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Olhar Olímpico

Fisioterapeuta, manager e dirigente: Murer curte nova vida sem saudade das pistas

Demétrio Vecchioli

30/05/2017 04h00

Fabiana Murer já nem se recorda mais quantas vezes na longínqua carreira ela superou o sarrafo a 4,55m. Mas, diante da torcida brasileira, ela falhou nas três tentativas que teve nas eliminatórias do salto com vara nos Jogos Olímpicos do Rio e encerrou ali sua carreira de forma amarga, poucas horas depois de Thiago Braz alcançar um inesperado ouro olímpico. O ponto final da vida de atleta de alto rendimento, porém, era só o início de uma nova fase, tão feliz quanto.

Aos 36 anos, Fabiana tem um cartão de visita tão extenso quanto seu currículo como atleta. É fisioterapeuta, empresária empreendedora, gerente institucional de um clube, membro da Comissão de Atletas da Federação Internacional de Atletismo (IAAF) e do Comitê Olímpico do Brasil (COB) e do Conselho de Direção da Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt).

A maior parte do tempo é dedicada à carreira de fisioterapeuta. Observando a forma como trabalhava seu próprio corpo no esporte, mesclando velocidade, agilidade e equilíbrio, Fabiana notou que havia criado seu próprio método de treinamento. É o "Método Murer", que ela aplica no Insport, clínica que abriu nos Jardins, área nobre de São Paulo, junto com marido, o seu antigo técnico Élson Miranda.

"Eu me machuquei muito pouco durante a carreira, por causa dos exercícios que eu fazia. Então eu quis fazer isso para as pessoas que querem ter qualidade de vida, ou as que são atletas informais, querem correr ou nadar, ter boa performance. São exercícios com peso do corpo, elástico, nada de massa", conta Fabiana.

Na clínica, ela cuida da área de prevenção e fortalecimento, enquanto Elson trabalha com o treinamento específico. Outros três sócios, dois fisioterapeutas e um ortopedista, completam a equipe. Em dois meses de funcionamento, a clientela já é grande. "A minha intenção foi complementar o treino das pessoas que gostam de correr, mas aí começaram a aparecer pessoas de outros esportes. A gente consegue adaptar o método para qualquer esporte."

Mas o Insport tem um concorrente de peso na agenda de Fabiana Murer: o B3 Atletismo, novo nome do antigo BM&F Bovespa, clube que a saltadora defendeu durante quase toda a carreira. Como costuma fazer com seus atletas mais marcantes, o B3 ofereceu a Fabiana continuar lá, agora como gerente institucional. Se Marílson Gomes dos Santos vai para a beira da pista identificar novos talentos, Fabiana é a responsável pelo meio-campo entre atletas, direção e entidades (COB, CBAt, federações). Mas não é só isso.

"Cuido dos atletas, converso com eles, vejo quais são as necessidades, o que tem que melhorar. Tem que resolver um problema? Vou no centro de treinamento, vejo que material precisa", relata. Outra função importante é a de manager informal, ajudando os atletas da B3 a conseguirem eventos fora do país para competir. "O Wagner (Montanha) não tinha manager na Europa, então entrei em contato com um cara que eu conhecia e conseguimos colocar ele no circuito mundial do martelo. O Vitor Hugo, por exemplo, tinha um manager, que trocou de telefone e sumiu. Eu consegui arranjar o telefone, fiz o contato", lembra. "São muitos anos viajando, competições internacionais, conheço muita gente, então para mim é tranquilo."

A nova função, porém, exige que Fabiana saia da zona de conforto pelo menos uma vez na semana, quando vai à Bolsa de Valores para passar um relatório do clube, levar as demandas dos atletas e vice-versa. "Eu só via o lado do atleta", admite.

Tamanho conhecimento, claro, segue sendo muito útil. Fabiana, afinal, é membro dos conselhos de três entidades de administração do esporte e leva o interesse dos atletas para quem toma as decisões. Recentemente, pleiteou junto os organizadores da Liga Diamante que os atletas voltassem a ter seis e não apenas quatro tentativas nas provas de saltos horizontais.

"Por enquanto" todo esse papel político exercido por Fabiana não significa que ela tenha planos de alçar voos mais altos. "Fiz curso online do COB de administração esportiva, mas por enquanto quero ajudar o clube que foi quem me ajudou todos esses anos. Minha intenção é ajudar o clube por enquanto."

Ainda que treine todo dia pelo menos "uma horinha", Fabiana diz que não sente nenhuma saudade do esporte que praticou quase metade da vida. Seu último salto foi aquele que a eliminou dos Jogos Olímpicos do Rio. Desde então, só pegou numa vara uma vez, para fazer uma demonstração numa clínica. Mal saiu do chão. "Eu não sinto saudades. Eu estou contente com a minha decisão, foi momento certo", assegura, muito bem resolvida.

Sobre o autor

Demétrio Vecchioli, jornalista nascido em São Roque (SP), é graduado e pós-graduado pela Faculdade Cásper Líbero. Começou na Rádio Gazeta, foi repórter na Agência Estado e no Estadão. Focado na cobertura olímpica, produziu o Giro Olímpico para o UOL e reportagens especiais para a revista IstoÉ 2016. Criador do Olimpílulas, foi colunista da Rádio Estadão e blogueiro do Estadão, pelo qual cobriu os Jogos do Rio-2016.

Está disponível para críticas, elogios e principalmente sugestões de pautas no demetrio.prado@gmail.com.

Sobre o blog

Um espaço que olha para os protagonistas e os palcos do esporte olímpico. Aqui tem destaque tanto os grandes atletas quanto as grandes histórias. O olhar também está sobre os agentes públicos e os dirigentes esportivos, fiscalizados com lupa.