se preocupar com o futsal (ou o futebol de areia) e sempre permitiu que a CBFS fizesse a gestão da modalidade, apenas intermediando a relação com a Fifa (inscrevendo jogadores, por exemplo).

Ao receber a oferta, a CBF passou a "batata quente" adiante. Intermediou para que a CBFS fechasse contrato com o Grupo Águia, que há muitos anos presta serviços de viagens para a CBF. Foi a empresa de marketing de Wagner Abrahão quem contratou um técnico – PC de Oliveira – e determinou, por exemplo, que Falcão não fosse mais convocado. Em março, o craque fez seu "jogo de despedida" contra a Colômbia, num amistoso. Foi também o Grupo Águia que permitiu que a seleção jogasse – e ganhasse – a Copa América na Argentina.

O "ativo" seleção brasileira, porém, não deu retorno financeiro e o Grupo Águia o devolveu à CBFS. "Nós vendemos o ativo da seleção brasileira de futsal. Mas não sei se ela não conseguiu vender o ativo da seleção brasileira. O que deve ter ocorrido é isso. A realidade eu desconheço. Sei que ela nos devolveu", diz Madeira, presidente da CBFS.

De volta para a CBFS, a seleção perdeu seu técnico, que era bancado pelo parceiro, mas ganhou de volta o ídolo Falcão, que se colocou à disposição para jogar. Depois de ceder os direitos comerciais para um parceiro que não conseguiu patrocinador, a confederação garante que tem "perspectivas muito boas". "Eu penso que até o final do mês a gente vai ter uma conotação (sic) a respeito", garante Madeira.

De acordo com ele, o contrato seria com não apenas um, mas vários patrocinadores. Madeira só não diz quais. Atualmente, a única marca que aparece no site da confederação é a da Penalty, fornecedora de material esportivo que está emprestando um escritório em Barueri (SP), onde Madeira tem dado expediente. A confederação continua tendo sua sede em Fortaleza.

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.