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Olhar Olímpico

Investigado há 15 anos por receitar doping, médico nunca foi punido

Demétrio Vecchioli

13/06/2017 04h30

Investigado pelo Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, o médico Julio Cesar Alves, de 59 anos, segue atuando sem nenhuma restrição em Piracicaba, onde tem uma clínica. Denunciado em um documentário do canal de tevê alemão ARD veiculado no sábado, ele é figurinha conhecida no meio esportivo há muito tempo. Em 2002, a Sociedade Brasileira de Medicina do Esporte (SBME) apresentou a primeira denúncia contra ele no Cremesp. Até hoje não houve punição.

Ele ficou conhecido em 2002, quando Eliane Pereira, então com 19, foi flagrada em exame antidoping e perdeu a medalha de ouro dos 1.500 m nos Jogos Sul-Americanos. Flagrada com estanozolol, ela revelou que o medicamento havia sido receitado por Julio Cesar. Na ocasião, o médico ortomolecular defendeu que os atletas brasileiros deveriam recorrer mais ao doping para competir em igualdade de condições com os rivais estrangeiros e disse que trabalhou ou trabalha com cerca de 50 atletas de ponta do país, inclusive dois campeões da Copa do Mundo daquele ano.

As declarações dadas à ESPN na época fizeram seus colegas da Sociedade Brasileira de Medicina do Esporte o denunciarem ao conselho regional, como contou a Folha na época. De acordo com o Cremesp, porém, ele só recebeu uma pena pública em 2011. A advertência, tratada como "pena C", consiste em "censura pública em publicação oficial".

Em meados de 2015, porém, a Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem (ABCD) remeteu ao Cremesp nova denúncia contra Julio Cesar. Naquele ano, o comando da ABCD ouviu cerca de 10 atletas flagrados em exame antidoping, que detalharam como tiveram acesso às substâncias proibidas. Diversos deles citaram que as drogas foram receitadas pelo médico. Entre os atletas que depuseram estava Eliane, que voltou a ser pega no doping em 2014.

Diversos deles citam que chegaram até a clínica de Julio Cesar, localizada no centro de Piracicaba, depois de procurarem no Google sobre como se dopar e encontrar reportagens sobre o médico. Em 2013, ele voltou a falar à ESPN Brasil, desta vez afirmando que tinha cerca de 50 clientes atletas, dos quais 25 eram "top" – de alto rendimento.

Pelo menos um processo judicial corre contra o médico, por ele receitar substância dopante a um atleta pego no doping. Este mesmo atleta é um dos que depuseram à ABCD, no dossiê que está em posse do Cremesp há cerca de dois anos. Mesmo após todo esse tempo, o médico ainda não foi punido. No fim de semana passado, mais uma atleta brasileira foi flagrada em exame antidoping por EPO, desta vez Ariane Monticeli, do triatlo. Ela admitiu o doping e também disse que buscou informações na internet, sem citar se passou pelo consultório de Julio Cesar.

Em nota, o Cremesp disse apenas que "há sindicância tramitando em sigilo processual, previsto em Lei, sobre o caso citado". O órgão lembrou que uma sindicância leva em média de seis meses a dois anos para ser concluída.

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Se você souber alguma informação sobre o escândalo de doping no Brasil, entre em contato com o blog pelo e-mail demetrio.prado@gmail.com. Seu nome será mantido em sigilo. 

 

 

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.