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Olhar Olímpico

Sem Murer, salto com vara brasileiro regride 12 anos e volta a nível colegial

Demétrio Vecchioli

12/06/2017 11h00

Karla e Murer, com uniforme azul e amarelo, com as meninas da nova geração do salto com vara

O salto com vara feminino do Brasil parece ter caído no abismo depois de saltar o mais alto que podia. Um ano depois de Fabiana Murer se aposentar com o recorde sul-americano, a prova se tornou a mais fraca do atletismo nacional. Exemplo claro disso é o resultado do Troféu Brasil, que define a campeã brasileira. As três primeiras colocadas saltaram pífios 4,10m, resultado que as deixaria fora do Top 10 do ranking escolar dos Estados Unidos.

Há um ano, Murer passou o sarrafo a 4,87m no Troféu Brasil, melhorou seu próprio recorde sul-americano e ganhou moral para a Olimpíada, onde fez sua despedida sem conseguir se classificar à final. Sem ela, o salto com vara voltou ao mesmo nível no qual estava antes dos seus primeiros bons resultados, em 2005. Doze anos depois, o salto com vara se vê estacionado no mesmíssimo lugar.

Basta ver o ranking nacional. Em 2005, Murer foi seguida por Joana da Costa (4,31m), Karla Rosa (4,20) e Patrícia Gabriela (3,90m). Hoje, em 2017, o ranking tem Karla (4,33m), Joana (4,23m) e Patrícia (4,15m) nas três primeiras posições. A mais nova delas, Joana, tem 32 anos. Como comparação, a líder do ranking escolar dos EUA saltou 4,38m e todas as nove primeiras colocadas passaram de 4,14m.

Patrícia, que amanhã completa 33 anos, relaciona essa falta de evolução do salto com vara à ausência, no Brasil, do técnico Elson Miranda. "Com a evolução da Fabiana, eles viajavam muito para fora para treinar e competir, então as meninas ficavam aqui e perdiam o contato com o treinador. Esse contato com o treinador é diferente", opina a saltadora, que este ano se juntou às comandadas por Elson em São Caetano do Sul.

Aos poucos, Elson se afastou de todos os bons saltadores que formou, exceto Murer, sua mulher. Primeiro se desentendeu com Fábio Gomes, que hoje treina sozinho, depois com Thiago Braz, que preferiu seguir apenas com Vitaly Petrov, na Itália, e, mais recentemente, com Augusto Dutra.

Sem atletas de altíssimo rendimento, Elson tem ficado mais em São Caetano do Sul, na sede do clube B3 (antigo BM&F) e é essa a esperança de Patrícia. "É a primeira vez que ele acompanha desde o início da temporada, desde os treinos de base. A partir de agora vai melhorar muito", avalia a saltadora. A equipe comandada por ele tem sete mulheres, a maioria delas jovens, como Juliana Campos, de 20 anos, que saltou 4,10m no Troféu Brasil e bateu seu recorde pessoal. Em três anos, ela melhorou sua marca em apenas 10 centímetros.

Mas as viagens de Elson não são, claro, a única razão do salto com vara feminino não ter se desenvolvido no Brasil. Uma delas é a falta de varas. "Tem atletas que vêm me pedir ajuda, que têm duas varas para competir, para tudo. Tem muito material na mão de poucas pessoas. Eu mesmo tenho as oito varas que eu comecei que são as mesmas até hoje", comenta Joana, que ano passado disputou a Olimpíada depois de "achar" um salto de 4,50m no Troféu Brasil, melhorando em 20cm seu recorde pessoal.

Ela está há três anos no Pinheiros, que oferece varas aos atletas que treinam lá. Só que a equipe que chegou a ter 12 mulheres hoje só tem vaga para três. Com Elson, são sete atletas, que também têm material à disposição. Quem sai, porém, fica vendo navios. Prova disso é Augusto Dutra, que parou de treinar depois da Olimpíada porque, ao se afastar de Elson, ficou sem varas. Ele só retomou os treinos depois que a CBAt comprou varas para ele.

Em São Caetano, porém, a estrutura está pronta para formar uma substituta para Murer, ainda que isso demore tempo. Hoje, a principal candidata é Juliana, que tem 20 anos e alcançou 4,10m no Troféu Brasil. Mas Giovana Ferrarezi (19 anos), Nicole Barbosa (18) e Isabel Quadros (17) , todas treinadas por Elson, já passaram de 3,90m na temporada – no ano passado, o índice para o Mundial Sub-20 foi 4,10m.

"A Isabel começou a treinar com o Elson faz seis meses, por exemplo. Essas meninas novas estão evoluindo muito com ele", opina Patrícia, que admite que dificilmente o salto com vara brasileiro chegará competitivo a Tóquio. A própria Fernanda acredita que briga por medalha só em 2024. "Quero ainda neste ciclo olímpico estar no nível competitivo. Disputar medalha só daqui a dois ciclos."

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.